quinta-feira, 12 de julho de 2012

ALGUNS DOS PROBLEMAS DOS PROFESSORES SÃO TAMBÉM OS NOSSOS PROBLEMAS

Os professores manifestam-se hoje contra alguns aspectos da PEC- Política Educativa em Curso. Do meu ponto de vista, alguns dos motivos que estão na base do protesto, para além das consequências na questão profissional dos docentes, são preocupantes numa perspectiva mais alargada da qualidade da educação e de defesa da escola pública de qualidade. Algumas notas sobre a profissão docente, a sua importância e a forma como muitas vezes são olhados.
Um estudo desenvolvido pelo ISEG-UTL conclui que as variáveis exteriores à escola, (nível de escolaridade dos pais, por exemplo) explicam apenas 30% do sucesso dos alunos no ensino secundário, ou seja, 70% é explicada pelo trabalho das escolas, dos professores. Numa conferência realizada em Lisboa, o Professor Erik Hanushek sublinhou o factor "qualidade do trabalho do professor" como a chave do sucesso na educação, mesmo no sentido de contrariar desigualdades sociais de origem nos alunos. Cito com frequência uma afirmação de 2000 do Council for Exceptional Children, "o factor individual mais contributivo para a qualidade da educação é a existência de um professor qualificado e empenhado".
Neste quadro, parece-me sempre importante sublinhar algo que de tão óbvio por vezes se esquece, a importância essencial e a responsabilidade que o trabalho dos professores assume na construção do futuro. Tudo passa pela escola e pela educação. Assim sendo, as mudanças na educação só podem ocorrer e ser bem sucedidas com o envolvimento dos professores.
Alguns dos discursos que de forma ligeira e muitas vezes ignorante ocupam tempo de antena na imprensa parecem esquecer a importância deste trabalho e das circunstâncias em que se desenvolve.
Pensemos no que é ser professor hoje, em algumas escolas que décadas de incompetência na gestão urbanística e consequente guetização social produziram.
Pensemos em como os valores, padrões e estilos e vida das famílias se alteraram fazendo derivar para a escola, para os professores, parte do papel que compete à família.
Pensemos na forma como milhares de professores cumprem a sua carreira de poiso, em poiso, sem poiso e sem condições de pensar num projecto de vida familiar com estabilidade. E não nos esqueçamos também da imprescindível necessidade de que o seu trabalho seja avaliado através de dispositivos sólidos, eficazes e justos de forma a proteger a própria classe, os miúdos e as famílias.
Pensemos nos professores que nos ajudaram a chegar ao que hoje cada um de nós é, aqueles que carregamos bem guardadinhos na memória, pelas coisas boas, mas também pelas más, tudo contribuiu para sermos o que somos.
Pensemos na deriva política a que o universo da educação tem estado exposto nas últimas décadas, criando instabilidade e ruído permanente sem que se perceba um rumo, um desígnio que potencie o trabalho de alunos, pais e professores. Assume especial actualidade, o aumento de alunos por turma, o corte de recursos, a dispensa de professores obviamente necessários, etc.
Pensemos em como os professores são injustiçados na apreciações de muita gente que no minuto a seguir à afirmação de uma qualquer ignorante barbaridade, vai, numa espécie de exercício sadomasoquista, entregar os filhos nas mãos daqueles que destrata, depreendendo-se assim que, ou quer mal aos filhos ou desconhece os professores e os seus problemas.
Pensemos como é imprescindível que a educação e os problemas dos professores não sejam objecto de luta política baixa e desrespeitadora dos interesses dos miúdos, mesmo por parte dos que se assumem como seus representantes.
Pensemos em como a forma como os miúdos, pequenos e maiores, vêem e se relacionam com os professores está directamente ligada à forma como os adultos os vêem e os discursos que fazem.
Pensemos, finalmente, como ser professor deve ser uma das funções mais bonitas do mundo, ver e ajudar os miúdos a ser gente.
Esperemos, pois, pelas mudanças necessárias que defendam a qualidade da escola e as condições para que o trabalho de professores, alunos e pais tenha o melhor resultado possível.

2 comentários:

João Soares disse...

Olá
Custa ver esta EXCELENTE reflexão sem pelo menos dizer: parabéns.
Não queria que isto (horário zero) estivesse a acontecer e eu esteja nesta situação....Merecíamos e bem estarmos na mesma escola durante 4 anos (ou por 4 anos, digamos). Afinal, a estabilidade docente é ou não é benéfico para todos?
Entre os professores portugueses perdeu-se a "união"...infelizmente ao fim de 20 anos de serviço e alguns anos de facebook, vou remeter-me ao silêncio e deixar de sofrer pela "classe"...bom fim de semana e até breve.
Um abraço solidário.

Zé Morgado disse...

Olá João, de mansinho, o desencanto e a desesperança vão-se instalando mas, vai desculpar-me, para os professores é proibido. Por uma razão pequena e interesseira, preciso dos professores para os meus netos quando chegarem. trata-se do futuro nao podemos desistir