Depois da inconstitucionalidade da retirada dos
subsídios decidida pelo Tribunal Constitucional, pareceu abrir-se a porta para,
com base no princípio de equidade defendido pelo TC, se estender ao universo
privado a retirada dos subsídios, tal como o Primeiro-ministro numa primeira
reacção deu a perceber. Várias vozes se levantam contra, também oriundas do
universo político da maioria, e eis que surge o argumento dos argumentos, "diminuir mais a despesa pública implica
cortes na saúde e educação" pelo que só mesmo aumentando a receita. Esta
argumentação não é nova. A falta de coragem para intervir a sério e profundamente
na despesa pública, sustenta a chantagem com os cortes na educação e na saúde
públicas, áreas essenciais, para além da justiça, na vida diária dos cidadãos.
Como muitas vozes têm vindo a afirmar, do sector
social, da igreja e do espectro político da maioria, e a maioria das pessoas a
sentir, não é possível carregar mais em impostos ou em cortes cegos que não
mexem em muita da chamada "gordura" do estado que continua intocável.
O peso dos lóbis é determinante e os interesses poderosos.
Na verdade muitas pessoas estão atingir o limite
da capacidade para assegurarem padrões mínimos de qualidade de vida.
Parece de relembrar que um estudo de há meses
divulgado pela Comissão Europeia que analisou a distribuição dos efeitos dos
programas de austeridade os países que experimentam maiores dificuldades,
Portugal, Grécia, Espanha, Irlanda, Estónia e Reino Unido, conclui que Portugal
"é o único país com uma distribuição claramente regressiva",
traduzindo, os pobres estão a pagar mais do que os ricos quando se aplica a
austeridade. Pode ainda ler-se que nos escalões mais pobres, o orçamento de uma
família com crianças sofreu um corte de 9%, ao passo que uma família rica nas
mesmas condições perdeu 3% do rendimento disponível.
Portugal é ainda de acordo com o estudo o único
país analisado em que "a percentagem do corte (devido às medidas de
austeridade) é maior nos dois escalões mais pobres da sociedade do que nos
restantes". A Grécia, que tem tido repetidos pacotes de austeridade,
apresenta uma maior equidade nos sacrifícios implementados.
Este dado parece-me extremamente relevante nesta
discussão sobre a eventual necessidade de mais "austeridade" e
mostra, de acordo com a percepção comum, que não existe equidade na repartição
dos sacrifícios.
Para além de contrariar o discurso oficial de que
existe justiça social nas medidas de austeridade, o que é verdadeiramente
insustentável é de que as políticas assumidas, por escolha de quem decide,
estão a aumentar as assimetrias sociais, a produzir mais exclusão e pobreza.
Mais preocupante a insensibilidade da persistência neste caminho.
Ameaçar com mais cortes na educação e saúde
públicas é caminhar à beira do abismo, mesmo que Passos Coelho insista que o
abismo está mais longe.
O abismo está mais perto, não está mais longe,
como Passos Coelho sustenta. A realidade não é a projecção dos seus desejos,
dramaticamente.
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