A Comissão de Acompanhamento e Fiscalização dos
Centros Educativos, em Relatório enviado à Assembleia da República, propõe que
em Portugal a maioridade penal, idade em que um indivíduo pode ser condenado a
prisão comum, passe dos 16 anos para a idade da maioridade civil, os 18 anos,
tal como acontece, aliás na maioria dos países da Europa.
Do meu ponto de vista e sabendo que esta matéria
não é consensual, que se presta a discursos demagógicos e populistas e,
sobretudo, que é informada por narrativas sobre a insegurança e delinquência
percebida, alimentadora de teses securitárias, parece-me que se justifica a discussão
e torno da proposta da Comissão. Aliás, a própria Comissão considera que a
proposta merece essa discussão devido à divergência de entendimentos sobre este
universo.
Para além da justificação e dados que sustentam a
proposta e que merecem análise, algumas notas sobre esta questão e alguns aspectos próximos.
Em Portugal existem altíssimos níveis de prisão, é
conhecida a situação de sobrelotação nos estabelecimentos prisionais. São
também constantes e públicos os apelos ao aumento de penas e da prisão de mais gente,
provavelmente, devido a uma devastadora percepção de impunidade e insegurança
que tem vindo a instalar-se na sociedade portuguesa. É ainda frequente reclamar
o abaixamento da idade susceptível de prisão que actualmente se situa dos 14
aos 16 anos, internamento fechado em Centro Educativo e a prisão comum a partir
dos 16, como subscreve, por exemplo, o CDS-PP.
A questão central, do meu ponto de vista, é que,
sobretudo no caso de gente mais nova, a prisão não pode ser a única solução.
Segundo dados da Direcção-Geral de Reinserção,
cerca de 40% dos adolescentes internados voltam aos Centros Educativos ou às
prisões após os 16 anos. Os estudos sobre a reincidência em diferentes idades,
sugerem que as medidas de restrição de liberdade quando não acompanhadas por
outro tipo de intervenção não a minimizam significativamente. Também se
reconhece que frequentemente o universo prisional é uma escola e um factor de
risco de agravamento de comportamentos de delinquência.
Esta altíssima taxa de reincidência, mostra a
falência do Projecto Educativo obrigatoriamente definido para todos os
adolescentes internados. Este Projecto Educativo assenta em dois eixos
fundamentais, formação pessoal e formação escolar e profissional. É neste
âmbito que o trabalho tem que ser optimizado. É imprescindível que os meios
humanos e os recursos materiais sejam suficientes para que se minimize até ao
possível os riscos de reincidência. Ao que é conhecido, um dos jovens agora
detidos já tem antecedentes criminais. Mesmo entre a população mais jovem, com
mais de 16 anos e, portanto, a cumprir penas em estabelecimentos prisionais
para adultos, a taxa de reincidência é enorme e a prisão, sabe-se, funciona
frequentemente como escola para certificação e aquisição de competências.
Fica certamente mais caro lidar com a
delinquência provavelmente praticada por estes jovens reincidentes em adultos
do que investir na qualidade dos Centros Educativos para que sejam, de facto,
educativos. É neste contexto que, do meu ponto de vista se deve colocar a
análise da proposta agora elaborada, ou seja, é imprescindível um
redimensionamento da rede de Centros Educativos e um forte investimento nos
recursos técnicos de que dispõem, nos meios, espaços e equipamentos. Só assim
poderão cumprir a sua função, proporcionar a jovens em privação de liberdade a
construção de um Projecto de vida, com qualificação escolar e profissional,
formação pessoal e uma ideia de futuro que minimize o risco de reincidência.
Apesar de, repito, a punição e a detenção
constituírem um importante sinal de combate à sensação de impunidade instalada,
é minha forte convicção de que só punir e prender não basta. Esta proposta
merece uma reflexão serena, assente mais em estudos e valores que em impressões reactivas e emocionais.
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