quarta-feira, 5 de setembro de 2012

O SILÊNCIO DO CORO DOS ESCRAVOS

A imprensa de hoje retoma uma matéria das que maior embaraço pode causar em sociedades actuais, a escravatura, algo de improvável no séc. XXI em países da Europa Ocidental.
Aborda-se mais um caso de uma família que escravizava cidadãos em condições pessoais de grande fragilidade e vulnerabilidade. Estas pessoas era usadas em trabalho agrícola e "biscates" em Portugal e Espanha em circunstâncias particularmente duras.
É recorrente a divulgação da situação de trabalhadores portugueses explorados como escravos em trabalho agrícola realizado em Espanha mas importa, no entanto, sublinhar que casos de escravatura são também promovidos por "redes mafiosas" que contratam trabalhadores portugueses para trabalho no estrangeiro onde são sujeitos a condições de trabalho que configuram escravatura. Numa altura e que, por razões óbvias aumentam os fluxos de emigração esta questão é importante. São conhecidas situações em França, Alemanha ou Inglaterra.
A escravatura parece algo “fora do tempo” e de impossível existência nos nossos países. Mas existe e é sério o problema que, como não podia deixar de ser, atinge os mais vulneráveis.
Este negócio, o tráfico de pessoas, um dos mais florescentes e rentáveis em termos mundiais, alimenta-se da vulnerabilidade social, da pobreza e da exclusão o que, como sempre, recoloca a imperiosa necessidade de repensar modelos de desenvolvimento económico que promovam, de facto, o combate à pobreza e, caso evidente em Portugal, às escandalosas assimetrias na distribuição da riqueza.
Numa altura em que está na agenda a flexibilização das leis do trabalho, incluindo a dispensa da “justa causa” como razão de despedimento, a competitividade, a pressão sobre a produtividade e o deus mercado que não tem alma, não tem ética e é amoral podem alimentar algumas formas de escravatura mais "leves" ou, sobretudo em casos de particular fragilidade dos envolvidos, bastante pesadas.
As pessoas, muitas pessoas, apenas possuem como bem, a sua própria pessoa e o mercado aproveita tudo, por isso, compra e vende as pessoas dando-lhe a utilidade que as circunstâncias, a idade, e as necessidades de "consumo" exigirem.
O que parece ainda mais inquietante é o manto de silêncio e negligência que frequentemente cai sobre este drama tornando transparentes as situações de escravatura, não as vemos. Neste universo não conseguimos ouvir o coro dos escravos, não têm voz. 

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