terça-feira, 30 de dezembro de 2025

LONGE DA ESCOLA

 No Expresso encontra-se uma peça relativa ao mundo da educação que merece reflexão, a distância que muitos alunos precisam de percorrer para chegar à escola.

Existem 30 concelhos em Portugal continental sem ensino secundário científico-humanístico. No Alto Alentejo, por exemplo, nove dos 15 municípios não têm ensino secundário geral. Em 75 municípios, um terço do país, os alunos fazem mais de 20 km por dia (ida e volta) para a secundária sendo que em algumas situações a distância ultrapassa 50 km, casos de Barrancos, Aljezur, Alcoutim, Freixo de Espada à Cinta, Vimioso, Monchique e Mourão.

No caso de Barrancos, os alunos saem de casa antes das 7h, chegam já depois das 20h e passam três horas por dia no autocarro para frequentar o ensino secundário em Moura. A frequência é obrigatória até aos 18 anos, mas … não há escola no concelho. Também Aljezur é um dos concelhos em que os alunos mais tempo e quilómetros têm de viagem para a escola.

Este cenário de desigualdade acentua-se por que os estudantes “de fora” perdem prioridade na escolha da área científica em relação aos colegas que já são alunos da escola. Acresce a falta de opções disponíveis o que potencia o risco de insucesso e de abandono escolar já elevado pelas circunstâncias desfavoráveis.

Também no 1.º ciclo e decorrente do encerramento de escolas se verifica que muitos alunos percorrem diariamente distância significativas para acederem à escola.

Felizmente e sobretudo devido à imigração verifica-se uma tendência para o aumento da população escolar que esperemos consistente e continuada.

Na verdade, em muitas comunidades, sobretudo no interior, naturalmente, a manutenção das escolas do 1.º ciclo em funcionamento são um suplemento de vida.

Também importa considerar que alguns estudos realizados nos últimos anos sustentam que, de forma geral, os alunos dessas escolas realizam processos bem-sucedidos de entrada no 2.º ciclo.

Retomo umas notas sobre esta questão do encerramento de escolas que também está associado à criação de mega-agrupamentos que, muitos deles, se transformam em mega-problemas, mas esta é uma outra matéria. Muitas das questões que se colocam em educação, como noutras áreas, independentemente da reflexão actual, solicitam algum enquadramento que nos ajudem a melhor entender o quadro temos no momento.

Como já tenho escrito e abordado em alguns encontros, durante décadas de Estado Novo, tivemos um país ruralizado e subdesenvolvido o que, evidentemente não é nada de novo.

Em termos educativos e com a escolaridade obrigatória a ideia terá sido “levar uma escola onde houvesse uma criança”. Tal entendimento minimizava a mobilidade e a abertura de espírito, algo a evitar naqueles tempos. No entanto, como é sabido, os movimentos migratórios e emigratórios explodiram e o interior entrou em processo de desertificação o que, em conjunto com a decisão de política educativa referida acima, criou um universo de centenas de escolas, sobretudo no 1º ciclo, com pouquíssimos alunos. Como se torna evidente e nem discutindo os custos de funcionamento e manutenção de um sistema que admite escolas com 2, 3 ou 5 alunos, deve considerar-se a questão se tal sistema favorece a função e o papel social e formativo da escola. Creio que não e a experiência e os estudos revelam isso mesmo.

Parece, pois, ajustada a decisão de em muitas comunidades proceder a uma reorganização da rede.

É também verdade que muitas vezes se afirma que a “morte da escola é a morte da aldeia”. No entanto, creio que será, pelo menos de considerar, que os modelos de desenvolvimento económico e social promovem a litoralização e desertificação do interior. Apostas políticas erradas não contrariam este processo, antes pelo contrário, promovem-no fechando os equipamentos sociais e de serrvços, incluindo as escolas, uma das formas evidentes de fixação das pessoas. Cria-se assim um ciclo sem fim, as pessoas partem, fecham-se equipamentos, as pessoas não voltam ou continuam a partir. E este processo de definhamento vai-se alastrando. Talvez a manutenção das escolas em funcionamento ajude a fixar e atrair famílias como já parece ser a situação em diferentes comunidades.

Torna-se fundamental e urgente a coragem e a visão para outros caminhos.

Por outro lado, como referia acima, a concentração excessiva de alunos em centros educativos ou mega-agrupamentos não ocorre sem riscos, tornam-se mega-problemas. Para além de aspectos como distância a percorrer, tipo de percurso e apoio logístico, importa não esquecer que escolas demasiado grandes são mais permeáveis a insucesso escolar e exclusão, absentismo, problemas de indisciplina e outros problemas de natureza comportamental como bullying.

Neste cenário, a decisão de encerrar escolas não deve ser vista exclusivamente do ponto de vista administrativo e económico, não pode assentar em critérios generalizados esquecendo particularidades contextuais e, sobretudo, não servir como tudo parece servir em educação, para o jogo político.

Sabemos ainda que também políticas públicas de educação incompetentes nos levaram a uma situação dramática de falta de professores sustentando a tempestade perfeita, nem escolas próximas dos alunos, nem professores para nelas trabalharem.

Um nota final recordando que muitos alunos vivem demasiado longe da escola que frequentam,  mas também muitos alunos estão longe da escola que frequentam mesmo vivendo muito perto.

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