quarta-feira, 19 de setembro de 2012

A NORMALIDADE DO ANO LECTIVO E METAS CURRICULARES SEM AUSTERIDADE


O Ministro Nuno Crato informou hoje na Assembleia da República que o ano lectivo abriu com toda a normalidade. Seria desejável que quando o Professor Nuno Crato chegasse de Marte, alguém lhe explicasse que normalidade não será a melhor forma para adjectivar o clima e as circunstâncias em que nas escolas se iniciou o ano lectivo. Dispenso os exemplos, não tenho espaço.
Informou também, sem surpresa, face à persistência que este governo demonstra na sua acção, que História, Geografia, Ciências Naturais, Físico-Química e Inglês terão as metas curriculares definidas como já tiveram Português, Matemática, Tecnologias da Informação e Comunicação, Educação Visual e Educação Tecnológica. Não posso, por isso, deixar de retomar algumas notas.
Não sou especialista em questões curriculares mas existe gente competente e de bom senso capaz de elaborar em tempo útil um currículo ajustado, actualizado e que vá ao encontro das aprendizagens e definindo de forma ágil e clara as competências e saberes essenciais para cada ciclo de escolaridade. Parece-me que também nesta matéria, conteúdos curriculares, seria bom não esquecer João dos Santos, desligar o “complicómetro” e lembramo-nos de que apesar de mais difíceis de conseguir, as coisas simples são as mais eficazes. Basta atentar na carga burocrática a que as escolas e os professores estão sujeitos e bem se percebe a necessidade de se simplificar.
Reparem no exemplo para o 1º ciclo e considerando Português e Matemática. As duas áreas curriculares  envolvem no total 177 objectivos e 703 descritores, ou seja, no 1º ano, 33 objectivos e 143 descritores; no 2º, 47 objectivos e 168 descritores; no 3º, 51 objectivos e 202 descritores e no 4º, 46 objectivos e 190 descritores. É obra, uff. No final, considerando todas as disciplinas a folha de EXCEL, instrumento hoje em dia indispensável, de planeamento das aulas vai tornar-se algo facilmente gerível.
Por outro lado, como também já escrevi, a lógica de elaboração das metas curriculares remete para uma lógica de ano de escolaridade e não de ciclo como prevê a Lei de Bases, isto é, os objectivos são definidos para o ciclo e não para o ano, aliás, os exames, tão caros ao MEC, acontecem exactamente no final de ciclo. A definição exaustiva de metas curriculares por ano de escolaridade faz emergir o risco de uma leitura fechada, relembro que serão obrigatórias a partir de 2013/2014 e segundo os autores, estabelecem o que os alunos deverão imprescindivelmente revelar, “exigindo da parte do professor o ensino formal de cada um dos desempenhos referidos nos descritores”, recordo que como disse acima, os professores deverão avaliar só em Matemática e Português do 1º ciclo 703 descritores. Tarefa fácil, como se compreende.
Este entendimento pode levar a que o ensino se transforme na gestão de uma espécie de "check list" das metas estabelecidas implicando a impossibilidade de acomodar as diferenças, óbvias, entre os alunos, os seus ritmos de aprendizagem o que culminará, antecipa-se, com a realização de exames todos os anos. O MEC tem referido, presumo como chancela de qualidade, que as metas curriculares definidas radicam no modelo de standards e core standards seguido no Reino Unido e nos EUA. Os mais atentos a estas matérias sabem que a origem não garante, só por si, nenhum selo de qualidade dadas as características e problemas que os sistemas educativos quer do Reino Unido, quer dos EUA atravessam. Uma nota lateral para lamentar que o MEC não se tenha também inspirado no movimento actual dos EUA e do Reino Unido de contrariar as grandes escolas, e não prosseguir a sua política de mega-agrupamentos.
Para além da necessidade de uma mais consistente revisão curricular, parece-me clara a pertinência da definição de orientações em matéria de gestão curricular, mas um excesso de normalização pode fazer parte do problema e não um contributo para a solução. Alguns estudos recentemente divulgados relativos ao Português no 1º ciclo não são particularmente animadores.
No entanto, o MEC persiste.

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