segunda-feira, 22 de outubro de 2012

A PERVERSIDADE DA PROLETARIZAÇÃO DA ECONOMIA

Em Julho noticiava-se, se estão recordados, que existiriam cerca de 147 mil trabalhadores a receber menos de 310 €, relembro que o salário mínimo é 485 €,  e na altura o Primeiro-ministro considerou "perverso" o recurso a trabalho temporário, reportando-se ao caso da contratação de diferentes técnicos, enfermeiros e médicos, para desempenho de funções no SNS. Como é conhecido, esta é uma situação que não existe apenas o âmbito da Saúde. Existem, por exemplo, muitos professores a trabalhar nas chamadas Actividades de Enriquecimento Curricular pagos pelas Câmaras Municipais por valores semelhantes.
Hoje a imprensa faz eco da existência de docentes universitários, em estabelecimentos de ensino superior privado e também públicos, cujo pagamento por hora de aula é de cinco euros ou menos, sendo que alguns ainda terão que assegurar a preparação das aulas e avaliações sem remuneração acrescida. Os cincos euros por hora parecem ter-se transformado na unidade de conta dos salários neste processo de empobrecimento e proletarização da nossa economia empreendido pelos feitores da troika que nos governa e afunda.
Importa contextualizar as relações laborais num universo com mais de 16% de desemprego, 36,2% de desemprego jovem e a segunda mais alta taxa de precariedade da Europa.
A estabilidade no mundo laboral é espelhada num léxico que só de ouvir embaraça. São frequentes as referências a excedentários, as pessoas são excedentárias, não fazem falta, há que libertar o mercado desse peso, o das pessoas excedentárias. Um outro termo é o trabalho precário, flexível, dizem, que torna precária uma vida sem a confiança no amanhã.
Também me parece curiosa a ideia de rescisão amigável que, amigavelmente é claro, manda milhares para o desemprego. No fundo, as pessoas deixam de ser pessoas, são activos que como tal devem ser geridos em função do mercado, adquirem-se, dispensam-se, descartam-se, gerem-se e, finalmente, abandonam-se.
Neste cenário, os desequilíbrios fortíssimos entre oferta e procura em diferentes sectores, a natureza da legislação laboral favorável à precariedade e insensibilidade social e ética de quem decide, promovem a proletarização do mercado de trabalho mesmo em áreas especializadas.
Alguns dos vencimentos que se conhecem, atingindo também camadas altamente qualificadas, não são um vencimento, são é um subsídio de sobrevivência. É exactamente a luta pela sobrevivência que deixa muita gente, sobretudo jovens sem subsídio de desemprego e à entrada no mundo do trabalho sem margem negocial, altamente fragilizadas e vulneráveis que entre o nada e a migalha "escolhem amigavelmente" a migalha". Como é evidente esta dramática situação vai de mansinho alargando e numa espécie de tsunami vai esmagando novos grupos sociais e famílias que se julgavam razoavelmente protegidas nos seus empregos e salários.
E um escândalo. Grave e dramático é que as pessoas são "obrigadas" a aceitar. Os mercados sabem disso, as pessoas são activos descartáveis.

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