quarta-feira, 20 de junho de 2012

O VELHO QUE FAZIA LETRAS

Era uma vez um Velho que cumpria a sua narrativa, andar pelo mundo sem destino. Um dia, os passos e o acaso levaram-no a uma terra pequena e estranha. O Velho olhou à volta e parecia que a realidade passou a estar a preto e branco, sentia-a muito triste.
As pessoas eram cinzentas, os dias eram cinzentos. Tanto as noites eram escuras como cinzentas e poucas eram as conversas das pessoas.
O Velho intrigado resolveu ficar mais algum tempo naquela terra escura. Sentava-se a ver passar o mundo, pegava na sua máquina de fazer letras e ia escrevendo palavras, que compunham frases que construíam ideias para olhar para o mundo e começar de novo, fazer letras, outras palavras, outras frases, outras ideias.
As pessoas cinzentas da terra escura estranhavam a tarefa do Velho e foram-se aproximando espreitadoras. Os miúdos, são sempre mais corajosos os miúdos, começaram fazer perguntas e o Velho explicou que fazia letras e o que fazia com as letras.
Claro que os miúdos também quiseram fazer letras, é sabido que os miúdos gostam de saber fazer letras. O Velho com calma, a calma dos velhos, foi ensinando e os miúdos aprenderam. Era uma festa, faziam letras, muitas letras, escreviam palavras, muitas palavras, compunham frases, muitas frases, construíam ideias, muitas ideias, o que de mansinho  foi entusiasmando os mais velhos da terra que, à boleia dos miúdos, como muitas vezes acontece, aprenderam também a fazer letras e a usá-las.
Estranhamente, aquela terra foi deixando de ser cinzenta, deixando de ser escura, aos poucos retomou as cores que as ideias, construídas com as frases que tinham palavras feitas de letras, criaram.
Na verdade, o Velho não ficou surpreendido, nas andanças pelo mundo ele tinha estado numa terra onde as pessoas cantavam, “É tão triste não saber ler como é triste não ter pão, quem não conhece uma letra, vive numa escuridão”.

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