A RTP1 passou ontem do Telejornal uma peça
interessante sobre o acesso dos miúdos, logo de muito novos, a mundos como a
moda e publicidade, teatro ou o desporto, muitas vezes por pressão dos pais e
com resultados nem sempre positivos. A questão merece umas notas a que voltarei
um dia destes. No entanto e a este propósito, gostava de vos deixar uma cena
testemunhada aqui pelo escriba
Actores principais - Pai e filho com uns 5 ou 6
anos
Actores secundários - A mãe que entre chamadas no
telemóvel grita incentivos para o filho
Cenário - uma zona relvada com dois pinos
colocados de forma a simular uma baliza.
Assistentes discretos - o escriba
Guião - O pai ensina o filho a dar pontapés numa
bola de futebol em direcção à baliza dos pinos.
Cena e diálogo (reconstruído a partir de excertos
ouvidos pelo escriba)
O pai apontando para uma zona do pé do miúdo que
tem botas de futebol calçadas - Já te disse que é com esta parte do pé que
tens de acertar na bola, vê se tomas atenção.
O miúdo em silêncio faz mais uma tentativa que
não sai muito bem, não acerta na baliza.
O pai - Assim não vale a pena, não fazes como
te digo, tens que estar concentrado, (aqui lembrei-me do Futre, um homem
concentradíssimo e, certamente por isso, um grande jogador).
O filho - Mas eu dei com esta parte.
O pai - És parvo, se tivesses dado com essa
parte a bola tinha ido para a baliza. Faz outra vez.
O miúdo com um ar completamente sofredor executa
o que em futebolês se chama o gesto técnico e a bola teimosamente voltou a não
sair na direcção desejada.
O pai - Pareces burro, se queres ser jogador
de futebol, tens que te aplicar, pensas que o Cristiano Ronaldo não
treinou, (Será que o miúdo quer mesmo? Será o pai que quer viver um sonho
que foi dele e que agora cobra no filho? Será que vê ali um abono familiar?).
O miúdo, desesperado, sentou-se no chão com ar de
quem espera o fim do jogo.
O pai, irritado, mandou a bola para longe com um
forte pontapé.
O escriba pensou que se o árbitro tivesse visto,
o pai merecia um cartão.
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