sexta-feira, 30 de junho de 2017

A HISTÓRIA DA CRIANÇA FECHADA

Um dia destes a professora Teresa, de Português, entrou na biblioteca para deixar os livros que tinha estado a trabalhar nas aulas e encontrou o Professor Velho, o que está na biblioteca e fala com os livros.
Olá Velho, tudo bem contigo e com os teus livros?
Tudo bem e tu Teresa, estás bem?
Sim, foi giro, os miúdos, de uma forma geral gostaram deste trabalho e motivaram-se com os livros, eles lêem muito pouco, é preciso insistir e tentar que leiam mais. Mas o Tiago não aderiu muito, não se envolveu e pouco colaborou. Não entendo porquê, ele é uma criança muito fechada.
O que é uma criança fechada?
Ora Velho, estás a brincar comigo? É uma criança que fala pouco, não se envolve com os colegas, nem connosco. Sempre muito no seu canto com um ar um pouco ausente e às vezes até parece triste.
Não estou a brincar Teresa. É verdade que as crianças não são todas iguais, mas sabes que muitas vezes falamos assim de algumas crianças, “é fechada” e isso, julgamos, explica o que lhe observamos. Mas a questão é o porquê dela ser “fechada”. Foi ela que se “fechou”? E fechou-se porquê? Não gostou e assustou-se com o que viu ou sentiu dentro dela? Ou não gostou e assustou-se com o que viu ou sentiu do lado de fora. E se não foi ela que se “fechou” mas foi “fechada”? Quem é que a fechou? E porquê? Estás a ver Teresa, dizemos com muita facilidade que o Tiago é uma criança fechada e continuamos a não saber nada dele. Não fica fácil ajudá-lo a “abrir-se”, a não ser “fechado”.
Velho, se calhar é preciso encontrar uma chave que sirva.
Agora estás tu a brincar, mas é mesmo isso, muitas vezes, se estivermos atentos, consegue-se perceber qual é a chave.
Estás sempre com essa ideia de estar atento.
Não conheço melhor forma de perceber o que se passa com os miúdos mas, para complicar, é difícil ensinar ou aprender a estar atento.

PSICOLOGIA E AGRICULTURA

É por estas e por outras que quando em algumas circunstâncias me perguntam se sou psicólogo respondo que sou agricultor. Gosto muito da agricultura mas gosto ainda mais da psicologia sobretudo, naturalmente, da área em que trabalho, a psicologia da educação. Por isso me inquieta a forma como por vezes é maltratada por aqueles que melhor a deviam tratar, nós próprios, em nome da ciência, em nome da ética e da deontologia e em nome das pessoas e instituições com quem trabalhamos.
É sempre com alguma decepção e preocupação que oiço alguns discursos e conheço alguns comportamentos ou aitudes.
Não servem a ninguem.

Cannabis e gays. Psicólogo da TVI volta a ser alvo de queixas

Os psi, modelo de luxo

REPRESENTANTES E INTERESSES REPRESENTADOS

Em qualquer país democrático é imprescindível a existência de instituições ou estruturas que que representam a voz e os interesses de grupos de cidadãos. Estas estruturas ou instituições podem, devem, ter tipologias de diferentes na sua organização, assumirem objectivos diferentes, emergir de grupos sociais de maior ou menor dimensão ou terem implantação local ou nacional.
Estas estruturas ou instituições, desde o partido à associação profissional ou à associação que agrega pessoas ligadas a matérias ou problemas específicos, têm um papel essencial e insubstituível na construção de democracias saudáveis em que os cidadãos, todos os cidadãos têm voz. Isto é tanto mais importante quanto mais baixa é a voz de alguns cidadãos ou grupos como é o caso de boa parte das minorias o que as torna mais vulneráveis,
O que me tem vindo a incomodar é sentir e perceber que com demasiada frequência se vai verificando que mais do que proteger a voz e os interesses de quem representam ou se espera que representem, protegem a voz e os interesses dos que representam essas estruturas ou instituições, ou seja, os seus próprios interesses e voz. 
Sei bem das inúmeras excepções com sei bem dos inúmeros de exemplos de que assim é.
Este cenário não é certamente alheio à falta de saúde ética dos tempos que vivemos. Será que queremos mesmo alterar este quadro?
Aparentemente não, conforme o exemplo proporcionado pelo trabalho do JN sobre a tolerância com que é aceite o retorno à vida política de autarcas envolvidos em “clientelismo, falta de transparência e corrupção".
É destino?

quinta-feira, 29 de junho de 2017

OS MEUS AMIGOS MOLUENES

Discretamente a imprensa refere hoje que segundo o IAC embora existam situações de crianças e adolescentes em grande vulnerabilidade nas ruas já não se encontram como há alguns anos “crianças de rua”. As situações actuais estão mais ligadas a fugas do contexto familiar ou de instituições, criam situações de risco severo em matéria de exclusão ou delinquência mas os contornos são diferentes. 
Esta questão que ainda merece preocupação recordou-me uma experiência pessoal de há alguns anos, passou-se em Moçambique. 
Dessa vez estive duas semanas em Maputo com o Mestre Malangatana, o Velho como lhe chamava, um Homem enorme que já partiu, deixou a obra e as memórias. Estávamos a fazer um trabalho de formação de professores no Centro Popular criado por ele na terra onde nasceu, Matalana, a uns quilómetros de Maputo.
Já tenho partilhado algumas histórias desta graça que a vida me concedeu. Durante toda a estadia jantávamos invariavelmente no Piri-piri, um muito conhecido restaurante na Av. 24 de Julho.
Logo na primeira noite à saída do restaurante, sou completamente submerso por um grupo de moluenes, nome porque são conhecidos os miúdos e adolescentes que vivem na rua em Maputo tal como os "capitães da areia" das ruas de Salvador de que falava o enorme Jorge Amado. Os moluenes tentavam vender-me toda a espécie de “arte popular” a preços “mesmo, mesmo bons”.
Quando viram que vinha acompanhado do Velho, contiveram-se e o Velho Malangatana falou no seu jeito impossível de descrever, “crianças, este branco, o Zé Morgado, é meu amigo, é boa pessoa, é inteligente, vocês não enganem este branco”.
Os miúdos protestaram que não queriam enganar-me e com alguma surpresa, um deles mais velhito aproximou-se para me oferecer um dos batiques que vendia. Perante o meu embaraço na aceitação, disse-me com um sorriso maior que a cara, “sou eu que faço, também me chamo Morgado”. É verdade, o batique estava assinado com um visível e inesperado “Morgado”. Hoje, já passados alguns anos, o batique do Morgado de Maputo ocupa um lugar de relevo na minha casa, na minha cabeça e no meu coração.
Mas de maior relevo ainda, é o lugar de Malangatana, um Mestre.
Nunca me senti tão positivamente discriminado. Em várias das noites seguintes recebi uma oferta bonita dos moluenes, as crianças da rua. Daquelas prendas bonitas que só se dão aos amigos do Velho, do Mestre como eles lhes chamavam.
Privilégio meu.

AINDA UMA NOTA SOBRE OS MANUAIS ESCOLARES

O JN aborda hoje a situação levantada pela devolução inúmeros manuais escolares disponibilizados a alunos do 1º ciclo e que não estão em condições de ser reutilizados.
Ao que parece o ME entende que cada agrupamento deverá decidir o que fazer com estes manuais.
Esta situação era previsível. A construção dos manuais é pouco amigável para a sua reutilização como seria de esperar dado o valor económico deste nicho de mercado. Parece-me também claro que a dificuldade da sua reutilização pode aumentar com o uso que lhe é dado e com as suas características.
Não imagino o que possam vir as escolas a fazer com este espólio sendo que um destino possível será a em reciclagem em vez de reutilização.
Talvez esta situação possa contribuir para um processo de reciclagem não do manual mas da utilização do manual.
Tenho afirmado muitas vezes que boa parte do trabalho em muitas salas de aula é excessivamente “manualizado” associado a práticas pedagógicas pouco diferenciadas muito decorrentes de conteúdos curriculares demasiado extensos, prescritivos e normalizadores. Talvez seja uma oportunidade para atenuar uma fórmula que apesar de inúmeras experiências muito interessantes com resultados ainda assenta na ideia de que o professor ensina com base no manual o que o aluno aprende através do manual que o pai acha muito importante porque tem tudo o que professor ensina.
Não é um processo fácil mas creio que seria um caminho positivo no sentido de acomodar a diversidade de alunos, as suas necessidades e diferenças de contexto que dificilmente são acomodadas num manual, por melhor que seja.

quarta-feira, 28 de junho de 2017

É PEDIR MUITO?

Gostava que um dia a época de avaliação escolar no final do ano lectivo não fosse notícia diária a não ser a referência à sua realização.
Gostava que um dia a avaliação externa, independentemente das suas modalidades e dispositivos, não fosse o (quase) tudo na vida da escola.
Gostava que um dia a avaliação externa, realizada em diversas modalidades e dispositivos ficasse fora da política pequena da partidocracia e dentro da discussão imprescindível sobre política educativa.
Gostava que um dia a avaliação externa decorresse sem perturbações ou ruído como mais uma tarefa a cumprir durante o ano lectivo.
Gostava que um dia se entendesse que mais do que discutir “os exames” talvez fosse de perceber o que se faz com eles, em cada ano e em cada ciclo e no final do secundário.
Gostava que um dia a estabilidade na avaliação fosse a regra e não a excepção.
Gostava que um dia a discussão a discussão sobre a dificuldade e realização dos exames fugisse ao padrão “cada cor, sua sentença”.
...
É pedir muito?

O VELHO QUE COLECCIONAVA SONHOS

Estes dias feios e turbulentos que vão passando recordaram-me um Velho que tinha um gosto curioso, coleccionava sonhos.
Acho que só mesmo os velhos têm o tempo necessário para coleccionar, não o tempo medido no relógio, mas o tempo medido na alma. Pois este Velho tinha já uma boa colecção de sonhos. Era uma colecção muito interessante porque quase não existem repetições, mesmo quando os sonhos são sobre o mesmo tema, cada pessoa sonha à sua maneira e, por isso, nunca o Velho Coleccionador encontrou dois sonhos rigorosamente iguais.
Pedindo às pessoas que conhecia, que pediam às pessoas que conheciam, os sonhos já sonhados e de que não precisassem, o Velho Coleccionador aproveitava-os para a sua colecção extensa e variada.
A primeira operação era ver o estado em que vinha cada sonho e cuidar dele, se necessário. Havia sonhos que, de tanto sonhados pelo sonhador, vinham mais gastos, faltavam bocadinhos, por exemplo. O Velho Coleccionador tentava então encontrar bocadinhos de sonho que os pudessem completar e restaurar. Ficavam como novos alguns desses sonhos, prontos a serem sonhados como se fosse a primeira vez. Alguns chegavam-lhe à mão incompletos, sonhos que se interromperam ao ser sonhados, porque atemorizaram o sonhador que acordou, encontrou muitos casos destes.
A segunda operação era arrumá-los. O Velho Coleccionador tinha os sonhos arrumados em dois grandes armários, um para sonhos bons e outro para sonhos maus. Este armário, o dos sonhos maus, estava sempre fechado à chave, o Velho Coleccionador tinha medo que os netos que adoravam a colecção de sonhos, mexessem nos sonhos maus sozinhos e se assustassem. Dentro de cada armário os sonhos estavam ainda arrumados pelos temas, uma quantidade de temas diferentes.
Às vezes, o Velho Coleccionador, quando lhe aparecia alguém aborrecido com a vida emprestava alguns dos sonhos bons e mais bonitos que tinha na colecção. Ele próprio, o Velho Coleccionador adormecia todas as noites com um sonho desses à cabeceira. Era um Velho tranquilo, como só os velhos que sonham sonhos bons podem ser.

SILLY SEASON

Apesar de aparentemente o verão que já estava por aí ter entrado em reversão a "silly season" veio para ficar.
O enorme estadista e homem da Goldman Sachs, Durão Barroso afirmou que ““Hollande foi o pior erro de casting da história de França”.
Ao que rezam as notícias e os testemunhos terá dito isto sem se rir.
Oh Zé Manel, é verdade que o François não nasceu para aquilo mas seres tu a dizer isso, rapaz! Francamente, não te fica bem, lembras-te daquela do "diz o roto ao nu porque não te vestes tu"?

CUIDADOS DE SAÚDE DIFERENCIADOS

O Relatório Primavera 2017, do Observatório Português dos Sistemas de Saúde, “Viver em Tempos Incertos –Sustentabilidade e Equidade na Saúde”, hoje divulgado mostra que apesar de alguns avanços continua a verificar-se uma forte desigualdade nos acessos a cuidados de saúde em função do rendimento.
Considerando dados de 2014, quase 20% das pessoas mais pobres deixaram de aceder no ano anterior a consultas ou tratamentos por razões económicas enquanto entre as pessoas com maiores rendimentos a situação é de 5%.
O relatório mostra também que os portugueses são dos mais financiam o seu acesso a cuidados de saúde, o financiamento público com medicamentos é 55% enquanto na Alemanha é 83%, na França 71% e no Reino Unido 66%.
Como afirma José Aranda da Silva, um dos coordenadores do observatório, “Quanto mais doente mais pobre, e quanto mais pobre mais doente”
Nada de novo e na linha da generalidade dos estudos nacionais e internacionais.
No mesmo sentido as desigualdades também se repercutem fortemente na esperança da vida, ou seja, para os mais pobres a morte, tal como a doença, chega primeiro.
Será a isto que se chama cuidados de saúde diferenciados?
Quando se questiona o estado social, os limites desse estado, a privatização de serviços, por exemplo na educação e na saúde, é fundamental perceber e entender que a comunidade tem sempre a responsabilidade ética de garantir a acessibilidade de toda a gente aos cuidados básicos de saúde e educação.
Os tempos que temos vivido criando obstáculos ao acesso aos serviços de saúde são ameaçadores.
Como afirma Michael Marmot, um especialista em saúde pública, todas as políticas podem ser avaliadas pelos seus impactos na saúde.

terça-feira, 27 de junho de 2017

VIDAS ADIADAS OU GERAÇÃO PERDIDA

Segundo o INE e considerando o primeiro trimestre deste ano, existirão em Portugal cerca de 175 mil jovens entre os 15 e os 29 anos que não estudam, nem trabalham, a geração “nem, nem" ou, na terminologia em inglês os jovens NEET (Not in Education, Employment or Training).
Destes, estima-se que perto de 67 mil não estão inscritos nos centros de emprego. São números impressionantes.
Parece importante assinalar que esta situação afecta sobretudo jovens com menos qualificações e mulheres, o que também não é novo. A exclusão escolar é quase sempre a primeira etapa da exclusão social.
Ao que se lê no Público o Governo está a desenhar uma “Estratégia de Sinalização Nacional de Jovens que NãoEstudam, Não Trabalham, Nem Frequentam Formação” com o objectivo de identificar e achegar a cerca de metade dos 67 000 que estão fora do sistema”, ou na linguagem sempre criativa da administração, os “jovens desencorajados”.
A ideia será montar uma rede de sinalização que os alcance e não, como é habitual, aguardar que sejas as pessoas a contactar os serviços o que entre “desencorajados” tende a acontecer embora não seja despiciendo considerar a desesperança da falta de resposta.
Esta rede assenta numa ideia de proximidade que parece um caminho interessante que envolve 1500 parceiros locais, entre autarquias, instituições particulares de solidariedade social e associações jovens.
É um imperativo de futuro, pessoal e nacional, a tentativa de “recuperar” estes cerca de 175 mil jovens.
A estes indicadores já profundamente inquietantes deve juntar-se os dados sobre precariedade, abuso do recurso a estágios e outras modalidades de aproveitamento de mão-de-obra barata e a prática de vencimentos que mais parecem subsídios de sobrevivência mesmo para jovens altamente qualificados.
Por outro lado, não podemos esquecer os muitos milhares de jovens que se viram empurrados para fora do país pois sentem que o seu futuro não mora aqui.
Esta situação complexa e de difícil ultrapassagem tem, obviamente, sérias repercussões nos projectos de vida das gerações que estão a bater à porta da vida activa. Entre outras, contar-se-ão o retardar da saída de casa dos pais por dificuldade no acesso a condições de aquisição ou aluguer de habitação própria ou o adiar de projectos de paternidade e maternidade que por sua vez se repercutem no inverno demográfico que atravessamos e que é uma forte preocupação no que respeita à sustentabilidade dos sistemas sociais. As gerações mais novas que experimentam enormes dificuldades na entrada sustentada na vida activa, vão também, muito provavelmente, conhecer sérias dificuldades no fim da sua carreira profissional.
No entanto, um efeito muito significativo mas menos tangível deste quadro precário ou sem alternativas aparentes, é a promoção de uma dimensão psicológica de precariedade face à própria vida no seu todo e que, com alguma frequência, os discursos das lideranças políticas acentuam. Dito de outra maneira, pode instalar-se, está a instalar-se, uma desesperança que desmotiva e faz desistir da luta por um projecto de vida de que se não vislumbra saída motivadora e que recompense. Estarão mais do que “desencorajados”.
Este problema que não é um exclusivo português, longe disso, exige uma visão e um conjunto de políticas que não se vislumbram e cuja ausência compromete a construção sustentável do futuro.
Podemos estar perante a tragédia das gerações perdidas de que há algum tempo se falava.

OS TEMPOS DA ESCOLA

Foi divulgado no final da semana anterior o calendário escolar proposto para 2017/2018.
De relevante dois aspectos, um que é diferente do que se tem verificado e outro recorrente.
O primeiro aspecto é a equiparação do calendário da educação pré-escolar ao ensino básico e secundário. Parece-me normal do ponto de vista da actividade docente e os problemas eventualmente criados às famílias com crianças até aos 5 anos são semelhantes aos das famílias com crianças depois dos 5 anos. Pode discutir-se a questão do calendário e do seu ajustamento mas esta equiparação parece adequada.
O segundo aspecto, que é frequente, remete para mais um ano lectivo com enorme desequilíbrio na duração dos períodos escolares. O próximo ano terá um primeiro período extenso e um terceiro período mais uma vez curtíssimo até à entrada no período de avaliações.
Julgo e já o tenho afirmado que esta questão deveria ser repensada. Aliás, os tempos da escola justificariam ser globalmente repensados.
Se bem se recordam o blogue ComRegras promoveu há algum tempo um inquérito dirigido a directores de escolas e agrupamentos no qual 54.1% dos 181 directores que responderam concorda que o ano escolar seja organizado em dois semestres e não nos habituais três períodos de aulas.
Este dado vai no mesmo sentido de uma proposta da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas divulgada em Junho de 2016.
Como já tenho referido, não tenho uma posição fechada e fundamentada sobre as eventuais vantagens sendo certo que existem outros sistemas em que se verifica o modelo semestral.
No entanto, creio que mesmo numa organização em três períodos a situação que me suscita mais dúvidas é o desequilíbrio que frequentemente se verifica na duração dos períodos e que se repete de forma muito evidente no próximo ano lectivo.
Esta situação decorre do facto de a Páscoa ser uma festa móvel e ser sempre o fnal do 2º período. As alterações são significativas.
Dado que a interrupção da Páscoa marca o fim do 2º período e é uma data móvel as diferenças podem ser significativas.
Parece claro que esta situação não é a mais adequada.
Dada a tradição talvez não seja fácil, mudar nunca é fácil, fazer com o que o calendário escolar não esteja colado a festividades móveis.
Neste contexto, creio que vale a pena reflectir nestas matérias, ouvindo a participação dos vários actores, estudando experiências de outros sistemas e, eventualmente, de uma forma tranquila, oportuna no tempo, repensar o calendário escolar.
Nesta reflexão deveria estar incluída a discussão dos benefícios e eventuais efeitos negativos da criação de uma “pausa” a meio do primeiro período modelo existente em vários países. No próximo ano lectivo o primeiro período vai ser bastante extenso.
No entanto, de uma forma mais global creio que seria interessante reflectir sobre os tempos da escola olhando para outros aspectos.
Num país com as nossas condições climáticas, tal como genericamente no sul da Europa, e considerando boa parte do nosso parque escolar, aulas prolongadas até ao Verão seriam algo de, literalmente, sufocante.
A Confap tem defendido onze meses de actividade na escola. Sendo a guarda das crianças um problema sério e que reconheço, também entendo que não pode ser resolvido prolongando até ao “infinito”, a infeliz ideia de “Escola a Tempo Inteiro”, a estadia dos alunos na escola. A “overdose” é sempre algo de pouco saudável.
No que respeita aos tempos escolares, os alunos portugueses, sobretudo no início da escolaridade tem umas das mais elevadas cargas horárias. Como bem se sabe, mais horas de trabalho não significam melhor trabalho e os alunos portugueses já passam um tempo enorme na escola. Talvez seja de introduzir nesta equação a variável “áreas disciplinares e currículos”, considerando o número de áreas ou disciplinas, conteúdos, organização de anos e de ciclos, etc.
Neste contexto, creio que vale a pena reflectir com tempo e serenidade nestas matérias, semestres ou trimestres, por exemplo, com a participação dos vários actores, estudando experiências de outros sistemas e, eventualmente, de uma forma tranquila, oportuna no tempo, sustentada, repensar os tempos da escola.

segunda-feira, 26 de junho de 2017

SIMPLEX ESCOLAR

No âmbito do Simplex +2017 e em regime experimental o Governo pretende que as provas de aferição do 8º ano possam ser realizadas online no próximo ano. A intenção é que a prazo todo o processo incluindo o preenchimento por parte dos alunos seja assim realizado.
Por princípio e desde que sejam asseguradas condições de equidade, meios, competência e recursos, um calendário de operacionalização que garanta serenidade e minimize os riscos inerentes à mudança, julgo que a simplificação de processos é positiva.
O Mestre João dos Santos, a quem tarda uma homenagem com significado nacional, dizia, cito de memória pelo privilégio de ainda o ter conhecido e ouvido, que em educação o difícil é trabalhar de forma simples, é mais fácil complicar mas, obviamente, menos eficaz, menos produtivo e muito mais desgastante.
Nesta perspectiva e aproveitando o Simplex +2017 talvez fosse de caminhar numa maior simplificação e desburocratização dos processos em educação, sejam os de natureza mais administrativa e funcional, sejam mesmo os de natureza mais pedagógica.
O trabalho dos professores está diariamente submerso num mundo de grelhas e de “excels” que exigem horas sem fim com resultados que muito provavelmente não justificam o “custo” da sua produção. Com é evidente, este custo poderia ser melhor potenciado com processos mais simplificados.
O quotidiano das escolas e dos professores está “ensopado” em burocracia com o preenchimento de inúmeros documentos, registos, acesso a plataformas, que não parecem em muitas situações fazer parte das soluções mas sim dos problemas.
No caso mais particular dos alunos com NEE, a gestão dos seus processos educativos é também altamente burocratizada com uma proliferação de processos, classificações, planos variados, que geram ruído e equívocos decorrentes, entre outras razões, do próprio enquadramento legislativo que também ele carece de um Simplex e actualização que tarda.
Seria na verdade uma boa altura para recuperar a ideia “simples” de João dos Santos e desligar o “complicómetro” e lembrar apesar de por vezes parecerem mais difíceis de conseguir, as coisas simples são as mais eficazes.
Repito que atentando na carga burocrática a que as escolas e os professores estão sujeitos bem se percebe a necessidade de se simplificar.

DA EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR

Creches financiadas pelo Estado podem admitir só crianças ricas

Talvez seja também por razões desta natureza que Portugal tem um dos mais elevados custos de equipamentos e serviços para crianças em idade de pré-escolar.
Aliás, há dias referi o relatório "Starting Strong 2017"que mostrava justamente que as famílias portuguesas são das que realizam mais esforço para assegurar educação pré-escolar o que evidentemente alimenta desigualdade de oportunidades.
Como disse, a escassez de respostas e recursos a preços acessíveis para o acolhimento a crianças dos 0 aos 3, creches ou amas, e dos 3 aos 6 anos, a educação pré-escolar tem diferentes implicações.
Uma primeira é desde logo a inibição de projectos de vida que incluam filhos contribuindo os preocupantes baixos níveis de natalidade.
Por outo lado, os custos dos serviços para a infância acessíveis em termos de proximidade e custos leva à procura de alternativas que passam por situações de menor qualidade e mesmo um mercado clandestino.
É por isso tão importante que se caminhe no sentido de garantir a acessibilidade universal em todo o período da educação pré-escolar aos três anos e criar respostas acessíveis, física e economicamente, às famílias para as crianças dos zero aos três anos. É imprescindível e urgente.
Sabemos todos como o desenvolvimento e crescimento equilibrado e positivo dos miúdos é fortemente influenciado pela qualidade das experiências educativas nos primeiros anos de vida, de pequenino é que ...

domingo, 25 de junho de 2017

AI AGUENTA, AGUENTA

A notícia é inquietante. Uma docente comprovadamente com doença de Alzheimer viu recusada a reforma por invalidez.
A douta junta médica da Caixa Geral de Aposentações, sem qualquer especialista na área da psiquiatria, concluiu que a professora não está “absoluta e permanentemente incapaz” para trabalhar.
Os relatórios dos médicos que a acompanham são claros sobre a gravidade e implicações da doença que já há algum tempo a tornou incapaz de assegurar as suas funções tal como a escola comprovou. A decisão mostra ainda um um absoluto e incompetente desconhecimento sobre as exigências do desempenho profissional. Talvez estudar um pouco não lhes fizesse mal.
Este é mais um caso que mostra a insensibilidade e incompetência com que, por vezes, estes casos são tratados.
É verdade que muitos de nós conhecemos gente que foi reformada por invalidez sem que para tal existisse justificação clínica, os critérios foram outros.
No entanto, este tipo de situações mostra a necessidade de, como sempre, as pessoas serem tratadas como pessoas, sem fundamentalismos administrativos, com competência e respeito pela sua dignidade.
Poderia ainda referir como no que respeita a reformas pagas pela CGA, as múltiplas situações de reformas bem elevadas com carreiras profissionais curtas e ao abrigo do “emprego político”. Não, não é demagogia, é a indignidade do desrespeito e iniquidade.
Estando a situação em tribunal pode ser que a lei determine algo que deveria ser da competência e do bom senso.

sábado, 24 de junho de 2017

DOS EXAMES, UMA OUTRA LEITURA

Também sobre estas perspectivas e considerando o caso particular da Matemática creio que a entrevista de Leonor Santos, especialista em avaliação, hoje no Público merece reflexão atenta.
(…)
(…)

QUO VADIS MUNDO?

Escolas turcas vão deixar de ensinar a teoria da evolução de Darwin

Que se passa contigo Mundo? Estás a ficar, definitivamente, um lugar mal frequentado. Que nos reservará o futuro? Que temos nós de fazer?
Como é que vou explicar isto aos meus netos?

sexta-feira, 23 de junho de 2017

DAS MULHERES

Foi aprovada no parlamento uma lei que introduz um regime de quotas relativas ao género nas administrações e nos órgãos de fiscalização das empresas públicas e das cotadas em bolsa. Por curiosidade, a lei teve votos favoráveis do PS, BE, PEV, PAN e de seis deputados do CDS. Sete deputados centristas votaram contra bem, aliás, acompanhados pelo PCP e o PSD absteve-se, não tem nada a ver com isto.
A própria votação é curiosa e mereceria alguma reflexão que sugiro que sejam os deputados que votaram contra e se abstiveram a realizar. Se quiserem e os deixarem.
Por princípio não simpatizo com o recurso ao estabelecimento de quotas para solução ou minimização de problemas de equidade ou desigualdade. As razões parecem-me óbvias, justamente no plano dos direitos, da equidade e na igualdade de oportunidades.
No entanto, também aceito que o estabelecimento de quotas pode ser um passo e um contributo para minimizar a discriminação. Nesta perspectiva, a aprovação da lei é positiva.
Mas a verdade é que no que respeita a questões de género no mundo do trabalho está quase tudo por fazer sobretudo na base da pirâmide social e económica.
De facto, para além dos baixos salários e da discriminação salarial de que muitas mulheres, sobretudo em áreas de menor qualificação, são ainda alvo, também a regulação da legislação laboral e a sua “flexibilização” as deixam mais desprotegidas. São conhecidas muitas histórias sobre casos de entrevistas de selecção em que se inquirem as mulheres sobre a intenção de ter filhos, sobre casos de implicações laborais negativas por gravidez e maternidade, sobre situações em que as mulheres são pressionadas para não usarem a licença de maternidade até ao limite, etc. Pode também referir-se que apesar das alterações legislativas o uso partilhado da licença por nascimento de filhos ainda é significativamente baixo.
É, pois, combater eficazmente a discriminação salarial e de condições de trabalho através de qualificação e fiscalização adequadas.
É verdade que nas situações de topo a igualdade de oportunidades e não discriminação de género são importantes, mas noutros patamares e circunstâncias a situação é, creio, bem mais séria.
A metade do céu, que as mulheres representam, carrega um fardo pesado.

UM HOMEM CHAMADO PROFESSOR

Ainda no rescaldo de uma greve de professores e porque alguns dos seus problemas são também problemas nossos lembrei-me de uma história.
Como todas as histórias começa assim.
Era uma vez um homem que tinha um trabalho muito engraçado e bonito mas não era fácil.
Ajudava os miúdos a descobrir uma casa chamada escola e a gostarem de estar nessa casa.
Mostrava aos miúdos as coisas tantas que havia para aprender e ajudava-os a não ter medo de aprender. Ele explicava como se aprendia.
Sabia espreitar para os olhos dos miúdos e percebia quando estavam tristes. Nessas alturas falava baixinho com eles ou sentava-se quieto ao seu lado só para que eles não estivessem sós, os outros percebiam que era altura de ir brincar ou fazerem tarefas sem a ajuda dele.
De vez em quando zangava-se com os miúdos. Ele sabia que os miúdos precisam dessas zangas.
Falava muito com os miúdos, inventavam histórias a meias, e discutiam as coisas da vida daquela casa, a escola.
Mostrava aos miúdos o mundo que estava dentro dos livros e os que se podiam construir com as letras.
Explicava aos miúdos como os números serviam para organizar a vida de todos os dias.
Até conseguia que os miúdos percebessem que quando trabalhavam bem em conjunto, cada um ia mais longe.
Um dia o homem ficou velho e teve que sair daquela casa. Nesse dia, toda a gente que ao longo do tempo lá tinha entrado, se lembrou bem do seu nome. Chamava-se Professor.

quinta-feira, 22 de junho de 2017

ESTÁ A TERMINAR O PERÍODO DE NOJO

O período de nojo relativo à enorme tragédia de Pedrógão está a acabar. Não estou a falar do luto, este não acabará nunca, é muita a dor e muita a perda.
Vão começar a sair das bainhas as espadas da demagogia, da falta de pudor, da falta de memória e teremos a sobreutilização desta catástrofe para a luta pequena da partidocracia
Nada de novo, é quase sempre assim a política no Portugal dos Pequeninos.
Como é evidente este enunciado não tem rigorosamente a ver com uma profunda avaliação do que se passou, do que falhou, do apuramento de eventuais responsabilidades e respectivas consequências, do estabelecimento definitivo de dispositivos que minimizem os riscos destas tragédias se repetirem, etc.
Tem a só a ver com a náusea.

A TROCA DE IDEIAS E SABERES

A tragédia recente tem produzido na imprensa e nas redes sociais uma gigantesca chuva de ideias, opiniões, críticas, debates, etc., envolvendo especialistas reconhecidos, especialistas autodesignados, opinadores profissionais ou amadores, senadores(?), comentadores, achistas e tudólogos, os que sabem de tudo  e também, evidentemente de fogos florestais.
A forma como boa parte desta gente opina, e quase sempre quanto maior a ignorância maior se torna a arrogância, vem acentuar algo que do meu ponto de vista vai caracterizando o nosso quotidiano.
A evolução dos modelos de organização social, económica e cultural das sociedades conduziu a um progressivo abandono da troca, substituindo-a pela compra e venda. A concepção romântica da troca de produtos, já não passa de isso mesmo, de romantismo, tudo se compra e vende. Não digo isto por entender que deveria ser de outra forma, não vislumbro que pudesse ser de outra forma.
Apenas lamento que até a troca de ideias e saberes tenha sido substituída pela venda das ideias e do saber, real ou imaginado. Já é difícil assistir a uma conversa entre pessoas que pensam e sabem alguma coisa do que estão falar sem que os intervenientes assumam a postura de quem está a vender as suas ideias e não, apenas a trocá-las com os outros parceiros. Os debates, jogam-se mais em torno das técnicas de marketing, de venda, das ideias que dos conteúdos das mesmas. Cada vez consigo menos participar numa tertúlia, mais formal ou mais informal, sobre um qualquer tema, mais denso ou mais ligeiro, em que os companheiros de conversa não tentem vender as suas ideias e saberes, obrigando-me á sua compra.
Quase sempre encontro pessoas pouco dispostos a trocar as suas ideias e saberes com o que eu próprio carrego,  a experimentá-las, apreciá-las e, se for caso disso, também as usarem ou eu achar que as ideias e saberes (ou crenças) que me foram apresentadas, não impostas em agressivas e às vezes mal-educadas técnicas de convencimento, são interessantes conjugando-as ou substituindo as minhas.
Nas discussões as frases já começam pouco com “que achas?”, “que te parece” ou outra fórmula qualquer que ajude a aceder ao pensamento do outro. Começamos cada vez mais as frases com “É assim”, “Não, isso está errado, deve ser assim” e outras alternativas que apenas servem para apresentar a definitiva e indiscutível ideia e saber sendo que frequentemente a opinião é mascarada e vendida como saber.
Este cenário, pouca troca e muita venda agressiva, numa terra de achistas e opinadores profissionais empobrece-nos a todos, menos a alguns iluminados, os que vendem as ideias e os saberes.
No entanto, como se sabe, os mercados estão atentos e tudo é … mercado.

UMA GREVE ASSIM TIPO ... SEI LÁ

Ontem realizou-se uma greve de professores decidida pelas duas mais representativas forças sindicais da classe, a FENPROF e a FNE.
A greve foi decidida para um dia em que se realizavam exames nacionais do secundário e uma prova de aferição do 2º ano.
Uma greve de professores desencadeia habitualmente discursos de natureza diferente, conforme os interesses, face à sua justificação e, sobretudo, relativamente ao seu impacto. Quando tal acontece em dias de exames a discussão agudiza-se.
No entanto, o Governo de Passos Coelho conseguiu incluir a realização de exames nacionais nos critérios para a determinação de serviços mínimos o que se reflecte fortemente no impacto da “jornada de luta”.
Como é habitual nestes cenários, greves em sectores tão importantes na vida das pessoas, logo no início do período de greve desencadeia-se uma “guerra de números”, ou seja, qual o nível de adesão dos profissionais envolvidos.
Durante o dia de ontem e na imprensa de hoje procurei alguma informação nesse sentido e, estranhamente, não encontrei. Terei procurado mal? Nas fontes erradas? Existirá algum embargo a esta informação?
Encontrei apenas referências a casos pontuais de escolas em que se realizavam exames ou provas de aferição com a informação de que o processo estava a correr ou correu com normalidade e encontrei algumas referências, incluindo de estruturas sindicais, sobre o encerramento de “algumas escolas” onde não se realizavam exames e de resto, os exames e a prova, a decorrer com “normalidade”.
De tudo isto resulta o quê?
Uma greve será sempre uma decisão que resulta de um processo de negociação mal sucedido e deverá constituir uma prova de força, de motivação e empenho dos profissionais envolvidos relativamente aos objectivos definidos nas matérias em discussão. Assim sendo, a dinâmica e adesão conseguidas fortalecem ou enfraquecem essa capacidade de negociação.
Da forma que aparentemente decorreu a greve de ontem o que temos? O ME a poder afirmar que tudo, os exames e a prova de aferição, correu com normalidade. As famílias aliviadas porque tudo, os exames e aprova de aferição, correu com normalidade. Os alunos tranquilos porque tudo, os exames e a prova de aferição, correu com normalidade. E as estruturas sindicais terão desencadeado uma espécie de prova de vida e tentam ver um copo meio cheio num cenário em que apesar da greve tudo (quase) correu com normalidade.
E os professores? Que podem dizer os professores? Que ilações ou avanços retiram da greve?
Como muitas vezes afirmo, alguns dos problemas dos professores são também problemas nossos na medida em que se reflectem na qualidade do trabalho que realizam com os nossos filhos e netos. Deste ponto de vista o que também podemos concluir?
Este foi, de facto um processo estranho.
Socorrendo-me da linguagem dos mais novos … foi assim uma greve … tipo … sei lá.


quarta-feira, 21 de junho de 2017

UM ALEGADO PROBLEMA

A Inspecção Geral da Educação e Ciência e o Ministério Público vão investigar a alegada fuga de informação que terá permitido que uma alegada aluna divulgasse  alegados conteúdos do exame de Português que, efectivamente, saíram no exame.  Episódios desta natureza, reais ou não, raramente passam de alegados.
Também neste não creio que resulte algum esclarecimento real ou alguma alegada responsabilidade embora tenhamos que esperar por alegadas fugas de informação para ir conhecendo o seu resultado da investigação. Como sabemos, alegadas fugas de informação que não deveria fugir, são banais e fazem parte das estratégias de comunicação indirecta por muitos dos alegados intervenientes nestes alegados processos em diferentes áreas. No entanto, como de quando em vez acontece para mostrar que a coisa funciona, pode aconter que uma alegada fuga de informação deixa de ser alegada. A acontecer, alguma gente alegadamente responsável pode ficar alegadamente entalada.
Ainda assim estou convicto de que este episódio de alegada fuga de informação irá, provavelmente, parar à prateleira dos factos alternativos, alegadamente "fake news".
Portanto, o mais certo é que este alegado problema se transforme num não problema.


A HISTÓRIA DO BRINCALHÃO

Num tempo de chumbo lembrei-me do Brincalhão. O Brincalhão foi um companheiro de escola durante alguns anos. Não era o seu nome mas era assim que todos o tratávamos.
Era um tipo fantástico, com ele presente não havia depressão ou mau humor que resistisse. Percebia quando alguém do grupo não estava bem e encontrava sempre a melhor forma de, sem se tornar excessivo, recompor o ânimo mais em baixo.
Disponível para quase tudo, as conversas com o Brincalhão não tinham fim, discutia tudo com um empenho convicto mas sempre com um inultrapassável sentido de humor que só por si justificava a discussão.
Uma outra particularidade que mexia verdadeiramente connosco era o sucesso do Brincalhão junto das miúdas. Confesso que a inveja, coisa feia, era grande. Bem que tentávamos justificar o sucesso com o facto de ele ser um excelente palhaço e as miúdas gostarem de circo. A justificação não era de facto muito boa nem muito inteligente, mas não nos ocorria outra e sempre tentávamos, sem o conseguirmos, proteger a nossa auto-estima porque as miúdas gostavam quase todas do Brincalhão.
Para a realização de qualquer tarefa era importante a colaboração do Brincalhão, ajudava a organizar as dúvidas, a escolher os caminhos e sempre nos ríamos imenso. Era um tipo com uma sensibilidade enorme às injustiças, tinha uma visão quase romântica do mundo e da revolução que se deveria fazer. Com o fino e inteligente humor que o caracterizava minava qualquer discurso mais conservador.
O cumprimento das estradas de cada um levou de mansinho à dispersão do grupo. O primeiro a afastar-se e para longe, para muito longe foi o Brincalhão.
Com o tempo fomos percebendo todos que tínhamos perdido a pessoa mais séria que conhecemos.

FILHOS, UM BEM DE PRIMEIRA NECESSIDADE MAS POUCO ACESSÍVEL

O relatório "Starting Strong 2017", agora divulgado pela OCDE, apesar de assentar em dados de 2013 vem reforçar algo que já era conhecido e que aqui tenho referido pelas suas várias e importantes implicações. As famílias portuguesas são das que realizam mais esforço para assegura educação pré-escolar. Dito de outra maneira, Portugal tem um dos mais elevados custos de equipamentos e serviços para crianças em idade de pré-escolar.
A falta de respostas e recursos a preços acessíveis para o acolhimento a crianças dos 0 aos 3, creches ou amas, e dos 3 aos 6 anos, a educação pré-escolar, constitui-se como um dos grandes obstáculos a projectos familiares que incluam filhos, levando aos conhecidos, reconhecidos e preocupantes baixos níveis de natalidade.
A alteração dos estilos de vida, a mobilidade e a litoralização do país, levam à dispersão da família alargada de modo a que os jovens casais dependem quase exclusivamente de respostas institucionais que, ou não existem, ou são demasiado caras.
É sabido que nos últimos anos muitas famílias sentiram enormes dificuldades em assegurar a permanência dos miúdos nas creches por razões económicas. As Instituições procuram, apesar das dificuldades que elas próprias enfrentam, flexibilizar, até ao limite possível, custos e pagamento tentando evitar a todo o custo que os miúdos deixem de frequentar os estabelecimentos. Aumentaram significativamente a retirada de crianças de estabelecimentos de educação pré-escolar com o acentuar da crise com picos verificados em 2011, 2012 e 2013. Acresce a quebra da natalidade que a situação induz e parece, felizmente, estar em ligeira recuperação que desejamos consistente.
Neste quadro a intenção actual de garantir o acesso à educação pré-escolar aos três anos e criar respostas acessíveis, física e economicamente, às famílias para as crianças dos zero aos três anos é imprescindível e urgente.
Sabemos todos como o desenvolvimento e crescimento equilibrado e positivo dos miúdos é fortemente influenciado pela qualidade das experiências educativas nos primeiros anos de vida, de pequenino é que ...
Assim, existem áreas na vida das pessoas que exigem uma resposta e uma atenção que sendo insuficiente ou não existindo, se tornam uma ameaça muito séria ao futuro, a educação de qualidade para os mais pequenos é uma delas.
No entanto, como há algum tempo escrevi no Público, a educação pré-escolar é bastante mais que a “preparação” para a escola e não deve enredar-se no entendimento de que é uma etapa na qual os meninos se preparam para entrar na escola embora se saiba do impacto positivo que assume no seu trajecto escolar.
Na verdade, as crianças estão a preparar-se para entrar na vida, para crescer, para ser. A educação pré-escolar num tempo em que as crianças estão menos tempo com as famílias tem um papel fundamental no seu desenvolvimento global, em todas as áreas do seu funcionamento e na aquisição de competências e promoção de capacidades que têm um valor por si só não entendidos como uma etapa preparatória para uma parte da vida futura dos miúdos, a vida escolar.
Este período, a educação pré-escolar, cumprido com qualidade e acessível a todas as crianças, será, de facto, um excelente começo da formação institucional de cidadãos. Esta formação é global e essencial para tudo que virão a ser e a fazer no resto da sua vida.

terça-feira, 20 de junho de 2017

PÉS DE BARRO ENTERRADOS NO LODO

O habitat pantanoso continua a incubar e fazer eclodir novos episódios de corrupção, desculpem, alegada corrupção. Mais um grupo de figuras graúdas do aparelhismo político está acusado de diversos crimes, aqueles designados por “colarinho branco”.
Dir-se-á que é a justiça a funcionar. A Ministra da Justiça poderá até vir afirmar que, finalmente, a justiça é cega, não distingue os mais ricos dos mais pobres, a gente do poder da outra gente, mas tudo isto é, evidentemente, mais do que um caso de polícia.
Não sei o que vai acontecer, como tudo irá acabar e importa não esquecer a presunção de inocência. Aliás, todos os envolvidos dirão estar de consciência tranquila e que tudo será devidamente esclarecido.
Sei “apenas” que a sucessão de episódios a que vamos assistindo envolvendo gente no topo da economia, da liderança política e da administração do estado, transforma a nossa sociedade num pântano e num lugar mal frequentado.
Esta é a pantanosa pátria nossa amada.

UMA BOA NOTÍCIA. MAS TALVEZ NÃO SEJA PARA TODOS

Uma parceria entre a delegação da Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal de Viana do Castelo e a Escola Superior de Tecnologia e Gestão do Instituto Politécnico de Viana do Castelo permitiu a criação de uma aplicação móvel que parece representar um ganho significativo na autonomia e mobilidade na deslocação no centro histórico da cidade e dos transportes públicos.
O conhecimento de novas ferramentas, dispositivos ou apoios que minimizem a corrida de obstáculos em que a vida das pessoas com deficiência e das suas famílias se transformou é sempre uma boa notícia.
Esperemos que se confirmem os indicadores de eficácia e que possa ser generalizado o seu uso.
No entanto, ao que parece, os custos do equipamento, smartphones, inibirão a sua generalização pelo que se procuram apoios que a viabilizem.
A impossibilidade de aceder a estes equipamentos por questões económicas será "apenas" mais um factor acrescido de exclusão.
Como sabemos e é reconhecido, os níveis de funcionalidade e autonomia das das pessoas com são dimensões críticas para a sua participação, tão alargada quanto possível, nas actividades das suas comunidades, que, aliás, constitui um critério essencial de inclusão.
É verdade que as pessoas com deficiência, as suas famílias, sabem, sobretudo sentem estas dificuldades. Fazem parte dos grupos sociais mais vulneráveis à pobreza e exclusão que, sublinhe-se, não decorre só das suas dificuldades específicas mas de imensas e grandes barreiras de outra natureza, incluindo o domínio das atitudes, dos valores, no fundo do cumprimento dos seus direitos.
É justamente por isso que o Estado Social é um avanço civilizacional que não pode nunca ser ameaçado ainda que, evidentemente, racionalizado e melhorado.

EXAMES FÁCEIS, EXAMES DIFÍCEIS? EXAMES ADEQUADOS? EXAMES DESADEQUADOS? DEIXEM LÁ VER

Em matéria de educação por estes dias é difícil fugir ao tema exames, apesar da reversão parcial estamos em plena época alta.
Como sempre, uma das grandes questões em apreço será a maior ou menor dificuldade dos exames.
Como é reconhecido, o presidente do Conselho Científico do Instituto de Avaliação Educativa admitiu-o em tempos numa entrevista, os exames têm sido uma arma privilegiada na gestão política do sistema educativo. Daí a necessidade de que a avaliação externa fosse da responsabilidade de uma estrutura verdadeiramente independente do poder político.
Neste contexto, através da "modulação", por assim dizer, da sua dificuldade, poder-se-á influenciar os resultados no sentido esperado e mais favorável a interesses de circunstância. Este entendimento minimiza o impacto das análises comparativas. Veja-se, por exemplo, a discussão recorrente e raramente consensual sobre o grau de dificuldade e adequação dos exames. Esta discrepância acontece, sem estranheza, até na apreciação do mesmo exame como repetidamente tem acontecido com os exames de Matemática registando-se diferentes opiniões entre a Associação dos Professores de Matemática e a Sociedade Portuguesa de Matemática.
Na época de exames deste ano lectivo temos ainda um dado que não é despiciendo, as próximas eleições pelo que ...
Em tal cenário não é irrelevante que resultados escolares mais positivos venham mostrar que “alunos e professores corresponderam com o seu trabalho” o que contribui para ratificar a “bondade das políticas educativas”.
Estes discursos aparecerão, evidentemente, sempre embrulhados em referências a rigor e a exigência.
Como diz o Velho Marrafa lá do Alentejo, “Deixe lá ver”, vamos ver como se segue a época de exames.
Em princípio, nada de novo, tudo de velho.

segunda-feira, 19 de junho de 2017

É DEMAIS

A dor é demais.
A tristeza é demais.
A desolação é demais.
A ausência é demais.
O inferno é demais.
A perda é demais.
A desesperança é demais.
A impotência é demais.
As lágrimas são demais.

A incompetência é demais.
O voyeurismo é demais.
O vampirismo mediático é demais.
A tudologia ignorante do palpite é demais.
O despudor de alguns discursos é demais.
A indignidade da exposição da dor é demais.
O desrespeito ético é demais.
A hipocrisia é demais.

A dor é demais.

EXAMES PARA QUE VOS QUERO

Sem estranheza, estamos em plena época alta, o Público trazia ontem um extenso trabalho sobre os exames do secundário criando um espaço de reflexão em torno da sua existência, modelo e função.
Creio que no contexto actual a existência de exames nacionais no ensino secundário parece-me justificada como forma de regulação advinda de uma avaliação externa associada à avaliação interna. No que respeita ao seu modelo creio que seria interessante, tal como algumas opiniões expressam, caminhar para modelos de exame mais integrados em matéria curricular e menos centrados em mobilização instrumental de conhecimentos e mais diversificados nos dispositivos e suportes.
A terceira questão, a função, é que me parece carecer de reflexão e mudança.
Contrariamente ao que se passa em muitos países os resultados dos exames têm um peso muito significativo no acesso ao ensino superior o que contamina e enviesa aquela que me parecer a sua função central. Os exames nacionais destinam-se, conjugados com a avaliação realizada nas escolas, a avaliar e certificar o trabalho escolar produzido pelos alunos do ensino secundário. Não deveria ser mais do que isto.
Como tantas vezes tenho defendido, o acesso ao ensino superior é uma outra matéria que deveria ser da responsabilidade do ensino superior e estar sob a sua tutela.
A situação existente, não permite qualquer intervenção consistente do ensino superior na admissão dos seus alunos, a não ser a pouco frequente definição de requisitos em alguns cursos, o que até torna estranha a passividade aparente por parte das universidades e politécnicos, instituições sempre tão defensoras da sua autonomia. Parece-me claro que o ensino superior fazendo o discurso da necessidade de intervir na selecção de quem o frequenta não está interessado na dimensão logística e processual envolvida.
Os resultados escolares do ensino secundário deveriam constituir apenas um factor de ponderação a contemplar com outros critérios nos processos de admissão organizados pelas instituições de ensino superior como, aliás, acontece em muitos países.
Sediar no ensino superior o processo de admissão minimizaria muitos dos problemas conhecidos decorrentes do facto da média de conclusão do ensino secundário ser o único critério utilizado para ordenar os alunos no acesso e eliminaria o “peso” das notas inflacionadas em diversas circunstâncias e tantas vezes divulgado. Minimizaria também a forma como é percebida pelos alunos a importância de todas as disciplinas do secundário sobrevalorizando, naturalmente, as disciplinas específicas relativamente ao curso a que pretendem aceder.
Será que se chegará a algum consenso sobre esta questão?

domingo, 18 de junho de 2017

TRAGÉDIA NO INFERNO

Chegou o inferno. Chegou com uma violência brutal e trágica que não imaginávamos possível nos tempos que correm em consequência de um fogo florestal.
Todos os anos, como sempre de resto, se anunciam novas estruturas de resposta rápida e meios de combate, designadamente meios aéreos mais sofisticados e somos informados de melhorias nos dispositivos de prevenção e combate, no aumento de meios à disposição, na racionalização da gestão dos recursos, etc. etc.
Entretanto, quando se começa a verificar a ocorrência mais frequente de fogos surge o costume, a comunicação social, sobretudo a televisiva, de forma frequentemente sem pudor, respeito e competência, a mostrar o "terreno", o "cenário dantesco", a ouvir "moradores que passaram uma noite em branco", a ouvir o "senhor comandante dos bombeiros", a referir os "meios aéreos, dois Canadairs e um Kamov", a ouvir os "responsáveis locais ou regionais da protecção civil", a gravar despudoradamente imagens de dor, sofrimento e perda de gente anónima que tendo quase nada, vê arder o quase tudo. Um filme sempre visto e sem surpresas.
Este ano acresce a tragédia da morte numa tão grande dimensão que se torna difícil de acomodar.
É evidente que temperaturas muito altas e vento que nos caracterizam durante os meses de Verão são condições desfavoráveis, mas a falta de prevenção, a negligência e delinquência dão um contributo fortíssimo ao inferno que sobressalta cada Verão.
Sem nenhuma espécie de conhecimento destas matérias, para além do interesse e preocupação de um cidadão minimamente atento e preocupado com os custos enormes destes cenários de destruição, tenho alguma dificuldade, considerando a dimensão do nosso país, em compreender a inevitabilidade destes cenários. Os espanhóis têm por uso afirmar que os incêndios se combatem no inverno, nós combatemo-los no inferno.
Trata-se de um destino que não pode ser evitado? Trata-se de uma área de negócios, a fileira do fogo, que, pelos muitos milhões que envolve, importa manter e fazer funcionar sazonalmente? Trata-se "só" de incompetência na decisão política e técnica em termos de resposta e prevenção? Trata-se da falência de modelos de desenvolvimento facilitadores de desertificação e abandono, designadamente das áreas rurais?
O poeta falava de um fogo que arde sem se ver, é bonita a imagem. Mas quando um fogo arde e se vêem os seus efeitos devastadores e dramáticos, quando rouba a vida a tantas pessoas, dói, dói muito e não se perdoa. Não sabemos o quê nem a quem.
A dor é imensa.

sábado, 17 de junho de 2017

"DOPING" MENTAL

O bastonário da Ordem dos Psicólogos Portugueses, em entrevista ao Público, chama a atenção para aumento do consumo de fármacos na época das avaliações escolares.
Este consumo de fármacos não é um problema novo mas, do meu ponto de vista e como já o tenho referido aqui, é uma matéria que continua a exigir mais atenção e, sobretudo, intervenção. No entanto, como também afirma o bastonário, faltam os meios. Assim sendo … que venham as drogas. É uma questão de opção.
De facto, os ansiolíticos e o metifenidato (mais conhecido por uma das designações comerciais, Ritalina) são consumidos em níveis preocupantes que aparentemente ainda são mais elevados em época de exames. Aliás, o metilfenidato também é conhecido pelo “comprimido da inteligência” o que é ilustrativo.
Segundo estudo realizado pelo ISCTE e pela Egas Moniz – Cooperativa de Ensino Superior sobre Medicamentos e Consumos de Performance, divulgado em 2014, cerca de um quarto dos jovens portugueses, dos 18 aos 29 anos, assume ter consumido fármacos para melhorar a concentração e o mesmo número assume o consumo para descontrair e acalmar.
Este consumo e a forma de o minimizar têm de considerar alguns aspectos relativos aos estilos de vida actuais, bem como ao quadro de valores subjacente.
Em primeiro lugar e como tantas vezes tenho afirmado, a pressão para a excelência no desempenho escolar tem vindo a aumentar seriamente quer no contexto familiar quer também em muitas comunidades escolares, já não se confina à pressão para o alto rendimento desportivo, área em que a situação era mais conhecida. Acresce que em termos gerais, dadas as dificuldades e a competição, a pressão para o rendimento é algo de constante e abrangente.
Muitas pessoas, crianças, jovens ou adultos, lidam mal com esta enorme pressão para o alto rendimento e ambientes competitivos. A experiência tem-me mostrado variadíssimos casos de crianças evidenciando enorme dificuldade em gerir a pressão familiar para a excelência dos resultados escolares. Neste quadro germina facilmente quadros severos de ansiedade que são mais um “incentivo” à busca de uma ajuda química que a faça diminuir.
Por outro lado, são também conhecidos os excessos no consumo de álcool entre os adolescentes que entre si não aceitam facilmente ter um desempenho "inferior" ou medíocre em situações de grupo.
A esta pressão para o "alto rendimento" acresce a facilidade de acesso aos medicamentos e a atitude de automedicação que nos leva a sermos um dos países em que este comportamento mais prevalece e em que se consomem mais psicofármacos.
Finalmente, uma atitude genérica face ao trabalho, o trabalho escolar por exemplo, que nos faz remeter para a véspera o que deveria ser realizado de forma mais regular e espaçada no tempo. Tal facto, aumenta a sobrecarga e a pressão em curtos períodos de tempo que solicita então uma "ajudinha milagrosa" que algum colega sempre sugere e sempre se consegue.
O "doping mental" não é, no entanto, um problema dos estudantes, é, apenas, uma das muitas faces daquilo que são os nossos estilos de vida que, estes sim, deveriam merecer alguma atenção, designadamente nos programas educativos.
Seria também necessário que as escolas e agrupamentos contassem com os recursos necessários e competentes para minimizar este tipo de problemas. Como o bastonário também afirma o número de psicólogos que integrem as equipas de agrupamentos e escolas, bastante inferior às orientações internacionais sobre esta matéria, sendo que boa parte deles tem contratos provisórios para assumir funções e lidar com problemas que são permanentes e o recurso ao “outsourcing” para prestar serviços de psicologia nas escolas é um fingimento de resposta apesar do empenho e competência da generalidade dos psicólogos envolvidos que recebem muitas vezes uma indignidade que é mais um subsídio de sobrevivência que um salário e desenvolvem apoios contabilizados ao minuto e dificilmente suficientes e eficazes.
Ao que também é dito e conforme sucessivos anúncios está previso o aumento de técnicos para o próximo ano lectivo que, aliás, já deveria ter sido para este que está a terminar.
A ver vamos.

OIÇA UM BOM CONSELHO

que eu lhe dou de graça.
Apesar de não ser muito de dar conselhos não pude deixar de me lembrar do Chico Buarque.
Se puderem não andem a colher batatas com 40º, não é definitivamente a mais refrescante das actividades aqui no monte. Mas há que tirá-las da terra.
Como diz o Velho Zé Marrafa, é áspero que o calor "tá" bravo. No entanto ... tarefa cumprida.
São também assim os dias do Alentejo.
Fica o Chico ... soa sempre bem.

sexta-feira, 16 de junho de 2017

DOS PROFESSORES

O universo da educação é reconhecidamente uma área em que se confrontam diversas visões de sociedade ou ideologias, onde se confrontam metodologias e argumentos com base em diversas áreas da ciência, onde se confrontam interesses de natureza exterior à educação e nem sempre coincidentes, antes pelo contrário, onde se confrontam as conveniências da partidocracia, onde se confrontam …
A conflitualidade decorrente não é um problema em si, é um fenómeno natural e mesmo uma oportunidade de mudança.
No entanto, neste universo tem emergido nos últimos anos uma outra dimensão de conflitualidade que por vezes me causa alguma perplexidade embora compreenda alguns dos seus fundamentos. Refiro-me à conflitualidade entre professores. Espero que os professores me desculpem ou me esclareçam se eventualmente estiver errado.
De há alguns anos para cá, com particular ênfase a partir da Ministra Maria de Lurdes Rodrigues e acentuando-se com a entrada no período mais severo do fundamentalismo austeritário com Nuno Crato no ME, vários aspectos das políticas educativas deram contributos sérios para um clima de crispação e instabilidade nas escolas e na profissão no qual germina e se alimenta a conflitualidade entre professores que, evidentemente, pode ser útil para a tutela política.
Recordo aspectos como a divisão entre professores titulares e professores outros, o processo de avaliação de professores lançado na mesma altura, a questão das quotas na avaliação, decisões em matéria de carreira, concursos, critérios, horários, gestão dos recursos e das cargas horárias, a sinistra PACC, etc, etc.
No entanto e apesar de tudo isto que poderia ser um contributo para criar alguma coesão mesmo com o risco de corporativismo, o que me pareceria ainda assim compreensível, vou assistindo com estranheza a dimensões de acrimónia e conflitualidade entre professores que tenho mais dificuldade em entender.
Acompanhar a imprensa mas sobretudo as redes sociais permite verificar isto mesmo, vejamos apenas alguns exemplos.
É frequente verificarmos professores de diferentes ciclos em guerra entre si, os do 1º ciclo e educação pré-escolar mais agrupados, o 2º e e 3º ciclo constituindo um outro grupo e os docentes do secundário também do outro lado da barreira numa troca de acusações sobre diferentes matérias que nem sempre consigo compreender.
É frequente um acantonamento por função e temos mais um foco de acesa discussão, por exemplo entre professores titulares de turma e professores de apoios educativos ou com outras funções. É também observável a crispação entre professores do sistema público e do sistema privado.
As discussões entre professores sobre os grupos disciplinares, os concursos, as regras, os critérios, a mobilidade como se o quadro definido fosse da responsabilidade individual de cada docente.
As críticas de professores a trabalho desenvolvido por outros professores quando esse trabalho parece ter algum reconhecimento.
As críticas frequentes de professores à formação de outros professores numa aligeirada definição entre bons e maus consoante a tipologia da formação que tiveram ou as instituições onde as obtiveram como se tudo acabasse onde na verdade apenas começa.
Bom, mais exemplos se poderiam dar.
Não defendo, muito pelo contrário, os falsos consensos e a unanimidade de opiniões e, como já disse, vejo os conflitos como oportunidades de desenvolvimento.
No entanto, o tanto que aproxima quem é Professor é muito mais do que separa quem é Professor.
Porquê e para quê este clima entre profissionais de educação?
Desculparão o atrevimento deste texto mas não serve desde logo aos professores, à sua valorização social, à sua coesão ou à promoção e divulgação da qualidade do seu trabalho.
Estarei errado?

quinta-feira, 15 de junho de 2017

UM RAPAZ CHAMADO SALTADOR

Era uma vez um rapaz chamado Saltador. Está mesmo a ver-se que com um nome destes se tratava de uma pessoa destinada a saltar. Pois foi essa a sua vida, sempre a saltar.
Passado pouco tempo de nascer saltou da família pois era negligenciado e maltratado. Saltou para uma instituição onde saltava de técnico em técnico sem se fixar em nenhum e sem ninguém se fixar nele. Aliás, até saltou de instituição devido a problemas na primeira. Entretanto o Saltador foi entregue a uma família de acolhimento de onde saltou porque as coisas não correram muito bem. Voltou a uma instituição e entrou na escola. Sem estranheza, os problemas com o Saltador começaram a acontecer, diziam que o saltador era instável, não se ligava às pessoas, que não se concentrava nas tarefas escolares, enfim, sempre a saltar de um lado para o outro. Nessa escola foi saltando de turma e de professores até que, tinha que ser, saltou de escola e para onde foi tudo recomeçou.
Ao crescer saltou da instituição e foi para casa de uma irmã mais velha que se dispôs a recebê-lo. O Saltador foi-se aguentando na casa da irmã, saltou definitivamente na escola e passou a saltar de trabalho em trabalho sempre precário e sempre a acabar quando começava a saber o que fazer.
Como ninguém gosta de andar só o Saltador encontrou um grupo de gente, tão saltadora quanto ele, e começou uma vida de saltos no escuro. A adrenalina e a tentação do ter facilmente motivaram saltos cada vez maiores.
Um dia, algo correu tragicamente mal e o Saltador deu o último salto da sua curta estrada. Saltou para o outro lado da vida.
Reparem na quantidade de gente que desde pequena leva a vida saltando, em sobressalto.

O BEM-ESTAR DOS MAIS NOVOS. O ESTADO DA ARTE VISTO PELA UNICEF

A imprensa de hoje faz referência ao Relatório da UNICEf “Building the Future - Children and the Sustainable Development Goals in Rich Countries” sobre o bem-estar das crianças nos 41 países considerados mais desenvolvidos que incluem UE e OCDE. Vale a pena a leitura.
Portugal aparece posicionado na 18ª posição considerando o conjunto dos critérios definidos.
De forma mais específica é importante a excelente apreciação no critério saúde e a baixa classificação no critério “erradicar a fome” ou “pobreza”.
O desempenho em educação está em termos médios.
Nesta síntese registo ainda para um baixo 27º lugar na “redução de desigualdades” e uma situação positiva relativamente às taxas de suicídio ainda que a ocorrência de episódios de bullying seja a oitava mais elevada neste relatório sobre 41 países.
Uma nota final para sublinhar que apesar de estarmos a analisar os países mais desenvolvidos uma em cada cinco crianças vive em pobreza relativa.
Em termos gerais, e sempre sobre os países mais ricos, o relatório da UNICEF mostra por exemplo que uma em cada cinco crianças vive em pobreza relativa e que uma em cada oito enfrenta insegurança alimentar.
O estudo cuidadoso destes indicadores no seu conjunto poderia contribuir para definir um sólido e necessário caderno de encargos em matéria de políticas que envolvam os problemas das diferentes dimensões  da vida dos mais novos.
Se assim fosse, o futuro poderia ser encarado com mais optimismo.

quarta-feira, 14 de junho de 2017

ALUNOS COM NEE. E DEPOIS DOS 18 ANOS?

O Professor Filinto Lima tem ontem no DN um texto que coloca algumas questões pertinentes e dramaticamente actuais no que respeita aos alunos considerados com necessidades educativas especIais também já aqui abordadas. Uma delas é o que acontece depois dos 18 anos.
Filinto Lima refere o aumento constante do número destes alunos na escolas públicas e as implicações decorrentes. Assim tem acontecido com particular ênfase no secundário provavelmente devido ao alargamento da escolaridade obrigatória e a alguma mudança na visão sobre o trajecto educativo dos alunos com NEE. De acordo com a Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência este ano e considerando 2015/2016 o número de alunos subiu 18%, de 11062 para 13077.
Sabemos que alguns alunos passam por experiências de sucesso, felizmente que assim é. No então o período que se segue é um enorme túnel no qual poucas vezes se vislumbra uma luz. Começando pela continuidade no trajecto escolar a percentagem de alunos com necessidades especiais relativamente aos alunos que frequentavam o ensino superior em 2013/2014 era de 0.36%. No presente ano lectivo foram preenchidas apenas 14% das vagas do contingente especial para alunos com deficiência.
Se a estes dados acrescentarmos que a taxa de desemprego na população com deficiência é estimada em 70-75% e que o risco de pobreza é 25% superior à população sem deficiência e que Portugal se orgulha de ter perto de 98% dos alunos com NEE a frequentar as escolas de ensino regular no período de escolaridade obrigatória, temos um cenário que nos deve merecer a maior atenção.
Como tantas vezes tenho dito, aqui e nos espaços de contextos da lida profissional, a questão da presença dos alunos começa no que é feito no ensino básico e secundário, e existe muita matéria para reflectir e sobre as mudanças necessárias.
Por outro lado, é fundamental que com clareza, sem ambiguidades ou equívocos se entenda e após a escolaridade obrigatória os jovens, TODOS os jovens, têm três vias disponíveis formação profissional, formação escolar (ensino superior) ou mercado de trabalho (trabalho na comunidade).
A realidade mostra que os jovens com necessidades especiais estão significativamente arredados destas vias e, voltamos ao mesmo, em muitas circunstâncias ao abrigo de práticas e modelos de resposta sob a capa da … inclusão. Muitos deles ficam entregados (não integrados) às famílias no que Filinto Lima chama de Ministério Casa ou encaminham-se para instituições onde, apesar de algumas experiências interessantes, se recicla a exclusão.
Desculpem a enésima repetição mas um processo de inclusão assenta em cinco dimensões fundamentais, Ser (pessoa com direitos), Estar (na comunidade a que se pertence da mesma forma que estão todas as outras pessoas), Participar (envolver-se activamente da forma possível nas actividades comuns), Aprender (tendo sempre por referência os currículos gerais) e Pertencer (sentir-se e ser reconhecido como membro da comunidade). A estas cinco dimensões acrescem dois princípios inalienáveis, autodeterminação e autonomia e independência.
As pessoas com NEE de diferente natureza depois dos 18 anos devem ser, estar, participar e pertencer aos contextos que todas as outras pessoas com mais de 18 anos estão. As instituições ou voltar para a família serão sempre um recurso e nunca uma via.
É também claro que no âmbito do ensino superior importa que se proceda a ajustamentos de natureza diversa, atitudes, representações e expectativas, oferta formativa, custos, acessibilidades e apoios ou, aspecto fundamental, promover melhor articulação com o ensino secundário
As questões mais complexas decorrem, os estudos e a experiência sugerem-no, das barreiras psicológicas e das atitudes, pessoais e institucionais, seja de professores, direcções de escola, da restante comunidade, incluindo, naturalmente, professores do ensino básico e secundário e de "educação especial", técnicos, os alunos com necessidades especiais e famílias
Também é minha convicção de que as preocupações com a frequência do ensino superior por parte de alunos com necessidades especiais é fundamentalmente dirigida aos alunos que manterão as capacidades suficientes para aceder com sucesso à oferta formativa tal como ela existe. Estou a referir-me, evidentemente, aos alunos que não têm “diagnóstico” de problemas de natureza cognitiva.
No entanto, como tantas vezes digo, esta preocupação deveria ser mais alargada, estamos a falar de inclusão e agora, se quiserem, da minha utopia.
Porque não podem frequentar estabelecimentos de ensino superior? Sim, frequentar o ensino superior onde estão jovens da sua idade e em que a oferta formativa se for repensada e a experiência de vida proporcionada podem ser importantes.
Não, não é nenhuma utopia. Muitas experiências noutras paragens mas também por cá mostram que não é utopia.
O primeiro passo é o mais difícil, tantas vezes o tenho afirmado. É acreditar que eles são capazes e entender que é assim que deve ser.
Eu já disse e escrevi isto várias vezes. Peço desculpa mas continuarei a fazê-lo.

PERPLEXIDADE E INQUIETAÇÃO

Eu sei que se passa lá muito longe, do outro lado do mar. Também sei que no mundo em que vivemos o longe é cada vez mais perto.
Não é possível ler isto sem alguma perplexidade e inquietação embora se possa compreender o contexto que sustenta a decisão.
É que estamos a falar de educação, de escola, de professores, de alunos … do futuro.
O mundo anda feio.