domingo, 8 de julho de 2012

À BEIRA DO ABISMO

Depois da inconstitucionalidade da retirada dos subsídios decidida pelo Tribunal Constitucional, pareceu abrir-se a porta para, com base no princípio de equidade defendido pelo TC, se estender ao universo privado a retirada dos subsídios, tal como o Primeiro-ministro numa primeira reacção deu a perceber. Várias vozes se levantam contra, também oriundas do universo político da maioria, e eis que surge o argumento dos argumentos,  "diminuir mais a despesa pública implica cortes na saúde e educação" pelo que só mesmo aumentando a receita. Esta argumentação não é nova. A falta de coragem para intervir a sério e profundamente na despesa pública, sustenta a chantagem com os cortes na educação e na saúde públicas, áreas essenciais, para além da justiça, na vida diária dos cidadãos.
Como muitas vozes têm vindo a afirmar, do sector social, da igreja e do espectro político da maioria, e a maioria das pessoas a sentir, não é possível carregar mais em impostos ou em cortes cegos que não mexem em muita da chamada "gordura" do estado que continua intocável. O peso dos lóbis é determinante e os interesses poderosos.
Na verdade muitas pessoas estão atingir o limite da capacidade para assegurarem padrões mínimos de qualidade de vida.
Parece de relembrar que um estudo de há meses divulgado pela Comissão Europeia que analisou a distribuição dos efeitos dos programas de austeridade os países que experimentam maiores dificuldades, Portugal, Grécia, Espanha, Irlanda, Estónia e Reino Unido, conclui que Portugal "é o único país com uma distribuição claramente regressiva", traduzindo, os pobres estão a pagar mais do que os ricos quando se aplica a austeridade. Pode ainda ler-se que nos escalões mais pobres, o orçamento de uma família com crianças sofreu um corte de 9%, ao passo que uma família rica nas mesmas condições perdeu 3% do rendimento disponível.
Portugal é ainda de acordo com o estudo o único país analisado em que "a percentagem do corte (devido às medidas de austeridade) é maior nos dois escalões mais pobres da sociedade do que nos restantes". A Grécia, que tem tido repetidos pacotes de austeridade, apresenta uma maior equidade nos sacrifícios implementados.
Este dado parece-me extremamente relevante nesta discussão sobre a eventual necessidade de mais "austeridade" e mostra, de acordo com a percepção comum, que não existe equidade na repartição dos sacrifícios.
Para além de contrariar o discurso oficial de que existe justiça social nas medidas de austeridade, o que é verdadeiramente insustentável é de que as políticas assumidas, por escolha de quem decide, estão a aumentar as assimetrias sociais, a produzir mais exclusão e pobreza. Mais preocupante a insensibilidade da persistência neste caminho.
Ameaçar com mais cortes na educação e saúde públicas é caminhar à beira do abismo, mesmo que Passos Coelho insista que o abismo está mais longe.
O abismo está mais perto, não está mais longe, como Passos Coelho sustenta. A realidade não é a projecção dos seus desejos, dramaticamente.

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