A espuma dos dias e a situação
que atravessamos enviesam o olhar que deitamos sobre o que nos rodeia.
Serve esta introdução para uma
pequena nota sobre o alarido levantado pela substituição dos carros ao serviço
do grupo parlamentar do PS. Os carros adquiridos, independentemente da forma de
aquisição, têm um valor que em termos reais e no âmbito da despesa pública é,
desculpem o atrevimento, irrelevante. Para utilizar uma expressão utilizada por
Passos Coelho sobre um outro tema, este é um não assunto.
O que me leva a estas notas, elas
também irrelevantes, tem a ver com os discursos produzidos sobre a questão.
Alguns atacam a situação como
exemplo de despesismo e mordomias inaceitáveis a que "eles", "os
gajos" "que não fazem nada" mantêm, enquanto "nós" somos
vítimas de toda a espécie de aperto e cortes.
Outros, por exemplo o líder
parlamentar do PS, recordam que a democracia tem custos nos quais se inscreve,
por exemplo, a aquisição dos carros que Carlos Zorrinho considera uma
ferramenta indispensável ao trabalho dos deputados.
Qualquer deste tipo de discursos,
de sinal contrário, assentam, do meu ponto de vista, numa espécie de demagogia
e populismo que não servem a já degradada saúde da nossa democracia, sobretudo
a sua saúde ética.
Por um lado, como é óbvio, a
democracia tem custos, ainda há poucos dias o afirmei a propósito da discussão
sobre a redução de deputados. No entanto, os custos da democracia, que devemos
suportar, não têm que incluir a actualização da frota automóvel dos grupos
parlamentares quando atravessamos um tempo de enormes dificuldades e restrições
que solicitam prudência e parcimónia nos gastos sendo, no mínimo, desajustada,
a gama de veículos escolhida. Vale a pena referir também que democracias bem
mais "ricas" que a nossa não colocam ao dispor dos seus deputados uma
frota automóvel com as característica divulgadas e não consta que a qualidade
dessas democracias se degrade por esse motivo.
Por outro lado, os discursos
inflamados sobre as mordomias, ainda que se perceba, é, nas mais das vezes, produzido
por muitos de nós que procuramos diariamente um "esquema" ou
"jeitinho" que nos dê um qualquer benefício, enquanto bramimos contra
o que os "gajos" fazem. É uma questão de cultura, de escala e de
oportunidade.
Talvez estas notas, sejam, como
disse, irrelevantes, mas este não assunto mostra o frágil estado de saúde da
nossa democracia.
Sem comentários:
Enviar um comentário