Anda por aí uma campanha
publicitária a uma instituição bancária que é pública mas um dia destes oferecem-na
por uma mão cheia de nada a um grupo privado, que diz que um rapaz, o João, "nunca
pedirá um crédito para apagar as rugas porque cada ruga tem uma
história".
Não conheço o João mas ele tem
razão, as rugas contam a história e a história não se apaga por maior que seja
a tentação de fazer umas plásticas mais ou menos bem conseguidas com a ilusão
de apagar a história, das pessoas, das instituições, dos países, do mundo.
Esta referência acordou uma
memória que poisa num sítio especial relacionada com o Velho Bata, um homem de
quem já vos falei e que foi meu anjo da guarda numa estadia profissional de
umas semanas em Inhambane, Moçambique, a terra da boa gente, entre a qual se
contava o Velho Bata.
Numa das muitas conversas ao fim
da tarde e porque fizemos umas falas sobre a idade, o Velho Bata, já muito
carregado de estrada e história, comentava a sua longa narrativa traduzida na
quantidade rugas que lhe desalisavam a testa. Dizia ele de forma muito
tranquila que cada uma daquelas rugas era como uma bíblia, valia setenta mil
quilos de ouro. Achava muito engraçada esta referência frequente do Velho a
setenta mil quilos de ouro que, fui percebendo, significavam, por motivos que
nunca conheci, a sua unidade de excelência, ou seja, qualquer coisa muito boa
era comparada a setenta mil quilos de ouro.
Pois o Velho Bata também nunca
contrairia um crédito para apagar as rugas, as bíblias da sua vida, o que eu
muito agradeço, pois tê-lo conhecido e passado aquele tempo em Inhambane a
ouvir as rugas do Velho Bata, deixaram-me uma das minhas rugas, uma das minhas
bíblias.
Também é necessário não esquecer
que existem rugas que doem, ardem, mas também essas são bíblias que não se
podem apagar, sossegam, muito ou pouco, mas estão lá e de vez em quando
vêem-se, sentem-se.
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