O MEC determinou que a Universidade Lusófona procedesse
à reapreciação dos casos de creditação de competências profissionais que
levaram à atribuição de graus académicos e retirar as devidas consequências
incluindo, se for o caso, a "nulidade dos graus académicos
atribuídos". Confesso que a minha expectativa sobre os efeitos desta
decisão é nula, destina-se apenas a permitir que tudo fique por assim mesmo,
como se costuma dizer, designadamente no escandaloso caso de Miguel Relvas
cujos contornos são públicos.
Também e conforme já tinha sido anunciado, o MEC
irá proceder à uma revisão dos conteúdos da Declaração de Bolonha no que
respeita à condições de creditação de competências profissionais. Por me
parecer oportuno, retomo umas notas antigas sobre esta matéria.
Em primeiro lugar, devo dizer que estou ligado
profissionalmente a uma instituição de ensino superior privado, creio que a
mais antiga do país, com 50 anos, o que de alguma forma me envolve nesta
questão, mas, por outro lado, me permite falar com algum conhecimento.
Como já o tenho referido, o aumento exponencial
da procura do ensino superior durante os anos 70 e 80 não encontrou resposta na
rede existente fundamentalmente pública. Nesse contexto emergiu rapidamente uma
enorme quantidade de estabelecimentos de ensino superior privado e,
naturalmente, também no ensino público com novas universidades e a explosão do
ensino politécnico.
Este aumento foi completamente desregulado, por
responsabilidade da tutela com a justificação da autonomia universitária, o que
gerou uma rede sobredimensionada, enviesada na oferta, com corpos docentes em
muitos casos manifestamente pouco qualificados e, portanto, com compromissos
severos de qualidade.
Por outro lado, a decisão política, de base
económica, que justificou o processo de Bolonha, introduziu uma outra variável
neste universo, as licenciaturas de curta duração, o 1º ciclo, que em algumas
áreas passaram a ser a formação de base substituta da anterior formação de 5
anos. O Processo de Bolonha abriu ainda portas ao reconhecimento académico de
competências profissionais o expediente de que Relvas e a Universidade Lusófona
se serviram e daí a sua reclamação de “legalidade” já reconhecida pela
Procuradoria-geral embora, obviamente, essa nunca tenha sido a questão central.
Um cenário desta natureza num contexto
praticamente desregulado, apesar de algumas inspecções inconsequentes, como a
imprensa referiu, conhecendo-se a falta de arquitectura ética de boa parte das
nossas lideranças bem como a importância social atribuída ao "canudo de
DR." e menos ao conhecimento, a promiscuidade de interesses e dos lóbis
(aliás, uma das 4 cadeiras feitas por Miguel Relvas) motivou muitos casos de
trânsito entre universidades privadas, e não só, e a classe política, sendo
muito frequente que uma figura qualquer com currículo partidário ou a ocupação
de um cargo político passe em seguida a “Professor universitário” sem currículo
nem competência que o justifique, mas de cuja ligação se espera que todos
ganhem, seja lá o que for.
É neste caldo que se geram as situações como a do
Ministro Miguel Relvas e de mais algumas situações menos mediatizadas mas
conhecidas.
Lamentei e lamento todo este episódio, que mina a
credibilidade do ensino superior privado e faz duvidar de um princípio que por
si é importante, o reconhecimento pela academia de que existem saberes e
competências que podem ser adquiridas fora da universidade, mas trabalhando
mesmo e fazendo prova desses saberes e competências. Fico triste com esta
situação mas não surpreendido e por isso entendo a decisão da sua revisão por
parte do MEC. Não deveria ser necessário mas é como se passa com os miúdos,
quando eles não sabem tomar conta deles, alguém tem que o fazer.
É evidente que a figura menor de Miguel Relvas,
se lhe restasse uma ponta, mesmo que residual, de sentido ético e dignidade, já
teria pedido há muito a demissão.
Mas esta coisa de sentido ético e dignidade nem sempre
se aprende na universidade, muito menos em meteóricas licenciaturas de um ano.
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