No Público noticia-se o lançamento de uma campanha
por parte de várias associações no sentido de legalizar o trabalho sexual, masculino
e feminino. Como em todas as questões que envolvem valores, o debate será
grande e, provavelmente, inconclusivo.
A iniciativa assenta, creio, em dois eixos
fundamentais. Um primeiro e importante aspecto remete para que, sendo definido o
trabalho sexual como actividade profissional, tal estabeleceria um quadro de
direitos e protecção da mesma natureza de outra qualquer actividade
profissional.
Uma outra linha de argumentação dos proponentes
pretende contrariar uma representação instalada de que os ou as
trabalhadores(as) do sexo são sempre vítimas. Sustentam que muitas pessoas se
envolvem neste tipo de actividade "seguindo o seu livre arbítrio", a
peça jornalística cita um exemplo, pelo que seria ajustado ver a profissão que
escolheram regulamentada, desde logo através do seu reconhecimento enquanto profissão.
Se a primeira linha de argumentação me parece
clara, a segunda deve, do meu ponto de vista, ser discutida com imensa cautela.
Há uns meses atrás, também no Público apareceu um
trabalho extenso sobre o aumento da prostituição nos últimos tempos. O trabalho
tinha como pano de fundo uma situação também já abordada anteriormente na
imprensa e que aqui também tinha comentado. Numa aldeia do Norte português, os
seus habitantes andavam indignados e revoltados com a existência de mulheres
que se dedicam à prostituição à beira de uma estrada nacional muito próxima da
povoação. Têm tentado, sem sucesso, a expulsão destas trabalhadoras na
indústria do sexo.
Algumas destas mulheres ouvidas nas peças sobre
esta matéria referem que o recurso à prostituição é uma questão de
sobrevivência, relatando situações de desemprego e necessidades familiares,
incluindo filhos.
É ainda sabido, dados das instituições que
compõem a Rede sobre o Trabalho Sexual, que se verifica, de facto, um aumento
de mulheres portuguesas que se prostituem sendo que o Algarve se está a tornar
também um destino de turismo sexual.
Já não é a primeira referência que surge nos
últimos tempos relativa ao aumento de mulheres que se prostituem como forma de
sobrevivência pessoal e de suporte a filhos e família. Muitas fazem-no em
situações particularmente degradantes, ainda que o sejam sempre, sujeitas a
tudo e mais alguma coisa, na beira da estrada, vivendo a miséria humana no que
tem de mais feio, a venda de si mesmo. Este cenário está longe do "livre
arbítrio" da decisão sobre a profissão a exercer, muitas pessoas vendem
pela sobrevivência o único bem que possuem, o corpo, sendo que, algumas,
provavelmente nem do seu corpo serão soberanas.
Sei que a não legalização é favorável aos casos
recorrentes de exploração e tráfico pelo que a proposta de legalização do
trabalho sexual deve ser discutida, mas creio que importa ponderar nos riscos
de dar cobertura legal a quadros de exploração como, aliás, se verificam
noutras profissões legalizadas.
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