Confirma-se que para o próximo ano lectivo os estudantes
até aos 23 anos vão perder a redução de 25% de que beneficiavam nos passes sociais. O
desconto passará a assentar nos rendimentos familiares. Esta medida já tinha
sido anunciada em Janeiro e em Fevereiro foi reduzido o desconto
nos passes de 50 para 25%.
Provavelmente em contracorrente, parece-me de
considerar o princípio de que os apoios sociais devem ser administrados em
função da necessidade e não em função da idade.
No entanto, atentando no que tem vindo a
acontecer as medidas de cortes acabam por se reflectir nos rendimentos
disponíveis de muitas famílias com consequências, entre muitos outros aspectos,
ao nível da educação e planeamento do número de filhos.
Segundo dados do INE, uma família com filhos
gasta em média cerca de 10 000 €, 31% acima da média de uma família sem
crianças. Na verdade os filhos estão caros, actualmente, particularmente caros.
Esta será, entre outras, uma das razões
contributivas para a baixa natalidade em Portugal, problema que tem vindo a
acentuar-se e que as políticas, desadequadas e dispersas, não têm conseguido
reverter. O ano de 2011 foi o ano com menos nascimentos. A renovação de
gerações exige 2,1 filhos por mulher sendo que desde 1982 que em Portugal não
se atinge tal valor. Temos 1,37 como índice sintético de fecundidade o segundo
mais baixo do mundo, atrás da Bósnia.
É ainda de registar que em 2010, um pouco mais de
10% dos nascimentos são crianças de mães estrangeiras, quando curiosamente
temos discursos de governantes que nos aconselham, sobretudo aos mais novos, a
emigrar e assim, lá longe, construir um projecto de vida.
Estes indicadores comprometem, obviamente, a renovação
geracional, potenciando o envelhecimento populacional e o desequilíbrio
demográfico. Contrariamente ao que se verifica noutros países que têm as
respectivas taxas a subir, em Portugal o declínio a partir de 2003 tem sido
constante.
Os salários baixos são uma das razões que
“obrigam” a que as famílias revejam em baixa, como agora se diz, os projectos
relativos a filhos. Por outro lado, Portugal tem um dos mais elevados custos de
equipamentos e serviços para crianças o que, naturalmente, é mais um obstáculo
para projectos de vida que envolvam filhos.
Não pode ainda esquecer-se a discriminação
salarial de que muitas mulheres, sobretudo em áreas de menor qualificação, são
ainda alvo e a forma como a legislação laboral e a sua “flexibilização” as
deixam mais desprotegidas. São conhecidas muitas histórias sobre casos de
entrevistas de selecção em que se inquirirem as mulheres sobre a intenção de
ter filhos, sobre casos de implicações laborais negativas por gravidez e
maternidade, sobre situações em que as mulheres são pressionadas para não usarem
a licença de maternidade até ao limite, etc.
Toda esta situação torna urgente a definição de
políticas de apoio à família com impactos a curto e médio prazo como, por
exemplo, a acessibilidade aos equipamentos e serviços para a infância com o
alargamento da resposta pública de creche e educação pré-escolar, cuja oferta
está abaixo da meta estabelecida. Combater a discriminação salarial e de
condições de trabalho através de qualificação e fiscalização adequadas. Aliás,
é ainda curioso sublinhar o impacto que nesta questão pode ter a política do
governo de aumentar o tempo de trabalho o que, naturalmente, retira tempo à
família.
Só com uma abordagem global e multi-direccionada
me parece possível promover a recuperação demográfica indispensável.
Medidas desta natureza podem, apesar de se
argumentar que os mais carenciados poderão continuar a beneficiar de descontos
nos passes, levar a que muitas famílias vejam ainda mai dificultada a tarefa de
cuidar dos filhos.
Assim estamos a descuidar do futuro.
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