O trabalho que o Público de hoje divulga sobre o
universo do casamento, dos divórcios e, em termos gerais da conjugalidade,
comporta um conjunto de dados interessantes indiciando mudanças significativas
nesta área, algumas das quais com uma provável ligação com a situação grave que
atravessamos, como é o caso de pessoas que apesar de separarem, continuam a partilhar
a mesma casa por razões económicas. De facto, a família e as suas dinâmicas de
constituição, organização, constituição e funcionamento têm sido
recorrentemente objecto de referência, acentuando sobretudo os processos de
mudança envolvidos.
No entanto, do meu ponto de vista, quase sempre
me parece que as diferentes abordagens não valorizam, por vezes nem referem, um
aspecto que me parece extraordinariamente relevante e que considero dos mais
complexos desafios sociais que actualmente enfrentamos, a educação familiar, ou
seja, o que é, o que deve ser, como deve ser a educação familiar em contextos
altamente diferenciados e em mudanças permanentes.
De facto, as enormes alterações que temos vindo a
constatar no universo das famílias implicam uma séria reflexão sobre as suas
implicações na educação familiar. O paradigma clássico, a família educativa e a
escola instrutiva, mudou substantivamente o que não significa, obviamente, a
alienação do papel educativo da família, mas sim atentar nas novas qualidades
que esse papel vai assumindo, parafraseando Camões.
Desde logo porque, por questões de logística e
funcionalidade, o tempo familiar para as crianças encolheu de forma dramática,
os miúdos passam tempos infindos na escola sob um princípio a que até o ME se
lembrou de chamar de forma infeliz “Escola a tempo inteiro”. As famílias
expressam uma enorme dificuldade em compatibilizar o que ainda entendem ser o
seu papel educativo com a pressa e o pouco tempo que assumem ter para o
realizar. Tenho conhecido dezenas de pais que se sentem culpados e fragilizados
por entenderem que não têm para os filhos a disponibilidade de tempo e atitude
que julgam necessária. Esta culpa e fragilidade é, com frequência, a base
inconsciente que impede alguns pais de serem consistentes e firmes na definição
de regras e limites imprescindíveis às crianças, pois “temem estragar” o pouco
tempo que têm com elas devido a um eventual conflito.
Uma outra questão prende-se com o modo e a
dificuldade que muitos pais me referem sentir quando lidam com as crianças em
situação de “duas famílias”. Mais uma vez, as inseguranças e algum sentimento
de culpa estão presentes e contribuem para embaraços que levam os pais a pedir
alguma ajuda. Como sempre digo, é preferível uma boa separação a uma má
família, mas alguns pais sentem-se inseguros para construir cenários de
educação familiar com qualidade quando têm a guarda das crianças repartida.
Na situação hoje mais sublinhada no trabalho do
jornal, as pessoas que se separam mas continuam a partilhar a mesma casa,
colocam-se, por vezes e quando existem filhos, algumas ansiedades e
inquietações nos pais sobre a forma de lidar com um contexto em que
aparentemente existe uma família, quando na verdade já são duas com uma criança
entre elas.
A experiência mostra, como referi acima, que a
educação familiar se constitui como uma área extremamente complexa, não existem
dois contextos familiares iguais sendo que, para além de tudo, se trata de um
universo extremamente sensível a valores e convicções.
Assim sendo, importa estarmos atentos e procurar
disponibilizar apoios e orientações nas situações em que os pais revelam e
exprimem mais insegurança e dificuldades. Estas situações são bem mais
frequentes do que julgamos ser.
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