Serei só eu a ficar cansado da movimentação
e campanha em torno dessa bem portuguesa tradição do “Black Friday”?
Não pretendo entrar em discursos
demagógicos ou moralistas mas assusta este exacerbar do consumo que alimenta
muitas vezes o luxo do desperdício. E ainda falta o Natal que já não vem longe.
Certamente por deformação
profissional sou levado a olhar para estas questões considerando também o seu impacto nos mais novos.
Como tem sido referido e estudado
os mercados recorrem cada vez mais às crianças como estratégia para promover o
consumo ... dos pais que mais dificilmente resistem às compras quando a ressão
também vem dos filhos.
Não é um problema novo, todos os
que lidamos com os mais novos sabemos de que se trata. Recordo que em 2015 a
Direcção-Geral do Consumidor referia receber queixas sobre a utilização de
crianças em publicidade mesmo em produtos que lhes não são destinados. Embora
os pais não estejam suficientemente atentos a estratégia é apetecível aos
especialistas em marketing e publicidade.
Na verdade, alguns estudos nesta
matéria, sugerem, surpreendentemente, que as crianças até aos 7 anos podem
influenciar até 70% das decisões de compra da família, mesmo quando se trata de
produtos que não lhes são directamente dirigidos. Esta influência mantém-se ao
longo da infância e juventude.
Esta questão, a publicidade que
tem por actores e suporte os miúdos e forma como nós adultos lidamos com isso,
é complexa, envolvendo aspectos legais, considerando leis e direitos,
educativos, culturais, sociais, etc. pelo que não é fácil a sua abordagem e
gestão.
Será ingénuo pensar que quem
produz bens destinados aos miúdos ou que cuja aquisição possa ser pressionada
pelos miúdos, não tenha a tentação de que a mensagem publicitária seja o mais
eficaz possível, ou seja, venda, não importa o quê, desde um alimento
hipercalórico à última versão do videojogo, a qualquer dispositivo electrónico
ou as férias dos pais em locais atractivos para os miúdos.
Apesar das dificuldades que
atravessamos, estamos num tempo de “és o que tens e se não tens … não és”, o
que afectando os adultos, veja-se as situações de crédito malparado familiar
por compras compulsivas e sem base económica sustentada, não pode deixar de influenciar
os mais novos.
No entanto, acredito que podemos
fazer alguma coisa junto dos pais e dos miúdos para tentar atenuar os efeitos
deste cenário. As escolas poderiam ter um trabalho interessante debatendo com
os miúdos, de todas as idades e de forma adequada, o papel da publicidade nas
escolhas e nos gostos deles promovendo uma atitude mais consciente e crítica
destes processos. Poderia também ser interessante conversar com os pais sobre o
papel dos “presentes” e das “compras” nas dinâmicas e relações familiares, isto
é, mais prendas e mais compras não é necessariamente melhor ou ainda sobre o
papel da publicidade e a forma de lidar com a pressão desencadeada pelos filhos
depois de verem “os ecrãs” ou as mensagens publicitárias.
Na verdade, apesar da sua
complexidade é uma matéria a que por muitas razões vale a pena dedicar atenção.
O Natal está quase aí.
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