A imprensa de hoje retoma uma matéria das que
maior embaraço pode causar em sociedades actuais, a escravatura, algo de
improvável no séc. XXI em países da Europa Ocidental.
Aborda-se mais um caso de uma família que escravizava
cidadãos em condições pessoais de grande fragilidade e vulnerabilidade. Estas
pessoas era usadas em trabalho agrícola e "biscates" em Portugal e
Espanha em circunstâncias particularmente duras.
É recorrente a divulgação da situação de
trabalhadores portugueses explorados como escravos em trabalho agrícola
realizado em Espanha mas importa, no entanto, sublinhar que casos de
escravatura são também promovidos por "redes mafiosas" que contratam
trabalhadores portugueses para trabalho no estrangeiro onde são sujeitos a
condições de trabalho que configuram escravatura. Numa altura e que, por razões
óbvias aumentam os fluxos de emigração esta questão é importante. São
conhecidas situações em França, Alemanha ou Inglaterra.
A escravatura parece algo “fora do tempo” e de
impossível existência nos nossos países. Mas existe e é sério o problema que,
como não podia deixar de ser, atinge os mais vulneráveis.
Este negócio, o tráfico de pessoas, um dos mais
florescentes e rentáveis em termos mundiais, alimenta-se da vulnerabilidade
social, da pobreza e da exclusão o que, como sempre, recoloca a imperiosa
necessidade de repensar modelos de desenvolvimento económico que promovam, de
facto, o combate à pobreza e, caso evidente em Portugal, às escandalosas
assimetrias na distribuição da riqueza.
Numa altura em que está na agenda a
flexibilização das leis do trabalho, incluindo a dispensa da “justa causa” como
razão de despedimento, a competitividade, a pressão sobre a produtividade e o
deus mercado que não tem alma, não tem ética e é amoral podem alimentar algumas
formas de escravatura mais "leves" ou, sobretudo em casos de
particular fragilidade dos envolvidos, bastante pesadas.
As pessoas, muitas pessoas, apenas possuem como
bem, a sua própria pessoa e o mercado aproveita tudo, por isso, compra e vende
as pessoas dando-lhe a utilidade que as circunstâncias, a idade, e as
necessidades de "consumo" exigirem.
O que parece ainda mais inquietante é o manto de
silêncio e negligência que frequentemente cai sobre este drama tornando
transparentes as situações de escravatura, não as vemos. Neste universo não
conseguimos ouvir o coro dos escravos, não têm voz.
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