O Público de hoje dedica um espaço significativo
a uma iniciativa que tem vindo a espalhar-se pelo país, a criação de bancos de
troca de manuais escolares. Este movimento iniciado por Henrique Cunha com o objectivo de reutilizar
os manuais escolares tem vindo a ser replicado em dezena de locais envolvendo
autarquias, associações de pais, escolas, etc. e procura naturalmente
contribuir para atenuar os gastos enormes que muitas família têm no início de
cada ano com esta importante parte do "material escolar".
Já tenho abordado por diversas vezes a questão
dos manuais escolares que considero bastane relevante. Em primeiro lugar relembro
que Constituição da República estabelece
no Artigo 74º que “Compete ao Estado assegurar o Ensino Básico universal,
obrigatório e gratuito”.
Segundo a Associação Portuguesa de Editores e
Livreiros os manuais obrigatórios representam um encargo superior a 80 milhões
de euros para as famílias de 1,4 milhões de alunos. São conhecidos os
ajustamentos nas regras e destinatários dos apoios sociais escolares, temos
cerca de dois milhões de portugueses em risco de pobreza e um terço das
famílias a viver mesmo encostadas a esse limiar. Acresce ainda que, ao custo
com os manuais se deve adicionar o encargo com material escolar e livros de
apoio sempre “sugeridos” pelas escolas e que determinam, de acordo com o INE,
que as famílias portuguesas gastem mais que a média europeia em educação.
A questão dos manuais escolares é complexa e
muito importante, é um nicho de mercado no valor de muitos milhões como
referimos e depois da proliferação de manuais parece ter-se entrado numa fase
de alguma estabilidade e, sobretudo, da necessária qualidade, ainda que
insuficientemente regulada.
No entanto, do meu ponto de vista, importa questionar
não só o papel dos manuais mas, fundamentalmente, da quantidade enorme de
outros materiais que os acompanham e que contribuem de forma muito
significativa para o aumento da factura dos custos familiares com a educação
potenciando injustiça e desigualdade de oportunidades. De facto, para além de
imenso material de outra natureza, temos em cada área programática ou
disciplina uma enorme gama de cadernos de fichas, cadernos de exercícios,
cadernos de actividades, materiais de exploração, etc. etc. que submergem os
alunos e oneram as bolsas familiares, até porque muitos destes materiais não
são incluídos nos apoios sociais escolares. Em muitas salas de aula verifica-se
a tentação de substituir a “ensinagem”, o acto de ensinar, pela
“manualização”ou “cadernização” do trabalho dos alunos, ou seja, a acção do
professor é, sobretudo, orientar o preenchimento dos diferentes dispositivos
que os alunos carregam nas mochilas.
Esta questão, que não me parece suficientemente
reflectida nas suas implicações acaba por baixar a qualidade das aprendizagens
e apesar de se promover algum controlo da qualidade dos manuais, o mesmo não se
verifica com os chamados materiais de apoio o que envolve custos pesados de
natureza diversa.
Neste quadro, e apesar das reservas, naturais,
dos editores, contribuir para a acessibilidade dos manuais num contexto de
enormes dificuldades para muitas famílias parece-me algo de positivo como
também me pareceu muito positiva a ideia, divulgada em Maio, de uma equipa da
Universidade de Coimbra que vai lançar um manual de Matemática para o 12º ano
gratuito, algo de que os editores não irão certamente gostar. Ao que foi dito
na altura, no site deste projecto poderão ainda encontrar-se tarefas de apoio à
aprendizagem. Ainda assim, este manual pode ser carregado em PDF com um custo
equivalente a metade do preço máximo estabelecido para os manuais.
Apesar deste tipo de iniciativas, continuo a
pensar que seria de considerar a possibilidade dos manuais escolares serem
disponibilizados pelas escolas e devolvidos pelos alunos no final do ano
lectivo ou da sua utilização, ficando as famílias com "folga" para
aquisição de outros materiais, livros por exemplo. Não esqueço, no entanto, o
peso económico deste mercado.
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