quinta-feira, 30 de novembro de 2017

PARTIU O ZÉ PEDRO

Partiu o Zé Pedro, sim, o Zé Pedro, o dos Xutos.
Os Xutos estiveram sempre aqui e certamente continuarão a estar. Como costumo dizer, fazem parte da banda sonora da minha vida.
Como diria uma figura enorme da nossa cultura, o João Bénard da Costa, os Xutos são aqui de casa.


DOS ESTUDOS E DA EVIDÊNCIA

De há uns tempos para cá instalou-se de forma mais generalizada o recurso a “Segundo um estudo …”, “De acordo com um estudo …”, “Foi divulgado um estudo que …” ou a outras variações do mesmo tema, para afirmar ideias ou opiniões. A educação não escapa a este tipo de funcionamento.
Neste espaço faço-o com alguma frequência, também.
Mais recentemente, importa ir actualizando, deixámos de referir os estudos e passamos a usar a “evidência”, ou seja, “Segundo a evidência ...”, “De acordo com a evidência …”, “A evidência mostra …”, etc.
O que me parece curioso é que se mantém a tentação de com alguma frequência se construir, interpretar e divulgar os estudos para mostrar … a evidência desejada.
Na educação, também.
Este “desabafo” não tem a ver evidentemente com a necessidade e a qualidade da generalidade dos estudos, tenho realizado alguns, orientado muitos e ainda leio regularmente muitos outros. O desabafo decorre exactamente disto e do que fazemos com os dados.
Recordo um velho professor pertencente a uma prestigiada universidade francesa que numa aula nos dizia qualquer coisa como, “o investigador tortura os dados até eles confessarem”.
E, de facto, é curioso analisar muitos estudos e, sobretudo, a forma como os seus dados são interpretados, por vezes com leituras opostas.
Quase sempre uma questão de agenda.

quarta-feira, 29 de novembro de 2017

DOS NÚMEROS NA EDUCAÇÃO

Um estudo do ISCTE, tinha que ser, encomendado, gosto do encomendado, pelo ME estima em cerca de 84 milhões o custo da redução global, totalidade do básico e secundário, de dois alunos por turma que já se iniciou nos TEIP.
Este acréscimo orçamental é compensado segundo o estudo pela redução de 124 milhões de euros que se considera consegui com o abaixamento em 50% do número de retenções de acordo com as metas estabelecidas para 2021no âmbito do Programa de Promoção do Sucesso Escolar.
Antes de umas notas relativas aos números da educação reafirmar a importância de um outro aspecto que me parece negligenciado, o número de alunos por professor. Muitos professores lidam com muitas turmas perfazendo números acima dos 120 ou 150 alunos. Parece dispensável explicitar as implicações negativas desta situação.
Como há dias escrevi, reduzir o número de alunos por turma é uma medida justificada. A revisão de estudos sobre esta matéria mostra o que também conhecemos, existem vantagens em turmas de menor dimensão que podem ser mais ou menos significativas em função das variáveis em análise.
Parece-me de acentuar que os estudos sugerem com clareza a existência de impacto positivo no clima e comunicação na sala de aula, na maior facilidade de práticas educativas mais diferenciadas, no comportamento dos alunos, etc., o que, evidentemente deve ser considerado.
Alguns estudos, apenas centrados em resultados, não encontram diferenças significativas mas também me parece que não são consideradas variáveis importantes, de contexto por exemplo, o que nem sempre é tido em conta nos discursos de alguns economistas da educação.
Por isso os estudos devem considerar outras variáveis que não penas o resultado estudar ele próprio dependente de múltiplos factores, o número de alunos por turma é um deles.
No entanto, é essencial reafirmar a autonomia das escolas, a única forma de considerar as diferenças de contexto, isto é, a população servida por cada escola, as características e dimensão da escola, a constituição do corpo docente, os recursos disponíveis, etc. A qualidade e sucesso do trabalho de professores e alunos depende de múltiplos factores, sendo que a dimensão do grupo é apenas um, ou seja, importa considerar, vejam-se relatórios e estudos nesta área, as práticas pedagógicas, os processos de organização e funcionamento da sala de aula e da escola, bem como o nível de autonomia de cada escola ou agrupamento, entre outros. Daí a importância de promover uma autonomia real. Aliás, dentro do que entendo por verdadeira autonomia das escolas, deveriam ser a ter a competência para definir e organizar as turmas embora aceite a existência de orientações nesse sentido.
Ainda no âmbito da autonomia das escolas poderiam ser consideradas outras opções como a presença de dois professores em sala de aula. Em algumas circunstâncias pode ser mais vantajosa que a redução do número de alunos por turma.
Acresce nesta matéria a importância da qualidade do trabalho em turmas com alunos com necessidades educativas especiais o que, evidentemente, deve ser considerado na análise do efectivo de turma, desde logo cumprindo o que está legislado.
É ainda essencial, não só por esta razão, dimensão das turmas e qualidade do trabalho dos alunos, de todos os alunos, e dos professores, que seja promovida uma verdadeira desburocratização do trabalho nas escolas e promovido algum ajustamento na sua organização e funcionamento o que certamente libertaria tempo de professores para trabalho em turma ou em apoios que promovessem qualidade.
Sei que mudanças neste sentido são politicamente difíceis mas parecem-me imprescindíveis. Terão custos certamente mas os custos do insucesso e da exclusão são incomparavelmente mais caros.

terça-feira, 28 de novembro de 2017

A HISTÓRIA DO ZÉ NINGUÉM

Era uma vez um rapaz chamado Zé Ninguém. Logo de pequeno percebeu como naquela terra vivia quem era Ninguém. Na escola raramente se dava por ele, ficava no fundo da sala e passava despercebido. Muitos vezes os professores passavam as aulas sem falar com ele que também não se esforçava e pouco a pouco começou, como diziam, a ficar para trás. Ele que estava sempre atrás ficou ainda mais atrás. A família não estranhou, nem sequer sabia muito bem o que fazer, os Ninguém sempre assim tinham sido enquanto tiveram na escola de onde saíram logo que puderam.
Depois da escola o Zé Ninguém juntou-se a outros Ninguém e entre o nada fazer e a precisão da subsistência começou a viver entre o biscate indiferenciado, próprio de um Zé Ninguém e delinquência de ocasião que proporcionava alguns dividendos para além da adrenalina.
Ao chegar a esta fase da sua vida o Zé Ninguém ficou frente a duas estradas tendo de escolher qual percorrer.
Uma primeira estrada passaria por conhecer uma rapariga chamada Alguém por quem se apaixonaria e com construiria um projecto de vida que o devolveria à escola, lhe proporcionaria um trabalho, uma família e o transformaria finalmente em Alguém.
A segunda estrada por onde o Zé Ninguém poderia caminhar levá-lo-ia a progredir na carreira iniciada, o lado errado da vida, e a um dia ser capaz de realizar o grande feito, aquele que o transformaria, finalmente, em Alguém.
Não sei qual foi a escolha do Zé Ninguém. Podeis escolher vós, ele será sempre Alguém … mesmo sendo um Zé Ninguém.

DA INDIFERENÇA E DA DIFERENÇA

Estou de volta de umas notas preparatórias da colaboração de amanhã na Biblioteca Municipal do Barreiro num Mesa redonda “Vamos trocar a indiferença pela diferença” em que abordarei o universo da Educação. A iniciativa inscreve-se na Semana da Diferenç@ a decorrer no Barreiro e por coincidência tinha acabado de encontrar no Expresso um impressionante testemunho prestado por uma família que tem dois filhos, gémeos, com paralisia cerebral.
A capacidade de luta, o optimismo, a resiliência demonstrados por tantas famílias nestas circunstâncias são simultaneamente uma inspiração e um murro na indiferença e nas dificuldades que sentem mal acomodadas pelas comunidades e por políticas que desconsideram os seus direitos.
As crianças com necessidades especiais, as suas famílias e muitos dos professores e técnicos sabem, sobretudo sentem, um conjunto enorme de dificuldades para, no fundo, garantir não mais do que algo básico e garantido constitucionalmente, o direito à educação, à vida familiar e tanto, quanto possível, com padrões de vida próximos do que passa com toda gente, postulado com décadas de enunciado mas de concretização difícil e, às vezes, adiada. É assim que as comunidades estão organizadas, pelo que não representa nada de extraordinário e muito menos um privilégio.
Como é evidente, em situações de dificuldade económica, as minorias, são sempre mais vulneráveis, falta-lhes voz.
É sempre importante sublinhar que, falando de educação, a educação de qualidade deve ser para TODOS e TODOS devem aprender, crescer e participar juntos nas comunidades educativas a que pertencem.
Não é moda, não é privilégio, é uma questão de direitos que não são de geometria variável.
Não é uma utopia, é algo de uma simplicidade e realismo absolutos e simples de enunciar, os miúdos devem estar juntos e participar nas actividades da comunidade da forma que conseguem, acomodando as diferenças entre si, entre todos.
É também e de facto uma questão ideológica como todas as dimensões da vivência humana, pois envolve valores, não é uma questão "meramente" técnica, científica ou pedagógica.
Uma outra ideia prende-se com o envolvimento dos pais nestas questões e muito para além da acção, muitas vezes difícil, com os seus próprios filhos. Neste sentido, a construção de redes que funcionam como suporte, apoio, partilha e voz é um contributo verdadeiramente importante.
Na verdade, precisamos urgentemente de construir ou reconstruir comunidades, não só de pais, que funcionem em rede.
Também não é uma utopia, é "só" entendermos que assim deve ser.

segunda-feira, 27 de novembro de 2017

COISAS DA EDUCAÇÃO, O SABER E A DISTRIBUIÇÃO DA RIQUEZA

Boa parte do que a imprensa e muitos opinadores tudólogos têm produzido sobre educação nos últimos dias, para além da indignação pela falta de seriedade intelectual, (não acredito na ignorância), tem-me causado alguma tristeza.
A educação e a sua qualidade são ferramentas essenciais de desenvolvimento. Apesar do que falta fazer e de situações que não deveriam acontecer, de políticas de sinal errado, alunos e professores têm evoluído positivamente no seu trabalho e constroem saber, ou seja, constroem o futuro.
Como diz Ordine no estimulante ”A utilidade do inútil”, “Só o saber pode desafiar uma vez mais as leis do mercado. Eu posso comungar com os outros os meus conhecimentos sem empobrecer…. Ensinar é um processo virtuoso que enriquece. Ao mesmo tempo, quem dá e quem recebe”.
Não, não é um discurso ingénuo ou romântico, estes anos todos de estrada dão-me alguma lucidez, creio. Os Professores e Educadores e de uma forma geral quem passou pela escola e não tem preconceitos ou agendas implícitas reconhece que é verdade.
No entanto, sei também que acontecem verdadeiros atropelos no quotidiano escolar. Entendo de há muito que um dos pecados estruturais do sistema é justamente a falta de dispositivos de regulação o que permite que coexistam na mesma escola a excelência e a mediocridade sem sobressaltos aparentes.
É assim triste que tantos e tão manhosamente ataquem quem, na sua esmagadora maioria, lhes leva os filhos ao futuro e os trouxe ao presente que têm.
Uma comunidade que não valoriza os seus professores e o seu trabalho é uma comunidade certamente mais pobre e menos desenvolvida. A Educação, o Conhecimento, a Formação são ferramentas de construção e distribuição de riqueza. Os professores e os alunos, futuros adultos, são os obreiros desta empresa. Respeitem-nos!

domingo, 26 de novembro de 2017

CASABLANCA

Li que passam hoje 75 anos da estreia do enorme Casablanca em Nova Iorque. O filme foi realizado por Michael Curtiz e teve Humphrey Bogart e Ingrid Bergman como protagonistas mais destacados.
Faz parte dos filmes da minha vida e já o revi vezes sem conta.
Sempre nos ocorrem referências como “Play it again Sam”, algo que se transformou num mito sem estar no filme, no simbólico “We’ll always have Paris” ou, naturalmente no tema “As times goes by”.
No entanto, a cena que ainda agora me emociona quando a revejo é ouvir a Marselhesa cantada no Ricks’café pela generalidade dos clientes por iniciativa do Victor Laszlo e com a aprovação do Rick para se sobrepor às canções entoadas por um grupo de militares nazis.
Não tenho tempo agora mas um dia destes vou rever pela enésima vez o Casablanca.


sábado, 25 de novembro de 2017

O MUNDO ÀS AVESSAS (Continuação)

As coisas nem sempre são o que parecem, o que pensamos que são ou mesmo o que gostávamos que fossem.
Na verdade, há pais que fazem mal aos filhos.
Na verdade, há filhos que fazem mal aos pais.
Na verdade, há professores que fazem mal aos alunos.
Na verdade, há alunos que fazem mal aos professores.
Na verdade, há velhos que fazem mal aos novos.
Na verdade, há novos que fazem mal aos velhos.
Na verdade, ...
Na verdade, há pessoas que fazem mal a pessoas.
Na verdade, ... o mundo é um lugar estranho e ... às vezes ... muito feio.
Parece que anda às avessas.
Apesar de tudo e sempre, talvez seja de recordar Mandela, “A educação e o ensino são as mais poderosas armas para mudar o mundo.”

UM SONHO OLÍMPICO

O apoio à preparação de atletas olímpicos é de geometria variável, ou seja, se forem atletas olímpicos têm acesso a um apoio social significativamente superior aos atletas olímpicos que são cidadãos com deficiência, chamam-lhes atletas paralímpicos. Na votação do OGE para 2018 a Assembleia da República chumbou com votos contra do PS e a abstenção do PSD um processo faseado de equiparação.
Ao que parece a razão é o brutal impacto financeiro da medida, 700 000 euros e a argumentação do “centrão” é patética, para ser simpático.
Também por estas razões insisto numa das minhas utopias, um dia teremos apenas Jogos Olímpicos em que todos as provas, de todos os desportistas, se realizem no mesmo espaço de tempo e nos mesmos espaços físicos de acordo, evidentemente, com as exigências específicas.
Não é impossível em termos de organização e assim como não consigo aceitar que uma piscina pública seja frequentada por um grupo de pessoas com deficiência em “horário próprio” com "pistas reservadas", também acho que as pessoas, todas as pessoas, podem competir num mesmo evento nas respectivas provas.
Lembro-me sempre da afirmação de Biesta, a história da inclusão é a história da democracia e, do meu ponto de vista, também passa por aqui.
Só depende de nós.
Sim, eu sei, é um sonho olímpico. Será, mas não é seguramente paralímpico.

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

IMPERMEÁVEL E RESPIRÁVEL

Hoje cedo, ainda escuro e como acontece quase todos os dias saí para a minha caminhada, o tempo da corrida acabou, a coluna já não é o que era mesmo depois da cirurgia.
Estava ainda uma chuvinha leve abençoada nestes tempos feios de seca.
Apesar de ser daquela chuva que dizem que só molha tolos a minha auto-estima treme porque acho que molha mesmo.
Felizmente inventaram umas fibras que sendo praticamente impermeáveis se mantêm respiráveis e que nos permitiram dispensar aqueles casacos mais clássicos em nylon que quando não metiam água da chuva por fora, nos deixavam encharcados por dentro devido ao efeito de sauna.
Contente com esta cómoda solução têxtil e embalado pelo passo lento, lembrei-me de repente como seria interessante que se inventasse uma forma de proteger a vida dos miúdos das intempéries que alguns deles têm à volta e tornar a vida um pouco mais confortável. Poderia ser criado um dispositivo de protecção que fosse quase impermeável às agruras dos tempos maus, protegendo-os das mais pesadas pois também é preciso passar por algumas e que, ao mesmo tempo, fosse respirável, ou seja, não fosse um dispositivo que os mantivesse numa redoma estanque e os asfixiasse, mas sim algo que lhes permitisse continuar a respirar, a viver. Um dispositivo desta natureza seria um bem precioso.
Mas esta é uma ideia completamente disparatada que seguramente foi motivada pela água que entretanto fui apanhando na cabeça. Quem me mandou andar à chuva.

DO CONSUMO

Serei só eu a ficar cansado da movimentação e campanha em torno dessa bem portuguesa tradição do “Black Friday”?
Não pretendo entrar em discursos demagógicos ou moralistas mas assusta este exacerbar do consumo que alimenta muitas vezes o luxo do desperdício. E ainda falta o Natal que já não vem longe.
Certamente por deformação profissional sou levado a olhar para estas questões considerando também o seu impacto nos mais novos.
Como tem sido referido e estudado os mercados recorrem cada vez mais às crianças como estratégia para promover o consumo ... dos pais que mais dificilmente resistem às compras quando a ressão também vem dos filhos.
Não é um problema novo, todos os que lidamos com os mais novos sabemos de que se trata. Recordo que em 2015 a Direcção-Geral do Consumidor referia receber queixas sobre a utilização de crianças em publicidade mesmo em produtos que lhes não são destinados. Embora os pais não estejam suficientemente atentos a estratégia é apetecível aos especialistas em marketing e publicidade.
Na verdade, alguns estudos nesta matéria, sugerem, surpreendentemente, que as crianças até aos 7 anos podem influenciar até 70% das decisões de compra da família, mesmo quando se trata de produtos que não lhes são directamente dirigidos. Esta influência mantém-se ao longo da infância e juventude.
Esta questão, a publicidade que tem por actores e suporte os miúdos e forma como nós adultos lidamos com isso, é complexa, envolvendo aspectos legais, considerando leis e direitos, educativos, culturais, sociais, etc. pelo que não é fácil a sua abordagem e gestão.
Será ingénuo pensar que quem produz bens destinados aos miúdos ou que cuja aquisição possa ser pressionada pelos miúdos, não tenha a tentação de que a mensagem publicitária seja o mais eficaz possível, ou seja, venda, não importa o quê, desde um alimento hipercalórico à última versão do videojogo, a qualquer dispositivo electrónico ou as férias dos pais em locais atractivos para os miúdos.
Apesar das dificuldades que atravessamos, estamos num tempo de “és o que tens e se não tens … não és”, o que afectando os adultos, veja-se as situações de crédito malparado familiar por compras compulsivas e sem base económica sustentada, não pode deixar de influenciar os mais novos.
No entanto, acredito que podemos fazer alguma coisa junto dos pais e dos miúdos para tentar atenuar os efeitos deste cenário. As escolas poderiam ter um trabalho interessante debatendo com os miúdos, de todas as idades e de forma adequada, o papel da publicidade nas escolhas e nos gostos deles promovendo uma atitude mais consciente e crítica destes processos. Poderia também ser interessante conversar com os pais sobre o papel dos “presentes” e das “compras” nas dinâmicas e relações familiares, isto é, mais prendas e mais compras não é necessariamente melhor ou ainda sobre o papel da publicidade e a forma de lidar com a pressão desencadeada pelos filhos depois de verem “os ecrãs” ou as mensagens publicitárias.
Na verdade, apesar da sua complexidade é uma matéria a que por muitas razões vale a pena dedicar atenção.
O Natal está quase aí.


quinta-feira, 23 de novembro de 2017

UMA BOA NOTÍCIA NA EDUCAÇÃO

Num universo tão carecido de boas notícias, a educação, merece registo os dados agora conhecidos sobre o trajecto dos alunos após o secundário.
A Direcção-Geral de Estatísticas de Educação e Ciência montou um dispositivo, Observatório de Trajectos dos Estudantes do Ensino Secundário, de seguimento destes alunos e está a verificar-se um aumento dos que optam por continuar a estudar depois do 12º face aos que entram no mercado de trabalho.
De facto, os dados do ano anterior mostram que 72,5% dos inquiridos continuava a estudar o que significa um aumento de 5,2 % relativamente aos dados de 2014. Saliente-se que este aumento também envolve os alunos dos cursos profissionais.
Como tantas vezes tenho escrito e recentes estudos mais uma vez o comprovam, Portugal é um dos países em que a qualificação superior mais compensa.
A narrativa, como agora se diz, de que "não adianta estudar" não colhe e não tem sustentação sendo, um autêntico tiro no pé de uma sociedade pouco qualificada como a nossa que, efectivamente e contrariamente à tão afirmada quanto errada ideia de que somos um país de doutores, continua, em termos europeus, com uma das mais baixas taxas de qualificação superior em todas as faixas etárias incluindo as mais jovens.
Conseguir níveis de qualificação compensa sempre e é imprescindível. Estudar e conseguir qualificação de nível superior compensa ainda mais.
Portugal não tem gente qualificada a mais, tem é desenvolvimento a menos. Temos também um mercado de trabalho que a cegueira da austeridade e do empobrecimento proletarizou e que não absorve uma parte significativa da mão-de-obra qualificada, sobretudo jovem.
Não podemos acolher a mensagem de que a qualificação não é uma mais-valia. É um tiro no pé.
Ainda bem que os jovens estão compreender isso mesmo embora seja ainda preocupante o número que está na situação de “nem, nem”, nem estudam ou estão em programas de formação, nem trabalham.

INQUIETAÇÕES, INQUIETAÇÕES

Ao que se lê na imprensa de uma reunião entre a FENPROF e a Confederação Nacional das Associações de Pais (CONFAP) resultou o expressar conjunto de preocupações com as alterações previstas à lei sobre a educação especial.
Compreendo e acompanho algumas preocupações com as alterações que parecem estar em processo de decisão a propósito do Regime Legal da Inclusão Escolar.
No entanto e por estranho que pareça, também devo dizer que me preocupa a falta de alterações no que acontece neste universo.
Ainda ontem conheci na primeira pessoa, uma mãe, uma história muito feia elucidativa do que por vezes acontece … em nome da inclusão.
E a minha maior preocupação é que das alterações previstas não resulte um dispositivo de regulação que minimize os problemas levantados por uma das dimensões, porventura a única, em que o sistema é verdadeiramente inclusivo, acomoda práticas e intervenções das mais variadas, desde a excelência à mediocridade atropeladora dos direitos dos miúdos. Tudo isto sem um sobressalto.
Daí este meu cansaço e inquietações

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

O TRABALHO COLABORATIVO

A OCDE divulgou o V volume de Relatórios construídos a partir dos resultados do PISA de 2015, “COLLABORATIVE PROBLEM SOLVING”.
O trabalho é extenso e com dados e análises que merecem leitura,quer no que respeita a Portugal quer na reflexão global e estratégica.
Num tempo em que já cansa ouvir falar de inovação e mudança em educação, parece oportuno recuperar algo que não é novo, a importância do trabalho cooperativo ou colaborativo entre os alunos.
No entanto e tal como se refere no Relatório o trabalho colaborativo entre alunos assenta em ambientes de escola colaborativos, em colaboração entre professores e envolvimento das famílias.
Na verdade o recurso a ambientes colaborativos de ensino, aprendizagem, desenvolvimento profissional e educação são ferramentas reconhecidas de promoção de qualidade nos processos educativos e com impactos muito para além dos resultados escolares.
A este propósito uma pequena história "um bocado" sem sentido e improvável.
Era uma vez uma Professora que andava com umas dúvidas sérias. Ela achava que os seus alunos trabalhavam melhor e sentiam-se também melhor quando, por períodos grandes, falavam nas aulas. Tinha lido umas coisas sobre estas matérias, organizava debates e muitos trabalhos realizados em grupo e com grandes discussões entre os alunos. Esta ideia não ia muito ao encontro da sua experiência de pequena e de muita da formação que lhe deram. Por outro lado, parte significativa dos seus colegas criticavam porque, diziam, fomentava maus hábitos nos alunos e levava a que os alunos deles lhes levantassem problemas porque queriam falar. Além disso, na comunicação social, apareciam uns opinantes a afirmar que, na escola, o trabalho dos meninos é ouvir o professor e estudar. É assim que se aprende, dizem essas pessoas. Tudo isto lhe causava dúvidas sobre o que estava fazer.
Um dia, na biblioteca, encontrou o Professor Velho, o que fala com os livros, e, em jeito de desabafo, comentou as suas inquietações e a dificuldade em explicar a ideia que acreditava ser certa. O Professor Velho riu-se e falou daquele modo baixinho, “Professora, que ouvimos nós da maioria dos pais quando percebem os seus filhos muito tempo quietos e calados?”. “Ó Velho não brinques. Os pais costumam dizer que ou estão doentes, ou estão a fazer asneira, ou já fizeram asneira”.
Pois é Professora, pergunta aos teus colegas se querem os alunos doentes ou a fazer asneira”.
Obrigada Velho, eu estou certa, vou falar com os alunos sobre isto”.

terça-feira, 21 de novembro de 2017

COISAS DE MIÚDOS, COISAS DE GRAÚDOS

Quando se olha e atenta nos tempos que vão correndo parece que o mundo anda do avesso. Reparamos nos comportamentos das pessoas, nos seus discursos e atitudes e quando achamos que estão a passar das marcas, seja no que for, alguém avalia, “parecem miúdos” ou “piores do que os miúdos”, etc. No fundo, parece que os adultos quando se portam mal agem como miúdos, quando se portam bem, bom, nesse caso serão adultos.
Por outro lado e curiosamente, quando olhamos para os miúdos e reparamos nos seus comportamentos menos positivos achamo-los tremendamente parecidos com os adultos. Aliás, de vez em quando ouvem-se vozes a defender que quando os miúdos fazem as asneiras semelhantes às dos adultos devem ser tratados como adultos, por exemplo, prendendo-os.
De facto, o mundo parece um bocado esquisito e do avesso. Os miúdos quando se portam mal parecem adultos e os adultos quando se portam mal parecem miúdos.
Será isto que se entende por trocas entre gerações? E que tal os graúdos deixarem de fazer concorrência aos miúdos na forma como agem, para que também estes não sintam a tentação de parecer adultos a fazer asneiras?
No meio destas inquietações ainda tenho uma dúvida acrescida. Porque será que me lembrei disto hoje?

A GUERRA É A GUERRA

A questão da carreira dos professores é uma situação complexa sobretudo pelo impacto da reposição dos efeitos de congelamento verificado. Não estranho, pois, a discussão que tem gerado e a dificuldade de encontrar compromissos.
O que me parece mais curioso e há dias já o referi é que esta discussão seja alimentada também por uma agenda que dela se serve para diabolização dos professores, as pessoas a quem entregamos os nossos filhos todos os dias.
A discussão serve também para que se possa atacar a escola pública e o esforço e a competência da esmagadora maioria dos que nela trabalham.
Continuam a aparecer na comunicação social nos seus vários formatos intervenções que produzidas pelos “falcões” habituais ou caceteiros de ocasião são intelectualmente desonestas, escondendo realidades sobre os professores e o seu trabalho e o trabalho de alunos e escolas e recorrendo às tão em moda “fake news”, factos alternativos.
Como escrevi vejo muita gente ligada à educação considerar como ignorantes as afirmações de muitos desses opinadores. Não sejamos ingénuos, não é ignorância, é guerra política pura e dura.
Como cantava o Fausto, “a guerra é a guerra”.

segunda-feira, 20 de novembro de 2017

OS ALÇAPÕES DA "NET"

Umas notas, agora na Visão online, sobre os alçapões da “net” nos quais os mais novos podem tropeçar e a que importa estar atento.
(...)
Não me parece boa ideia “diabolizar” as novas tecnologias. Fazem parte do nosso quotidiano e são excelentes ferramentas de acesso a conhecimento e a entretenimento. A definição de regras, tempo,  atenção aos conteúdos e circunstâncias de utilização será uma atitude bem mais ajustada
(...)

OS DIREITOS DA CRIANÇA, UMA AGENDA POR CUMPRIR

O calendário das consciências determina para hoje o Dia Universal dos Direitos da Criança assente numa dupla comemoração, a proclamação da Declaração dos Direitos da Criança (1959) e adopção da Convenção sobre os Direitos da Criança (1989) pela Assembleia Geral das Nações Unidas.
É verdade que nestes 58 anos, pensando sobretudo na realidade portuguesa, muito evoluímos também no que respeita ao universo dos mais novos. No entanto, os Direitos da Criança continuam uma agenda por cumprir por muitas e diferentes razões.
Os ventos malinos que sopram e o enorme conjunto de dificuldades que atravessamos apesar de algumas melhorias, ancorados num quadro de valores que tende a proteger mercados e interesses outros que conflituam com os interesses e bem-estar da maioria das pessoas vão criando exclusão, pobreza e negação de direitos. Aliás, é frequente o entendimento de que os direitos devem ser entendidos como sendo de geometria variável, ou seja, dependem da conjuntura económica pelo que os que menos têm também terão os seus direitos diminuídos.
Neste cenário, conforme os estudos e a experiência mostram, os mais novos constituem um grupo especialmente vulnerável.
Nesta vulnerabilidade existem três áreas em que me parece que os direitos estão particularmente ameaçados, as crianças e adolescentes em risco de maus tratos, abusos e negligência, a pobreza infantil e o direito à equidade nas oportunidades de acesso à educação de qualidade para todas as crianças, sublinho, TODAS as crianças.
De uma forma geral, os discursos e a retórica política sempre acentuam a importância destas matérias mas é preciso ir um pouco mais longe. Por exemplo, dotar as Comissões de Protecção de Crianças e Jovens dos meios suficientes e qualificados para a detecção e acompanhamento eficaz dos casos de risco, ou caminhar no sentido de diminuir o número de crianças institucionalizadas e sem projecto de vida.
No que respeita ao risco de pobreza, as crianças são sempre o elo mais fraco de uma sociedade com um fosso demasiado grande entre os mais ricos e os mais pobres. As políticas sociais não podem deixar de entender como prioritário, sobretudo nos tempos que atravessamos, os apoios sérios e fiscalizados aos problemas das famílias que envolvem, necessariamente, os mais novos. É o seu futuro que está em causa.
No que respeita à educação, a equidade e o objectivo de que todos atinjam o patamar possível de sucesso educativo e qualificação é o grande desafio. Os discursos políticos nunca esquecem o grande desígnio da educação ou a paixão pela educação. Precisamos de caminhar de forma séria e não tentados pela sedução do sucesso estatístico, para a qualidade dos processos educativos que se traduz nos níveis de qualificação das pessoas (não da simples certificação), na diminuição das taxas de abandono e insucesso, enfim, na construção de projectos de vida viáveis e bem-sucedidos. Muitas crianças e adolescentes com necessidades especiais vêem atropelados os seus direitos a dimensões básicas da qualidade de vida, a educação, por exemplo.
Torna-se imperativo promover a participação e fazer ouvir, escutando, a voz dos mais novos.
Continuamos com uma agenda por cumprir no que respeita ao seu bem-estar.

domingo, 19 de novembro de 2017

A TERRA ESTÁ ZANGADA

Imagino que a Terra comece a ficar cansada da irresponsabilidade delinquente desta gente que a povoa, sobretudo dos que lideram. Depois de tanta asneira insistem nos maus-tratos e não se entendem sobre a forma de mudar de rumo.
Dão-lhe cabo das entranhas, alteram-lhe o clima, mudam paisagens, esgotam-na, deixam-na estéril e sem sustento. Estamos em Novembro e a terra está seca e as nuvens que trazem água andam longe. Aqui no Alentejo o dia está feio de tão bonito.
A Terra não está a aguentar. E nós também não.
A minha avó Leonor, mulher de sabedoria, costumava dizer que não era bom a gente meter-se com a Terra, com a natureza, e maltratá-la. A natureza vai ser sempre maior que a gente e não aceita que mandem nela.
Quando acorda zanga-se e quando se zanga os efeitos são devastadores. Apesar destes avisos não parece que a levem a sério.
Esta gente não aprende mesmo, já não espero que o fizessem em nome deles, os seus interesses imediatos não deixam. Mas podiam fazê-lo em nome dos filhos, dos filhos dos filhos, dos filhos dos filhos dos filhos,  …

sábado, 18 de novembro de 2017

QUE SE SEPAREM OS PAIS MAS NÃO SE SEPAREM OS FILHOS

Na Visão encontra-se uma interessante entrevista com Sofia Marinho sobre a importância da promoção da residência alternada, a crianças viver com pai e mãe alternadamente após processos de separação conjugal.
Os inquéritos junto das famílias e os estudos mostram que em princípio é mais vantajoso para a criança viver em casa do pai e em casa da mãe por períodos alternados do que a situação mais habitual nos casos de regulação parental, a entrega da criança à mãe e visitas ao pai. A própria cultura dos Tribunais de Família alimenta decisões desta natureza subvalorizando por preconceito e representação a capacidade cuidadora e educadora dos pais entendo-o sobretudo como “financiador” e parceiro para brincadeiras. Este modelo gera potenciais assimetrias e afastamento entre as crianças e os pais assimetria
É evidente que ao defender o princípio da residência alternada estamos a falar num princípio geral que deverá ser considerado caso a caso.
Importa ainda sublinhar que as crianças gerem muito bem a dimensão logística da residência alternada. Na verdade, desde muito novas as crianças lidam tranquilamente com progenitores separados que as amem e delas cuidem e com quem convivam alternadamente.
É sempre preferível uma boa separação a uma má família e compete aos adultos o esforço, por vezes pesado, de construir uma boa separação. Aliás, só assim poderão voltar a constituir uma boa família.
Importante mesmo é que também todos os que de nós lidamos com crianças e com os seus problemas possamos ajudar os pais neste entendimento, poupando sofrimento a adultos e crianças e mesmo decisões de guarda parental pouco amigáveis para o superior interesse da criança.

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

M'ESPANTO ÀS VEZES, OUTRAS M'AVERGONHO

Como diria Sá de Miranda, "M'espanto às vezes, outras m'avergonho". É notável a quantidade de peças nos meios de comunicação social, em diferentes formatos, que trata de forma ignorante e manipuladora a questão da carreira dos professores e o que está em discussão e é complexo. Como é óbvio, contrariamente ao que encontro em muitas referências não é por incompetência, longe disso.
Trata-se de um processo intencional subordinado às agendas do costume, aos preconceitos do costume e protagonizado pelas figuras do costume de que relevam tudólogos como José Manuel Fernandes ou Miguel Sousa Tavares.
Eles sabem o que dizem.
Uma nota final para afirmar com clareza que não estou envolvido pessoalmente neste processo e, portanto, não é uma reacção de natureza corporativa, é apenas uma questão de seriedade.

APOIOS TERAPÊUTICOS GRATUITOS

Lê-se no DN que as crianças que frequentam o 1º ciclo no Concelho de Gaia e têm necessidades educativas especiais vão ter acesso gratuito a diferentes abordagens terapêuticas.
O trabalho é realizado no âmbito do Programa “Gaia@Aprende+” e assentará numa parceria com instituições existentes no Concelho.
Independentemente das opções sobre as abordagens terapêuticas e o seu ajustamento às tipologias de necessidades individuais julgo de registar esta preocupação de estender de forma gratuita apoios terapêuticos a crianças com necessidades especiais.
Não conheço os pormenores de operacionalização desta inciativa mas espero que a participação destes alunos nas actividades terapêuticas referidas acautele um processo de inclusão e participação não guetizada. Confesso que me custa assistir, por exemplo, às idas à piscina de um grupo de adolescentes "especiais" numa altura em que mais ninguém está na piscina ou que fiquem acantonados num espaço "especial" e isto seja feito em nome da inclusão.
Como sempre afirmo, os níveis de desenvolvimento das comunidades também se afere pela forma como lidam com as minorias e as suas problemáticas que com frequência são comuns.

quinta-feira, 16 de novembro de 2017

O NÚMERO DE ALUNOS POR TURMA, MAIS UMA VEZ

No âmbito da discussão do OGE para 2018 e ao que se lê no Público, o ME terá aceite a proposta do PEV e estenderá a partir do próximo ano lectivo a redução do número de alunos por turma, pelo menos dois, a todas as comunidades escolares. Como se sabe, a medida em desenvolvimento contempla apenas os considerados Territórios Educativos de Intervenção Prioritária. A decisão será colocada em prática de forma faseada como parece estar em moda, . Começando em 18/19 pelos anos iniciais de cada ciclo o objectivo é atingir o que estava estabelecido antes da alteração promovida por Nuno Crato em 2013, máximo de 24 alunos no 1º ciclo e de 28 nos restantes ciclos do Básico.
Espero que nesta iniciativa não seja esquecido um outro importante aspecto nem sempre valorizado, o número de alunos por professor. Muitos professores lidam com muitas turmas perfazendo números acima dos 120 ou 150 alunos. Parece dispensável explicitar as implicações negativas desta situação.
Como tantas vezes tenho afirmado é uma medida que se justifica e que importa incentivar.
A revisão de estudos sobre esta matéria mostra o que também conhecemos, existem vantagens em turmas de menor dimensão que podem ser mais ou menos significativas em função das variáveis em análise.
Parece-me de acentuar que os estudos sugerem com clareza a existência de impacto positivo no clima e comunicação na sala de aula, na maior facilidade de práticas educativas mais diferenciadas, no comportamento dos alunos, etc., o que, evidentemente deve ser considerado.
Alguns estudos, apenas centrados em resultados, não encontram diferenças significativas mas também me parece que não são consideradas variáveis importantes, de contexto por exemplo, o que nem sempre é tido em conta nos discursos de alguns economistas da educação.
É também fundamental considerar as diferentes características dos diversos territórios educativos. O facto de começar pelos TEIP percebe-se numa lógica de faseamento mas a verdade é que todos os territórios educativos são TEIPs, os de Intervenção Prioritária e os outros em que realiza a Intervenção Possível.
Na verdade, é necessário considerar as diferenças de contexto, isto é, a população servida por cada escola, as características e dimensão da escola, a constituição do corpo docente, os recursos disponíveis, etc. Importa ainda sublinhar que a qualidade e sucesso do trabalho de professores e alunos depende de múltiplos factores, sendo que a dimensão do grupo é apenas um, ou seja, importa considerar, vejam-se relatórios e estudos nesta área, as práticas pedagógicas, os processos de organização e funcionamento da sala de aula e da escola, bem como o nível de autonomia de cada escola ou agrupamento, entre outros. Daí a importância de promover uma autonomia real. Aliás, dentro do que entendo por verdadeira autonomia das escolas, deveriam ser a ter a competência para definir e organizar as turmas embora aceite a existência de orientações nesse sentido.
Aliás, também com base na autonomia das escolas poderiam ser consideradas outras opções como a presença de dois professores em sala de aula. Em algumas circunstâncias pode ser mais vantajosa que a redução do número de alunos por turma.
Acresce nesta matéria a importância da qualidade do trabalho em turmas com alunos com necessidades educativas especiais o que, evidentemente, deve ser considerado na análise do efectivo de turma, desde logo cumprindo o que está legislado.
Diga-se ainda que é quase dispensável referir a diferença entre trabalhar com 26 ou 28 alunos num estabelecimento privado de acesso “protegido” ou com o mesmo número de alunos num mega-agrupamento de uma escola pública em que um professor lida com várias turmas, centenas de alunos ou se desloca entre escolas para trabalhar.
Não só por esta razão, dimensão das turmas e qualidade do trabalho dos alunos, de todos os alunos, e dos professores, também me parece que deveria ser promovida uma verdadeira desburocratização do trabalho nas escolas e promovido algum ajustamento na sua organização e funcionamento o que certamente libertaria tempo de professores para trabalho em turma ou em apoios que promovessem qualidade.
Sei que mudanças neste sentido são politicamente difíceis mas parecem-me imprescindíveis. Terão custos certamente mas os custos do insucesso e da exclusão são incomparavelmente mais caros.

ESTUDAR COMPENSA. DEFINITIVAMENTE

Um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos, “Benefícios do Ensino Superior” hoje apresentado e realizado por Hugo Figueiredo Miguel Portela mostra algo que importa registar, a qualificação de nível superior compensa e o impacto é mais significativo com o mestrado.
O trabalho abrangeu o período ente 2006 e 2005 e considerou a população mais jovem, dez ou menos anos de experiência profissional e é mais um contributo para uma questão que muitas vezes é tratada com alguns equívocos.
O primeiro, radica no discurso recorrentemente difundido, ampliado por alguma imprensa preguiçosa, de que, dada a enorme taxa de desemprego de jovens com qualificação superior, o investimento numa qualificação superior não compensa pois não existe mercado de trabalho, alguns empregos que surgem são precários e mal pagos e muita gente qualificada está a ser empurrada para fora por falta de futuro cá.
Um outro equívoco remete para o estatuto salarial. Apesar da política de proletarização do mercado de trabalho, da precariedade e do manhoso recurso a estágios, nem sempre remunerados ou seguidos de emprego, a formação superior ainda compensa. Os dados hoje divulgados desmentem, mais uma vez, este entendimento.
Aliás, de acordo com um estudo do Conselho Nacional de Educação divulgado em 2015 um indivíduo com formação universitária, ao longo da vida activa, ganhará mais cerca de 1,7 milhões de euros face a alguém com o 9º ano. Mesmo comparando com o 12º ano a diferença continua muito significativa.
Os dados hoje divulgados coincidem também com estudos da OCDE, o Relatório da OCDE, "Education at a Glance 2012" mostrava que a diferença salarial de jovens com licenciatura para jovens com formação a nível do secundário, é de 69 %, um bom indicador para o impacto da qualificação.
É claro que não podemos esquecer o altíssimo e inaceitável nível de desemprego entre os jovens, em particular entre os jovens com qualificação superior, obrigando tantos a partir à procura de um futuro que por cá não vislumbram mas esta questão decorre do baixo nível de desenvolvimento do nosso mercado de trabalho, de circunstâncias conjunturais e de erradas políticas de emprego e não da sua qualificação.
Neste cenário e como sempre afirmo, o discurso muitas vezes produzido no sentido de que "não adianta estudar" não colhe e não tem sustentação sendo, um autêntico tiro no pé de uma sociedade pouco qualificada como a nossa que, efectivamente e contrariamente à tão afirmada quanto errada ideia de que somos um país de doutores, continua, em termos europeus, com uma das mais baixas taxas de qualificação superior em todas as faixas etárias incluindo as mais jovens.
Conseguir níveis de qualificação compensa sempre e é imprescindível. Estudar e conseguir qualificação de nível superior compensa ainda mais.
Portugal não tem gente qualificada a mais, tem é desenvolvimento a menos. Temos também um mercado de trabalho que a cegueira da austeridade e do empobrecimento proletarizou e que não absorve uma parte significativa da mão-de-obra qualificada, sobretudo jovem. Não podemos acolher a mensagem de que a qualificação não é uma mais-valia.
É um tiro no pé.

quarta-feira, 15 de novembro de 2017

O TELEMÓVEL NA SALA DE AULA. A FAVOR OU CONTRA?

A Edulog, estrutura da Fundação Belmiro de Azevedo, organizou esta tarde um debate integrado no ciclo de conferências EDUTALKS com o sugestivo título “TELEMÓVEL NA SALA DE AULA: SIM OU NÃO?”
O Público ouviu alguns dos especialistas que participam no debate e encontrou opiniões “a favor” e “contra”.
Confesso que é com alguma perplexidade que vejo matérias desta natureza serem apreciadas a preto e branco, a favor ou contra. Aliás, passou-se, passa-se, o mesmo com a utilização de computadores na sala de aula. Algumas notas.
Como já tenho afirmado, considerando o que se sabe em matéria de desenvolvimento das crianças e adolescentes, dos processos de ensino e aprendizagem e da sua complexa teia de variáveis, das experiências e dos estudos neste universo, mesmo quando parece contraditórios entendo que:
1 – O contacto precoce com as novas tecnologias é, por princípio, uma experiência positiva para os miúdos, para todos os miúdos, se considerarmos o mundo em que vivemos e no qual eles se estão a preparar para viver. Nós adultos estamos a pagar um preço elevado pela iliteracia, os nossos miúdos não devem correr o risco da iliteracia informática.
2 – As novas tecnologias, incluindo o telemóvel, na sala de aula são mais uma ferramenta, não são A ferramenta, não substituem a escrita manual, não substituem a leitura em papel, não substituem a aprendizagem do cálculo, … não substituem coisa nenhuma, são “apenas” mais um meio ao dispor de alunos e professores para ensinar e aprender e agilizar o acesso a informação.
3 – É preciso evitar o deslumbramento provinciano do novo-riquismo com as tecnologias, reafirmo, são apenas ferramentas que a evolução nos disponibiliza e não algo que nos domina e é visto como uma panaceia.
4 – O que dá qualidade e eficácia aos materiais e instrumentos que se utilizam na sala de aula não é a tanto a sua natureza mas, sobretudo, a sua utilização, ou seja, incontornavelmente, o TRABALHO DO PROFESSOR é uma variável determinante. Posso ter um computador ou um telemóvel para fazer todos os dias a mesma tarefa, da mesma maneira, sobre o mesmo tema, etc. Rapidamente se atinge a desmotivação e ineficácia, é a utilização adequada que potencia o efeito das capacidades dos materiais e dispositivos.
5 – A sua utilização em sala de aula é também uma forma de aumentar os níveis de auto-regulação no seu uso pois terão a supervisão dos professores e não o acesso muitas vezes sem controlo por parte dos pais.
6 - Para além de garantir o acesso dos miúdos aos materiais é fundamental disponibilizar a formação e apoio ajustados aos professores sem os quais se compromete a qualidade do trabalho a desenvolver bem como, evidentemente, assegurar as condições exigidas para que o material possa ser rentabilizado.
7 – Finalmente, como em todas as áreas, é imprescindível avaliar o trabalho realizado, única forma de garantir a sua qualidade.
8 – A utilização do telemóvel por parte dos alunos para comportamentos inadequados, não é um problema do telemóvel, é um problema de disciplina na sua utilização. A proibição não funciona ficazmente, muitos comportamentos proibidos são diariamente evidenciados, por miúdos e graúdos (alguns até bem “graúdos”).
9 - Para alumas crianças ou jovens com NEE as novas tecnologias, incluindo o telemóvel, constituem uma ferramenta imprescindível de inclusão, participação e aprendizagem.
Não conheço as conclusões do debate mas gostava que apesar de ter começado com “a favor” ou “contra” fosse um pouco mais heurístico.

DIA DE GREVE

Realiza-se hoje a greve de professores convocada pelas maiores estruturas representativas da classe numa coincidência que nem sempre se verifica. Não são ainda conhecidos os dados da adesão mas os indicadores sugerem números significativos.
Não me pronuncio sobre a bondade ou justificação dos protestos no plano estritamente profissional dos professores, mas como ainda ontem escrevi entendo que muitas das matérias que estão em causa também nos dizem respeito na medida em que algumas das medidas de política que os envolvem também têm consequências na qualidade do seu trabalho, na qualidade da escola pública e, portanto, no bem-estar e futuro dos alunos.
Também não esqueço a sempre presente componente de luta partidária e como o universo da educação é um palco privilegiado desta luta.
Não estranho evidentemente os discursos que procuram sobrevalorizar os efeitos e a instabilidade que a greve implicará para famílias e alunos.
Como já escrevi noutras ocasiões, estou convicto de que a generalidade dos professores não quereria sentir motivos para realizar a greve com os constrangimentos que dela poderão resultar até para si próprios. O que tenho alguma dificuldade em perceber é como pode uma greve de professores não ter impacto nos alunos. Provavelmente só mesmo realizada nas férias o que parece uma hipótese remota. O recurso à greve assenta, justamente no impacto que ela tem, não há volta a dar.
No que se refere à instabilidade e considerando experiências anteriores os discursos produzidos por parte da tutela, por umas razões, por parte dos representantes dos professores e dos próprios professores (nem sempre coincidem), por outras razões e ainda pelos pais ou seus representantes, ainda por outro conjunto de razões, ou os discursos de “opinadores” ignorantes e com agenda própria, talvez sejam mais susceptíveis de criar instabilidade nos alunos do que um dia de greve.
O que parece menos positivo é o constante discurso de diabolização dos professores que também recebe um fortíssimo contributo por parte de algumas afirmações dos que os representam e que degradam, enfraquecem, a imagem social dos docentes com reflexos sérios e negativos na relação que a comunidade estabelece com eles.
Entregamos todos os dias os nossos filhos e netos nas mãos de uma classe que para cumprir o seu enorme e insubstituível papel na construção do futuro, precisa, para além da competência, de ter a confiança da comunidade.
Assim nós, todos, façamos a nossa parte.

terça-feira, 14 de novembro de 2017

PESSOAS

Lamento que algumas susceptibilidades se sintam magoadas. Muitas vezes aqui tenho escrito que  alguns dos problemas dos professores são também problemas nossos. Da sua estabilidade, competência e valorização depende o nosso futuro, constroem-nos todos os dias com os miúdos à frente.
Com generalizada competência e empenho apesar de alguns maus-tratos e de políticas que os não valorizam, antes pelo contrário e que já vêm de longe, recordo Maria de Lurdes Rodrigues e Nuno Crato, respondem com sentido ético e deontológico à sua missão.
Ao ler muitos comentários nas redes sociais sobre o episódio de saúde do Ministro da Educação, devo dizer que me senti incomodado, não são sensatos e dignos num espaço desta natureza, social e alargado. Não pode valer tudo. Eu não aceitaria alguns dos comentários que li se fossem produzidos por alunos que, por qualquer razão, justa ou injusta, não gostassem de algum dos seus professores.
Desculpem mas não é razoável.
Esta nota não tem moralismo, não tem rigorosamente a ver com fidelidade política, tenho a liberdade de pensamento que também advém de estar fora de qualquer enquadramento partidário, tem apenas a ver, desculpem mais uma vez, com urbanidade e com as relações entre as pessoas.

A HISTÓRIA DAS PALAVRAS QUENTES

Estava o Professor Velho, o que está na biblioteca e fala com os livros, de animada conversa com um livro bom conversador, quando entrou a Professora Paula para entregar uns materiais que tinha requisitado para umas aulas.
Então Paula, correu bem o trabalho?
Muito bem Velho, os miúdos aderiram, trabalharam, aprenderam e acho que se divertiram, os materiais eram interessantes.
A professora deles também ajudou comentou o Professor Velho, rindo-se.
Fazemos o que podemos Velho, mas o Fábio continua a preocupar-me. Sabes quem é?
Sim conheço o Fábio, desde que ele entrou para a nossa escola. Mas que te preocupa nele?
Foi o que menos participou no trabalho, fez o mínimo possível. Sempre distante, nunca se envolvendo com os outros. Há já algum tempo que ele anda assim e depois, nem sei bem como descrever, tem um olhar frio, sem expressão. Até parece que ele próprio está frio. Quando o olhamos e ele devolve aquele olhar tão frio, acho que até eu gelo.
Tens tentado falar com ele?
Não consigo Velho, procuro ajudá-lo nos trabalhos na sala mas acho que ele não está muito disponível.
Falaste com palavras quentes?
Palavras quentes?! Não entendo Velho.
Estou a falar de palavras que aquecem quando são ditas a alguém, "gosto de ti", "estou preocupada contigo", "gosto de conversar contigo" e outras assim. Talvez o Fábio tenha o coração com gelo, não sabemos como se formou mas podemos tentar derretê-lo um pouco para depois compreender.
Velho, tu és estranho. Gosto de ti.

DAS TECNOFORMICES

Como sempre nestas ocasiões e de acordo com o “script” clássico, os envolvidos dirão que estão de “consciência tranquila”. Acredito que tal possa acontecer pois para este pessoal “consciência” não significa certamente o mesmo que para a maioria das pessoas.
É por demais evidente que para boa parte desta gente, legalidade, transparência, ética ou minudências como pagar contribuições, impostos, etc., são “contos para crianças”, coisas, por assim dizer, para “tótós”, nós
Tenoformices, relvices, varices, loureirices. salgadices, amigos mecenas para socratices, negócios manhosos e corrupção, tráfico de influências e amiguismo, utilização eficaz dos alçapões da justiça criteriosamente desenhados para efeitos de protecção dos seus interesses e outras habilidades da mesma natureza, são ferramentas diariamente usadas por esta família alargada e diversa que há décadas ocupou um largo espectro do nosso contexto social, político e económico.

segunda-feira, 13 de novembro de 2017

DO FIM DO ENSINO VOCACIONAL

Conforme já tinha anunciado o ME vai formalmente proceder à extinção do ensino vocacional no ensino básico. Retomo notas que na altura do anúncio da decisão por aqui deixei e partilhei em espaços de intervenção profissional.
A forma como a decisão foi recebida na altura em que foi anunciada, creio que em Maio, e a discussão que se tem gerado é, do meu ponto de vista, contaminada por alguns equívocos presentes desde logo pela colocação de questões como “sim ou não ao ensino vocacional?”
Como muitas vezes tenho afirmado é fundamental diversificar a oferta formativa, ou seja, promover a diferenciação de percursos. Só por esta via me parece possível atingir um objectivo absolutamente central e imprescindível, todos os alunos devem aceder a alguma forma de qualificação, única forma de combater a exclusão e responder mais eficazmente à principal característica de qualquer sala de aula actual, a heterogeneidade dos alunos. Aliás, o alargamento da oferta formativa de natureza profissional no âmbito do ensino secundário que também está a acontecer apesar de constrangimentos e sobressaltos é um passo nesse sentido e tem contribuído para baixar os níveis de abandono. Importa, no entanto, garantir que esta oferta não seja preferencialmente dirigida para os "que não servem" para a escola.
Parece, pois, claro que temos de estruturar percursos de ensino com formação de natureza profissional. A questão que se coloca é quando deve ser disponibilizada esta oferta e para quem.
Relativamente ao modelo que esteve em vigor sempre considerei fortemente discutível, até num plano ético, a introdução desta diferenciação tão cedo, aos 13 anos, e “obrigatória” para os que chumbam. Por outro lado, aos 13 anos, apesar de se remeter a “decisão” para um processo de orientação vocacional que a insuficiência gritante de recursos não permite assegurar, que alunos decidem? Alguém vai decidir por eles.
Poucos sistemas educativos assumem este entendimento e o facto de o ensino alemão, a inspiração de Nuno Crato, colaboradores e admiradores, o admitir não é uma certificação da correcção do modelo como atestam as apreciações internacionais.
Na verdade, relatórios da OCDE e da UNESCO têm sustentado que a colocação dos alunos com piores resultados escolares em ensino de carácter técnico e vocacional muito cedo em vez da aposta nas aquisições escolares fundamentais aumenta a dificuldade na mobilidade social com reflexos ainda mais pesados num país como o nosso, ainda com baixa qualificação escolar em muitas famílias para além das suas dificuldades económicas.
Neste patamar etário, mais do que de ensino vocacional os alunos precisam de apoios que lhes permitam, bem como aos seus professores, minimizar dificuldades e risco de insucesso. 
É real e devastador o cenário que ainda temos em matéria de retenção. Temos de responder às causas deste enorme problema mas não podemos mascarar as estatísticas empurrando os “maus” para percursos que “recebem” um rótulo de “segunda” pois são percebidos por parte da comunidade como destinados aos menos dotados, “preguiçosos” ou com problemas vários. É, no entanto, verdade que a sua deriva para o ensino vocacional também compunha estatísticas.
Por outro lado, este tipo de oferta tem de ser adequado às comunidades educativas e dotada dos recursos e meios necessários bem como de maior e efectiva autonomia das escolas. Como tem sido referido em diferentes avaliações e pelas direcções escolares esta situação está longe de acontecer.
Julgo ser de sublinhar que todos os alunos deverão cumprir uma escolaridade de 12 anos e que a idade de entrada no mercado de trabalho é aos 16 o que deve ser ponderado no desenho de ofertas formativas que envolvam trabalho em empresas. Aliás, esta questão deve, é uma forte convicção, ser também considerada quando se trata de alunos com necessidades especiais que ao abrigo de um dispositivo estranhamente designado por Currículo Específico Individual são em algumas circunstâncias sujeitos a situações pouco claras que de educação, formação ou inclusão têm pouco, seja em espaço escolar, seja em espaço institucional ou laboral. Também por isto o modelo que estava em vigor parece francamente desajustado tendo sido desencadeada a sua generalização sem que nessa altura tivesse terminado a sua avaliação.
Nesse modelo os alunos com insucesso, estamos a falar, presumo, de gente com capacidades "normais" iriam “obrigatoriamente” para o ensino vocacional. Como já referi e é reconhecido o insucesso escolar é mais prevalente em famílias mais desfavorecidas. Neste cenário, como a UNESCO reconhece, mantém-se formalmente a velha ordem, os mais pobres "destinados" preferencialmente para o trabalho manual e os mais favorecidos preferencialmente para o trabalho intelectual.
A diferenciação dos percursos é necessária e imprescindível, incluindo ensino vocacional, mas, reafirmo, deve surgir mais tarde, disponível para todos os alunos como se verifica na maioria dos sistemas educativos que se preocupam com os alunos, com todos os alunos. O que deve estar disponível desde sempre são dispositivos de apoio suficientes, competentes e oportunos a alunos e professores e alguma diferenciação que permita acomodar melhor a diversidade dos alunos.
A ideia de um ensino básico universal, constante no Programa do Governo e com a qual em princípio concordo, não me parece contraditória com a definição de alguma diferenciação de trajectos que também defendo.
Esta diferenciação pode traduzir-se, por exemplo, na introdução no que agora é o 3º ciclo de algumas disciplinas de natureza opcional.
A existência de um modelo curricular deste tipo permitiria, se necessário com orientação adequada, optimizar as escolhas dos alunos e a sua entrada no ensino secundário. Neste patamar deverá estar disponível uma oferta mais diversificada incluindo alguma já de natureza profissionalizante.
Finalmente, julgo que este caminho de diferenciação deveria ser também acompanhado pelo acréscimo real de autonomia das escolas e agrupamentos incluindo a dimensão curricular e a oferta educativa.

A MANUELA RALHA E A LUTA QUE CONTINUA

Em primeiro lugar a referência a uma lutadora, Manuela Ralha, que é uma inspiração e um exemplo num universo onde apesar do que já foi feito, muito ainda está por fazer, o cumprimento dos direitos das pessoas com deficiência.
Uma segunda referência para um trabalho no JN sobre a ausência de conhecimento sobre os reais problemas de acessibilidade a espaços públicos por parte de pessoas com mobilidade reduzida, como a Manuela Ralha, por exemplo.
Recordo que terminou em 8 de Fevereiro deste ano o prazo de 10 anos para que fosse cumprida a legislação que tornasse os espaços, equipamentos e vias públicas acessíveis a cidadãos com deficiência.
Conforme têm afirmadoo Observatório para a Deficiência e Direitos Humanos e a Confederação Nacional dos Organismos de Deficientes são múltiplas e significativas as dificuldades enfrentadas diariamente por pessoas com mobilidade reduzida e de deslocação no acesso a vias, espaços e equipamentos públicos. É certo que muito foi feito mas muito mais está por cumprir.
São regularmente organizadas iniciativas que que procuram alertar a comunidade as entidades responsáveis para esse conjunto de dificuldades mas o impacto é baixo e lento. Os problemas das minorias são, evidentemente, problemas minoritários.
A questão afecta muitos cidadãos e envolve áreas como vias, transportes, espaços edifícios, mobiliário urbano e, sublinhe-se, a atitude e comportamento de muitos de nós.
Boa parte dos nossos espaços urbanos não são amigáveis para os cidadãos com necessidades especiais mesmo em áreas com requalificação recente. Estando atentos identificam-se inúmeros obstáculos.
Na verdade, apesar do muito que já caminhámos, as crianças, jovens e adultos com necessidades especiais, bem como as suas famílias e técnicos sabem, sentem, que a sua vida é uma árdua e espinhosa prova de obstáculos muitos deles dificilmente ultrapassáveis.
Lamentavelmente, boa parte dessas dificuldades decorre do que as comunidades e as suas lideranças, políticas por exemplo, entendem ser a geometria variável dos direitos, do bem comum e do bem-estar das pessoas, de todas as pessoas.

domingo, 12 de novembro de 2017

AS ARMADILHAS DA NET

O Público de ontem noticiava que o Youtube está a desenvolver esforços no sentido de inibir o acesso por crianças a vídeos que utilizando personagens que lhes são familiares como o Ruca, a Pocoyo e a Peppa Pigs, por exemplo, disponibilizam conteúdos claramente desadequados.
Na verdade e de forma quase casual já me tinha dado conta desta situação mas com a utilização do Lego Duplo. A partir da pesquisa pelo “verdadeiro” Lego Duplo começa a aparecer na barra direita do ecrã o acesso a filmes com conteúdos inquietantes nos quais as crianças facilmente entram pois as personagens e cenários parecem familiares.
Aliás, já tenho abordado esta questão com alguns pais de crianças mais pequenas.
Como sempre digo não adianta diabolizar a “net”, é uma ferramenta importante, ou entrar em fundamentalismos proibicionistas que acabam por não resultar.
Importa de facto, estar atento à utilização, acompanhar essa utilização, dialogar com outros pais para troca de experiência e informação e, sobretudo, promover auto-regulação nas crianças. Não é fácil mas é o caminho.

sábado, 11 de novembro de 2017

À MESA NAS ESCOLAS (Take 2)

As sucessivas denúncias de problemas nas cantinas escolares continuam na agenda. Trata-se evidentemente de situações que não deveriam acontecer, está em causa a saúde e bem-estar de crianças e adolescentes e de muitos funcionários e docentes que são também utentes das cantinas.
Nesta matéria estarão envolvidas questões relativas aos modelos de serviço, em outsourcing e sem regulação apropriada, a tentação do aumento do lucro hipotecando quantidade, qualidade e serviço, negligência e falta de fiscalização, pessoal insuficiente, etc., incluindo um acidente sempre possível.
A tudo isto importa dar resposta, nenhuma dúvida sobre isso.
O que me levanta mais reservas é a generalização de processos disciplinares a alunos que tenham divulgado situações desta natureza, designadamente através das redes sociais.
Compreendo o dever de reserva na utilização e divulgação de imagens em locais públicos e espaços profissionais. É certo que basta entrar no FB, por exemplo, para perceber como boa parte dos utilizadores tem uma concepção extraordinariamente “elástica” para ser simpático do que é privacidade, discrição, pudor, reserva de imagem, etc.
Posso até aceitar a existência de regulamentos institucionais que regulem a divulgação de imagens do funcionamento e espaço interno dessas instituições.
No entanto, julgo que é altamente discutível se o processo disciplinar a alunos que divulgam “atentados” contra o seu bem-estar será uma boa decisão. Provavelmente inibirá futuras acções, retira poder reivindicativo, é claro para todos que a voz de alunos sobre problemas nas cantinas será uma voz baixa para algumas direcções escolares e empresas de prestações de serviços de restauração nas escolas
Julgo que a denúncia por meios não caluniosos e com informação comprovada de atentados ao bem-estar são legítimos, fazem parte da cidadania e da defesa dos direitos e será certamente um instrumento de pressão sobre a regulação que quem de direito deveria assegurar mas que o não faz de forma correcta.


DA VIOLÊNCIA E DOS ABUSOS SOBRE AS MULHERES

Os recorrentes casos da violência doméstica e de assédio e abuso sexual dirigido às mulheres são faces do mesmo problema, o atropelo dos direitos.
O mundo da violência doméstica e dos abusos é bem mais denso e grave do que a realidade que conhecemos, ou seja, aquilo que se conhece, apesar de recorrentemente termos notícias de casos extremos, é "apenas" a parte que fica visível de um mundo escuro que esconde muitas mais situações que diariamente ocorrem.
Por outro lado, para além da gravidade e frequência com que continuam a acontecer episódios de violência e abusos é ainda inquietante o facto de que alguns realizados em Portugal evidenciam um elevado índice deste tipo de comportamentos nas relações entre gente mais nova mesmo quando mais qualificada. Muitos dos intervenientes remetem para um perturbador entendimento de normalidade o recurso a comportamentos que claramente configuram agressividade e abuso ou mesmo violência.
Importa ainda combater de forma mais eficaz o sentimento de impunidade instalado, as condenações são bastante menos que os casos reportados e comprovados, bem como alguma “resignação” ou “tolerância” das vítimas face à situação de dependência que sentem relativamente ao agressor ou abusador, à percepção de eventual vazio de alternativas à separação ou a uma falsa ideia de protecção dos filhos que as mantém num espaço de tortura e sofrimento.
Nesta perspectiva e para casos mais graves de violência torna-se fundamental a existência de dispositivos de avaliação de risco e de apoio como instituições de acolhimento acessíveis para casos mais graves e, naturalmente, um sistema de justiça eficaz e célere.
Torna-se ainda necessário que nos processos de educação e formação dos mais novos possamos desenvolver esforços que alterem quadros de valores, de cultura e de comportamentos que minimizem o cenário negro em que vivemos. A educação é arma mais poderosa de transformação do mundo como sabiamente afirmava Mandela. No entanto, como é sabido, a formação cívica deixou de ser um conteúdo e área curricular obrigatória.
A omissão ou desvalorização desta mudança é a alimentação de um sistema de valores que ainda “legitima” a violência e abuso nas relações, que a entende como “normal”.
Tudo isto tem como efeito a continuidade dos graves episódios de violência e abuso que vão sendo conhecidas e as muitas que acontecem num espaço perto de nós.

sexta-feira, 10 de novembro de 2017

AS IRREDUTÍVEIS NECESSIDADES DAS CRIANÇAS

A propósito da realização da Conferência Internacional “Addressing and Supporting Family and Child Wellbeing | 15 years of Touchpoints in Portugal” organizada Fundação Brazelton/Gomes-Pedro para as Ciências do Bebé e da Família, encontram-se duas estimulantes entrevistas, a Joshua Sparrow no Público e a Gomes-Pedro no Observador.
O Professor Gomes-Pedro é uma das figuras que na linha do Mestre João dos Santos e de há muitas décadas mais se tem destacado na defesa intransigente dos direitos e bem-estar das crianças e das famílias. Para além da prática médica, do ensino, da investigação e produção científicas, da criação da Fundação Brazelton/Gomes Pedro, é fundamental sublinhar a dimensão humanista e ética e intervenção social do Professor Gomes-Pedro com quem tenho o privilégio de me cruzar regularmente e sempre sentir como grande é a sua Pessoa.
A acção da Fundação para as Ciências do Bebé e da Família bem como a própria vida do Professor Gomes-Pedro tem assumido uma importância significativa na promoção e divulgação de uma cultura de protecção e bem-estar das crianças e das famílias, mais um dos serviços que designo como bens de primeira necessidade.
Termino com uma afirmação de um autor muito conhecido na área da educação e do desenvolvimento, Bronfenbrenner, "Para que se desenvolvam bem, todas as crianças precisam que alguém esteja louco por elas". É a condição de base para que se cumpram as irredutíveis necessidades dos miúdos como refere Brazelton.

AS NEGATIVAS DO NOSSO DESCONTENTAMENTO

À semelhança do que já tinha realizado para o 2º ciclo a Direcção-Geral de Estatísticas de Educação e Ciência divulga um estudo sobre o trajecto escolar dos alunos que em 2014/2015 terminaram o 3º ciclo, “Resultados escolares por disciplina - 3.º Ciclo - Ensino Público - Ano letivo 2014/2015”.
Os resultados replicam o padrão já verificado no trabalho sobre o 2º ciclo divulgado em Maio
Em termos globais o chumbo atinge 13.1% dos alunos no ciclo. Por anos o 7º é o que regista maior retenção, 16.7%, indicador também é verificado nos anos iniciais de cada ciclo. Embora no 8º e 9º a retenção diminua tal não parece decorrer de trabalho de recuperação mas do facto de muitos alunos retidos no 7º serem encaminhados para outros trajectos escolares.
Ao nível dos aspectos mais finos da retenção é inquietante que 66% dos alunos que chumbam no 7º ano reprovam a seis ou mais disciplinas sendo a Matemática a que apresenta indicadores mais pesados. No entanto, se o critério for de cinco disciplinas ou mais a taxa passa para uns dramáticos 85% que, evidentemente, são altamente condicionantes de um trabalho de recuperação bem-sucedido.
Um outro dado, também em linha com o que se verificou no 2º ciclo e sem surpresa, é a fortíssima associação entre os altos níveis de retenção e a mais disciplinas e as condições socioeconómicas familiares. De facto, em todas as disciplinas no 7º ano os alunos que reprovam e estão incluídos no Escalão A da Acção Social escolar (famílias com menores rendimentos) são o dobro de alunos com negativas mas não abrangidos pela Acção Social Escolar.
É este cenário inquietante mas que não surpreende que me leva, tal como afirmei em texto de ontem, a aguardar com alguma expectativa os dados do PISA de 2018 que incluirá muitos dos alunos agora retratados.
Já me sinto cansado de tanto falar destas matérias mas a verdade é que julgo necessário insistir. O chumbo, a retenção, só por existir, não transforma o insucesso em sucesso, repetir só por repetir não produz sucesso, aliás gera mais insucesso conforme os estudos mostram quer se queira, quer não.
Assim sendo, a questão central não é o chumba, não chumba e quais os critérios, quantas disciplinas por exemplo. O que deve ser discutido e objecto de políticas adequadas será que tipo de apoios, que medidas e recursos devem estar disponíveis para alunos, professores e famílias desde o início da percepção de dificuldades com o objectivo de evitar a última e genericamente ineficaz medida do chumbo.
Importa também que as políticas educativas sejam promotoras de condições de sucesso para alunos e professores.
O número de alunos por turma em algumas escolas e agrupamentos, os modelos curriculares extensos e prescritivos ainda em vigor apesar de uma “flexibilidade curricular” em experimentação mas que me levanta algumas dúvidas, insuficiência de dispositivos de apoio competentes e adequados são também exemplo de outras variáveis a considerar.
Este tipo de discurso não tem rigorosamente a ver com "facilitismo" e, muito menos, com melhoria "administrativa" das estatísticas da educação, uma tentação a que nem sempre se resiste.
Assim sendo, insisto, o essencial é promover e tornar acessíveis a alunos, professores e famílias apoios e recursos adequados e competentes de forma a evitar a última e genericamente ineficaz medida do chumbo. É fundamental não esquecer que o insucesso continua a atingir fundamentalmente os alunos oriundos de famílias com pior condição económica e social o que inibe o objectivo da mobilidade social, replicando o velho "tal pai, tal filho". Aliás, estes estudos da Direcção Geral de Estatísticas da Educação e Ciência evidenciam isso mesmo, como sempre.
É necessário também diversificar percursos de formação com diferentes cargas académicas e finalizando sempre com formação profissional mas não em idades precoces criando percursos irreversíveis de "segunda" para os "sem jeito para a escola" e "preguiçosos".
Assim sendo, a qualidade promove-se, é certo e deve sublinhar-se, com a avaliação rigorosa e regular das aprendizagens, sim, naturalmente, mas também com a avaliação mas também com a valorização do trabalho dos professores, com a definição de currículos adequados, com a estruturação de dispositivos de apoio eficazes, competentes e suficientes a alunos e professores, com a definição de políticas educativas que sustentem um quadro normativo simples e coerente e modelos adequados e reais de autonomia, organização e funcionamento das escolas, com a definição de objectivos de curto e médio prazo, etc.
É o que acontece, genericamente, nos países com mais baixas taxas de retenção escolar.
É o que não tem acontecido em Portugal.
Ponto.

quinta-feira, 9 de novembro de 2017

OS RESULTADOS POSITIVOS E O CADERNO DE ENCARGOS

De acordo com a edição de 2017 do Relatório “Education and Training Monitor”, divulgado pela Comissão Europeia a análise comparativa dos dados do PISA de 2012 e 2015 evidencia uma descida da percentagem de alunos portugueses com menor desempenho contrariamente ao que se verificou na UE. Este dado sublinha o trajecto que tem vindo a ser realizado pelos alunos e escolas e que se sublinha embora aguarde com alguma curiosidade os dados de 2018, o próximo ano de realização do PISA.
Por áreas avaliadas temos que na leitura, em 2015 17.2% dos alunos portugueses não revelam conhecimentos básicos face a 19.7% na UE sendo que em 2012 em Portugal se verificava 18.8% e na EU 17.8%.
Em Matemática Portugal melhorou de 24.9% de alunos com baixo desempenho para 23.8% e a UE passou de 22.1% para 22.2%.
No que respeita a ciências a discrepância de trajectos é ainda mais acentuada, Portugal desceu o indicador de baixo de desempenho de 19% para 17.4 enquanto a UE agravou de 16.6% para 20.6%.
Veremos se o trajecto de melhoria é suficiente para atingir a meta definida de 15% de desempenho negativo em 2010 nas três áreas de literacia avaliadas.
No mesmo relatório emerge a dificuldade cumprir o objective de em 2020 ter 40% da população entre os 30 e os 34 anos com curso superior pois em 2016 a percentagem era de 34.6%. Também o objective de reduzir o abandono escolar entre os 18 e os 24 parece comprometido apesar da evolução positiva, pretende-se 10% ou menos, mas em 2016 Portugal ainda se verificava 14%.
O Relatório salienta ainda a persistência da forte associação entre a origem social e económica e o desempenho escolar na generalidade dos sistemas educativos embora com níveis diferentes de desigualdade.
Duas notas breves.
Uma primeira para registar a evolução positiva e antes que se desencadeie a habitual luta pela paternidade dos resultados positivos com diferentes figuras e entidades a “chegarem-se à frente” como diz o povo importa realçar o trabalho de alunos, professores, escolas e famílias.
A segunda nota para relembrar o pesado caderno de encargos que ainda continuamos a ter pela frente, designadamente, combater o abandono e a exclusão, quase sempre a primeira etapa da exclusão social, promover a qualificação, um bem de primeira necessidade e combater as desigualdades criando efectivos dispositivos de mobilidade social em que a escola faz a diferença e pode ajudar a contrariar o destino.