O Público divulga um trabalho
realizado pela Imaginarium sobre a “A felicidade e a infância”. Foram
inquiridos 1131 pais e filhos entre os 0 e os 8 anos sobre diversas questões.
Umas notas sobre alguns dos dados
encontrados que mereciam várias reflexões.
A generalidade dos pais percebe
os filhos como felizes e nos miúdos a percepção de felicidade baixa com a
idade embora se mantelha elevada.
Um outro dado interessante remete
para algo que muitas vezes abordo aqui e em trabalho com a pais, estes
valorizam enormemente (99.8%) o tempo de qualidade partilhado com os filhos como
base para o bem-estar. No entanto mais de metade afirma que passa pouco tempo
de qualidade com os filhos e seis em cada dez entendem que os filhos sentem a
sua falta. Também a maioria, 89.9% tem dificuldade em conciliar vida familiar
com vida profissional.
Um técnico citado pelo Público
levanta a questão da pressão sobre as crianças a partir da entrada na
escolaridade obrigatória como factor associado ao decréscimo da percepção de
felicidade por parte destas.
De facto, em múltiplas conversas com
pais tem emergido com progressiva regularidade discursos que sugerem a
instalação nem sempre muito consciente de uma enorme pressão sobre os miúdos
para a excelência do seu desempenho e em múltiplos aspectos.
Na verdade, fruto dos estilos de
vida, de alterações nos valores e cultura e das dificuldades genéricas que
enfrentamos, tem vindo a instalar-se de mansinho em muitos pais, e também
dentro das instituições educativas, uma atitude e um discurso de exigência e de
pressão para a excelência no desempenho dos miúdos, a começar pelos resultados
escolares.
A questão não tem, evidentemente,
a ver com a natural atitude de exigência mas um sim com a pressão muito forte
para a produção e alto nível de rendimento e cada vez mais cedo pois, supõe-se,
ganharão vantagens.
Esta visão emergindo cedo pode
fazer comprometer desde logo o cumprimento dos objectivos e função da educação
de infância que não deve ser vista como a “preparação para a escola” e, muito
menos, como “o primeiro tempo de escola” o que desvaloriza a sua verdadeira
função e contém riscos para o desenvolvimento das crianças e, sim, também para
o seu sucesso educativo e escolar.
Por outro lado, o clima instalado
relativamente à pressão para resultados e para excelência e à forma como o
sistema educativo tem sobrevalorizado a medida contribui para alimentar de um ambiente
educativo competitivo e selectivo que cria em muitas crianças uma pressão
fortíssima para a excelência dos resultados. Não é raro, antes pelo contrário e
de acordo com as disponibilidades das famílias que a seguir à escola muitas
crianças caminhem para os centros de explicações que acabam por funcionar como
AAE, Ateliers de Actividades Escolares respondendo como 2 em 1, tomam contas
das crianças e melhoram, espera-se, o seu rendimento escolar.
Acresce que esta excelência que é
exigida é extensiva a todas as áreas em que os miúdos se envolvem, devem ser
excelentes a tudo.
Deste entendimento, para além do
tempo infindo que os miúdos passam na escola, surge uma ainda uma oferta com
uma diversidade espantosa que tornará as crianças fantásticas, excelentes, em
montanhas de coisas que lhes fazem uma falta tremenda para se prepararem para o
futuro, basta atentar na oferta disponível.
A vida de muitas crianças
transforma-se assim num espécie de agenda, passando o dia, incluindo
fins-de-semana, a saltar de actividade fantástica em actividade fantástica,
numa agitação sem fim.
Acontece que algumas crianças,
por questões de maturidade ou funcionamento pessoal, suportam de forma menos
positiva esta pressão o que poderá gerar o risco de disfuncionamento, rejeição
escolar e, finalmente, insucesso.
Também sei que em muitas destas
actividades estará presente uma genuína preocupação dos seus responsáveis pela
qualidade e adequação do trabalho que realizam com os miúdos. A questão é que
esse trabalho é apenas um dos mil trabalhos com que se vai enchendo a vida dos
miúdos.
A melhor forma de preparar os miúdos
para o futuro é cuidar bem deles no presente, desejavelmente sem faltas, mas também
sem excessos.
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