sábado, 15 de setembro de 2012

HÁ MIÚDOS, MUITOS MIÚDOS, A PASSAR MAL

Tragicamente sem estranheza, o início do ano escolar está a revelar o enorme conjunto de dificuldades que muitas famílias, demasiadas famílias estão a sentir para a assegurar condições mínimas de qualidade de vida aos seus miúdos. Professores e directores escolares registam a subida de pedidos de ajuda e da apresentação de situações de carência, sendo particularmente preocupante a situação de carência alimentar.
Ontem a imprensa referia a impotência e dificuldade de muitas instituições de solidariedade social em responder ao aumento brutal de pedidos de ajuda das famílias.
Face a este cenário o que temos pela frente é a insistência insensível num caminho de cortes nas áreas sociais e da educação, no corte insentaso e insustentável no rendimento das famílias produzindo diariamente novos pobres que já nem envergonhados se conseguem sentir, tamanha é a desesperança que faz aparecer na escola ou nas instituições de mão estendida.
Felizmente temos um Primeiro-ministro que dorme tranquilo com a gestão do país. Sim, eu sei, é demagogia, mas há expressões proibidas a quem lidera quando as sociedades experimentam fortíssimas dificuldades.
Já foi decidido que este ano lectivo as escolas distribuirão pequenos-almoços às crianças identificadas como situações vulneráveis, sinalizadas, como se costuma chamar entre nós. A medida pecou por tardia, muitas crianças têm como alimentação não muito mais do que aquilo que as escolas lhes providenciam, como bem sabem as pessoas que se movem no universo da educação.
As dificuldades das famílias e o que dessas dificuldades penaliza e ameaça os mais pequenos, é demasiado importante para que não insistamos nestas questões. Todos os estudos e indicadores identificam os mais novos como o grupo mais vulnerável ao risco de pobreza que, aliás, tem vindo a aumentar.
Por outro lado, relembro um estudo de há uns meses realizado pelo I junto das autarquias dos distritos de Lisboa, Porto, Setúbal, Coimbra e Faro que revelou que quase metade dos alunos da educação pré-escolar e do 1º ciclo recebe apoios sociais sendo que em alguns concelhos a percentagem de crianças carenciadas atinge os 65%, número verdadeiramente impressionante. Acresce que em muitos concelhos a maioria das crianças apoiadas integram o escalão A dos apoios, o que se destina aos agregados com rendimentos mas baixos. Este cenário agravou-se fortemente para este ano lectivo. Acresce a dificuldade advinda dos cortes na Acção Social Escolar e no orçamento das autarquias.
Estes indicadores sobre as dificuldades que afectam a população mais nova são algo de assustador. Esta realidade não pode deixar de colocar um fortíssimo risco no que respeita ao desenvolvimento e sucesso educativo destes miúdos e adolescentes e portanto, à construção de projectos de vida bem sucedidos. Como é óbvio, em situações limite como a carência alimentar, estaremos certamente em presença de outras dimensões de vulnerabilidade que concorrerão para futuros preocupantes.
É por questões desta natureza que a contenção das despesas do estado, imprescindível, como sabemos, deveria ser feita com critérios de natureza sectorial e não de uma forma cega e apressada, naturalmente mais fácil mas que, entre outras consequências, poderá empurrar milhares de crianças para situações de fragilidade e risco com implicações muito sérias.
Miúdos com fome não aprendem e vão continuar pobres. Manteremos as estatísticas internacionais referentes a assimetrias, insucesso e incapacidade de proporcionar mobilidade social através da educação. Não estranhamos, Dói mas é “normal”, é o destino.

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