No Expresso encontra-se uma peça relativa ao mundo da educação que merece reflexão, a distância que muitos alunos precisam de percorrer para chegar à escola.
Existem 30 concelhos em Portugal
continental sem ensino secundário científico-humanístico. No Alto Alentejo, por
exemplo, nove dos 15 municípios não têm ensino secundário geral. Em 75
municípios, um terço do país, os alunos fazem mais de 20 km por dia (ida e
volta) para a secundária sendo que em algumas situações a distância ultrapassa 50
km, casos de Barrancos, Aljezur, Alcoutim, Freixo de Espada à Cinta, Vimioso,
Monchique e Mourão.
No caso de Barrancos, os alunos
saem de casa antes das 7h, chegam já depois das 20h e passam três horas por dia
no autocarro para frequentar o ensino secundário em Moura. A frequência é obrigatória
até aos 18 anos, mas … não há escola no concelho. Também Aljezur é um dos
concelhos em que os alunos mais tempo e quilómetros têm de viagem para a
escola.
Este cenário de desigualdade acentua-se
por que os estudantes “de fora” perdem prioridade na escolha da área científica
em relação aos colegas que já são alunos da escola. Acresce a falta de opções
disponíveis o que potencia o risco de insucesso e de abandono escolar já elevado
pelas circunstâncias desfavoráveis.
Também no 1.º ciclo e decorrente
do encerramento de escolas se verifica que muitos alunos percorrem diariamente
distância significativas para acederem à escola.
Felizmente e sobretudo devido à
imigração verifica-se uma tendência para o aumento da população escolar que
esperemos consistente e continuada.
Na verdade, em muitas
comunidades, sobretudo no interior, naturalmente, a manutenção das escolas do
1.º ciclo em funcionamento são um suplemento de vida.
Também importa considerar que
alguns estudos realizados nos últimos anos sustentam que, de forma geral, os
alunos dessas escolas realizam processos bem-sucedidos de entrada no 2.º ciclo.
Retomo umas notas sobre esta
questão do encerramento de escolas que também está associado à criação de
mega-agrupamentos que, muitos deles, se transformam em mega-problemas, mas esta
é uma outra matéria. Muitas das questões que se colocam em educação, como
noutras áreas, independentemente da reflexão actual, solicitam algum
enquadramento que nos ajudem a melhor entender o quadro temos no momento.
Como já tenho escrito e abordado
em alguns encontros, durante décadas de Estado Novo, tivemos um país ruralizado
e subdesenvolvido o que, evidentemente não é nada de novo.
Em termos educativos e com a
escolaridade obrigatória a ideia terá sido “levar uma escola onde houvesse uma
criança”. Tal entendimento minimizava a mobilidade e a abertura de espírito,
algo a evitar naqueles tempos. No entanto, como é sabido, os movimentos
migratórios e emigratórios explodiram e o interior entrou em processo de
desertificação o que, em conjunto com a decisão de política educativa referida
acima, criou um universo de centenas de escolas, sobretudo no 1º ciclo, com
pouquíssimos alunos. Como se torna evidente e nem discutindo os custos de
funcionamento e manutenção de um sistema que admite escolas com 2, 3 ou 5
alunos, deve considerar-se a questão se tal sistema favorece a função e o papel
social e formativo da escola. Creio que não e a experiência e os estudos
revelam isso mesmo.
Parece, pois, ajustada a decisão
de em muitas comunidades proceder a uma reorganização da rede.
É também verdade que muitas vezes
se afirma que a “morte da escola é a morte da aldeia”. No entanto, creio que
será, pelo menos de considerar, que os modelos de desenvolvimento económico e
social promovem a litoralização e desertificação do interior. Apostas políticas
erradas não contrariam este processo, antes pelo contrário, promovem-no
fechando os equipamentos sociais e de serrvços, incluindo as escolas, uma das
formas evidentes de fixação das pessoas. Cria-se assim um ciclo sem fim, as
pessoas partem, fecham-se equipamentos, as pessoas não voltam ou continuam a
partir. E este processo de definhamento vai-se alastrando. Talvez a manutenção
das escolas em funcionamento ajude a fixar e atrair famílias como já parece ser
a situação em diferentes comunidades.
Torna-se fundamental e urgente a
coragem e a visão para outros caminhos.
Por outro lado, como referia
acima, a concentração excessiva de alunos em centros educativos ou
mega-agrupamentos não ocorre sem riscos, tornam-se mega-problemas. Para além de
aspectos como distância a percorrer, tipo de percurso e apoio logístico, importa
não esquecer que escolas demasiado grandes são mais permeáveis a insucesso
escolar e exclusão, absentismo, problemas de indisciplina e outros problemas de
natureza comportamental como bullying.
Neste cenário, a decisão de
encerrar escolas não deve ser vista exclusivamente do ponto de vista
administrativo e económico, não pode assentar em critérios generalizados
esquecendo particularidades contextuais e, sobretudo, não servir como tudo
parece servir em educação, para o jogo político.
Sabemos ainda que também políticas públicas de educação incompetentes nos levaram a uma situação
dramática de falta de professores sustentando a tempestade perfeita, nem
escolas próximas dos alunos, nem professores para nelas trabalharem.
Um nota final recordando que muitos
alunos vivem demasiado longe da escola que frequentam, mas também muitos alunos estão longe da
escola que frequentam mesmo vivendo muito perto.
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