Ao encontro do texto de opinião do Professor
Mário Cordeiro, hoje no Público, sobre a estimulante e complexa questão do eventual
direito de voto de crianças e adolescentes, deixo-vos um Manifesto de cidadãos
em idade escolar.
Companheiros e companheiras em idade escolar,
Muitos de vós já terão notado que se celebra em
quase todo o mundo o dia 1 de Maio como o Dia do Trabalhador. No entanto,
talvez poucos saibam que o dia 1 de Maio foi escolhido para homenagear os
trabalhadores de Chicago, nos Estados Unidos, que em 1886 começaram a
reivindicar que o dia de trabalho tivesse apenas oito horas o que veio a ser aceite
e passou a verificar-se em muitos países.
Mas não para nós, companheiros e companheiras em
idade escolar. Nós que andamos nas escolas temos cargas horárias que podem ir
até às onze horas por dia, se juntarmos as horas no Atelier de Tempos Livres,
as horas curriculares, as actividades de enriquecimento curricular e a componente
de apoio à família. Não podemos aceitar esta situação. Dizem os adultos que,
fora da escola, não há quem tome conta de nós quando estão a trabalhar. Mudem a
organização do trabalho e a gestão dos horários deles. Não sendo nossa a
responsabilidade pela situação profissional dos adultos, não temos que sofrer
nós as consequências. Muitos de nós, companheiros e companheiras, acabamos por
estabelecer péssimas relações com os nossos locais de trabalho, as escolas, com
tanto tempo lá vivido.
Além disso, quando chegamos a casa já quase não
temos tempo e disponibilidade para a vida familiar, para a relação, para a
brincadeira, como os nossos pais e irmãos que, como sabem é fundamental para a
qualidade de vida dos seres humanos. É também isto que faz parte do estado
social de que os adultos tanto falam a pensar sobretudo nos problemas deles que
sendo importantes não devem fazer esquecer os nossos.
Os adultos lutaram por mudanças na natureza do
trabalho, com preocupações de ergonomia e criatividade nas tarefas. E nós? O
equipamento é, frequentemente, de má qualidade, tarefas muitas vezes
repetitivas geridas por profissionais com formação inadequada, horas e horas
sentados em mobiliário desconfortável. Ninguém pensa no risco de desenvolvermos
doenças profissionais e nas consequências ao nível da motivação para progredirmos
nas nossas carreiras. Os adultos sempre cuidaram primeiro de si e dos seus
direitos e só depois, de nós e dos nossos direitos. Não existem estruturas
representativas dos nossos interesses e nossa voz é pouco ouvida, por isso,
muitos de nós tanto gritam. Se já tivéssemos a capacidade de votar talvez nos
prestassem mais atenção, mas temos que ser exigentes.
É chegada a hora de nos ouvirem. Assim,
proclamamos:
“As
crianças e jovens em idade escolar exigem que lhes seja reconhecido e
estabelecido o direito a que o seu dia de trabalho não ultrapasse as sete
horas, como já acontece para muitos adultos”.
2 comentários:
Repetindo o meu comentário ao artigo do Público:
As democracias visam representar o povo no exercício do poder político. Esta representação vem sendo ampliada a mais grupos sociais ao longo do tempo, através do direito ao voto, pelo que é apenas uma questão de “quando” o voto será alargado às crianças e não “se” tal vai acontecer. A Convenção sobre os Direitos das Crianças prevê um rol de direitos de participação que ignoram o voto. Porém o direito ao voto não constituirá uma efetiva participação política pelas crianças nos assuntos que lhes dizem diretamente respeito, se não se contemplarem outras formas de participação cívica que auscultem e considerem a pertinência das suas opiniões e que constituam modos efetivos de representação política, algo que estão hoje totalmente habilitadas para fazer, sejam-lhes dados meios para tal.
De acordo, aliás, se atentarmos exclusivamente no voto como critério de partipação cívica, veja-se os níveis altíssimos e crescentes de abstenção ...
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