quinta-feira, 8 de novembro de 2012

CRIANÇAS E JOVENS EM RISCO. A protecção a tempo inteiro

Em acordo hoje estabelecido entre o Ministério da Solidariedade e da Segurança Social e as entidades representativas das instituições de solidariedade social, é definido que no âmbito dos recursos adjudicados aos apoios sociais, sejam privilegiadas as estruturas que procuram responder aos problemas de crianças e jovens, designadamente em situações de risco.
Há algum tempo, o Secretário de Estado da Solidariedade e Segurança Social tinha anunciado o aumento das vagas nas instituições destinadas ao acolhimento de crianças e jovens em risco. minimizando os riscos da sobrelotação e falta de resposta, sendo que também os técnicos que integram as Comissões de Protecção de Crianças e Jovens a meio tempo, situação insustentável e ineficaz, passariam ao regime de tempo inteiro e seriam ainda mobilizados cerca de 300 técnicos para apoio pedagógico nas instituições.
À partida parece uma boa notícia se, obviamente, tudo se confirmar. O Relatório de Actividade, relativo a 2011, das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens mostrava, sinteticamente, um ligeiro abaixamento do número de casos acompanhados pelas Comissões, o facto de a negligência ser a situação mais frequente, o aumento do número de crianças retiradas às famílias e ainda que as escolas continuam a ser a entidade que mais reporta casos de risco.
No entanto e por outro lado, também em 2011, a Linha Criança, existente na Provedoria de Justiça recebeu um total de 740 chamadas sendo 178 relativas a maus tratos e negligência. Também a linha SOS Criança, a funcionar no âmbito do Instituto de Apoio à Criança, procedeu em 2011 ao encaminhamento de 760 crianças em risco, mais 35% do que no ano anterior, com um registo de 565 casos.
Todos estes indicadores talvez possam sugerir que a comunidade estará menos tolerante a eventuais maus tratos aos miúdos o que leva, naturalmente, ao aumento das queixas e ao seu encaminhamento.
Importa ainda não esquecer que as circunstâncias de vida menos positivas pelas quais as pessoas e as famílias passam têm um reflexo fortíssimo na vida dos miúdos e no seu crescimento saudável em todas as dimensões. Aliás, os estudos e os dados mostram que os mais novos e os mais velhos são justamente os grupos etários mais vulneráveis aos risco da pobreza.
Na verdade, cada criança que nasce, e nascem cada vez menos, deveria levar a comunidade a estabelecer com essa criança um contrato ético através do qual a comunidade se obriga a providenciar cuidados e educação de qualidade nos diferentes contextos de vida das crianças, designadamente na família e na escola. Na terminologia em inglês pode utilizar-se uma síntese significativa e curiosa, "educare", envolvendo "education" e "care".
A comunidade, nós, nos diferentes patamares em que funcionamos e decidimos, não podemos falhar no cumprimento deste contrato ético. Este cumprimento passa também pela disponibilização dos recursos adequados às instituições que operam neste universo cumprindo, espera-se que o melhor possível, o papel que as famílias, por ausência, negligência e incompetência ou impotência não cumprem. Não deve, no entanto, fomentar-se modelos assistencialistas que para além de servirem poderes outros, podem correr o risco de alimentar ou manter as próprias situações para as quais deveriam ser a solução, numa adaptação do princípio de Shirky.
No fundo, como diz o cancioneiro e dirá cada criança, eu só quero o que me é devido, por me trazerem aqui, eu nem sequer fui ouvido, no acto de que nasci.

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