Um estudo realizado pela
Universidade do Porto vem confirmar que os estudantes do ensino secundário
oriundos do sub-sistema privado, para igual padrão de resultados nas provas
nacionais, tendem a apresentar classificações internas mais elevadas.
Tal facto acaba por beneficiar
este grupo de alunos sobretudo no acesso ao ensino superior em cursos com exigência
de média de entrada mais alta. A situação não traz nada de novo, creio que quem
conhece razoavelmente o sistema educativo português conhece circunstâncias em
que a frequência de alguns estabelecimentos de ensino privado é
"premiada" com classificações internas mais "generosas",
por assim dizer.
O mesmo estudo levanta também
sérias reserva ao modo habitual de construção dos rankings assente nas classificações,
esquecendo variáveis tão importantes como o percurso escolar dos alunos ou
variáveis sócio-demográficas. Como muitas vezes aqui tenho referido a forma
como nos colocamos perante a questão estruturante, "medimos o que valorizamos
ou valorizamos o que medimos" contamina tudo que se possa fazer em termos de medida e
classificação em política educativa.
É evidente que não existe a forma
perfeita de entender os dados e a sua interpretação, tal como refere na peça do
Público sobre esta questão o director executivo da Associação de
Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo que, expressando algumas
reservas, sugere estudos com outros modelos ou a consideração de diferentes
variáveis.
Nesta matéria é ainda relevante
um estudo também citado e realizado igualmente pela Universidade do Porto
mostrando que as diferenças que se encontram no acesso ao superior por parte de
alunos do ensino secundário privado se esbatem pois, nos 10% de alunos que
terminam a formação com notas mais altas, predominam os alunos oriundos do secundário
público o que é interessante e não surpreendente.
Entre nós é frequente, e do meu ponto de vista desajustado,
dicotomizar de forma excessiva a questão educativa entre privado vs público. Na
verdade, entendo a existência de um subsistema educativo de ensino privado como
absolutamente necessária para, por um lado permitir alguma liberdade de
escolha, ainda que condicionada, por parte das famílias e, por outro lado, como
forma de pressão sobre a qualidade do ensino público.
No entanto, mais uma vez, refiro algo que é bem
conhecido de todos os que de alguma forma lidam com o universo da educação.
Muitas instituições de ensino privado não receberão nunca alguns alunos
independentemente de os pais terem no fim de cada mês apoio económico estatal
para a sua frequência. Não é uma questão económica, é uma questão de defender a
instituição de situações de risco que lhe comprometam a imagem de excelência ou
a posição nos rankings, sejam os dos resultados escolares sejam os do
"capital social" que detêm.
A cultura mais generalizada na opinião pública
entende os estabelecimentos de ensino privado como exclusivos e alguns deles
são, na verdade, profundamente selectivos na população que acolhem. São
conhecidos, o recurso ao “pedigree”, às notas, aos testes de conhecimento e
até, a discutível utilização de testes de desenvolvimento pelos respectivos
serviços de psicologia. Por outro lado, conhecem-se também estabelecimentos de
ensino privado de onde, com baixíssima tolerância, alunos com algum insucesso e
ou problemas do comportamento são "convidados" a sair para que se não
comprometa a imagem e o estatuto da escola.
Por outro lado, é também conhecido que mesmo
entre escolas públicas se verificam cada vez mais práticas de selecção dos
alunos de forma mais ou menos discreta e que já foram referidas por alguma
imprensa mais atenta.
Reafirmando a necessidade de existência de um
subsistema privado, insisto de há muito, que a melhor forma de proteger a
liberdade de educação, é uma fortíssima cultura de qualidade, rigor e exigência
na escola pública e uma acção social escolar eficaz e oportuna.
2 comentários:
Caro professor,
tem sentido fazer entrevistas aos candidatos ao acesso ensino superior, no seio das Universidades Públicas e Privadas, com carácter de seriação?
Abraço
António Caroço
Caro António, não lhe sei dizer se "apenas" as entrevistas ou mesmo "se" as entrevistas seriam a melhor forma de organizar o acesso ao superior. Tenho, no entanto, a convicção de que as notas finais do secundário são para certificar a conclusão do secundário e poderiam ser apenas um dos critério de acesso ao superior, não O critério. Um abraço
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