As entidades que em nome dos mercados se
apoderaram dos nossos destinos e que nos transformaram numa feitoria
administrada por uns feitores obedientes e sem mandato para tal, insistem no
nosso empobrecimento.
Com a cumplicidade e fidelidade canina que
embaraçam, os feitores e os donos dos destinos concebem mais uma etapa num
caminho já anunciado, despedir gente, muita gente, sobretudo em áreas nucleares do chamado
estado social, a educação e a saúde, cortar nos apoios sociais e nos salários.
Tudo isto deve decorrer sem sobressalto até à solução final.
Pelo meio, falam no combate a algumas mordomias
que todos reconhecemos existirem sem justificação, mas que no
contexto do relatório agora conhecido, não passam de uma hipócrita manobra de diversão.
Não consigo entender, no devastador cenário já
existente, releva o aumento brutal de situações de pobreza, bem acima das
estatísticas oficiais, o aumento fortíssimo do desemprego e do número de
pessoas desempregadas sem subsídio de desemprego, o abaixamento dos apoios
sociais, a pobreza a afectar crianças e idosos, sempre os grupos mais
vulneráveis, a manutenção de simetrias gritantes na distribuição da riqueza,
enfim, um inferno para milhões de portugueses.
Este é o resultado de uma persistência cega e
surda no “custe o que custar", no cumprimento dos objectivos do negócio
com a troika e dos objectivos de uma política "over troika",
atingindo claramente o limite do suportável e afectando gravemente as condições
de vida de milhões. Estamos a falar de pessoas, não de políticas, ou melhor
estamos a falar do efeito das políticas na vida das pessoas.
Creio que já ninguém consegue sustentar que este
trajecto nos possa levar a bom porto, está à vista o quanto é insustentável a
insistência neste caminho e no apregoar de que existe equidade na repartição
dos sacrifícios, entendimento que, creio, ninguém na sociedade portuguesa
consegue honestamente sustentar.
Na verdade, o caminho decidido, por escolha de
quem o faz, é bom registar que existem alternativas, está a aumentar
assimetrias sociais e obviamente a produzir mais exclusão e pobreza mas,
insisto, mais preocupante é a insensibilidade da persistência neste caminho.
Os protestos decorrentes da pobreza, do
desemprego, da desesperança e da indignação prenunciam uma instabilidade que é
resultante deste caminho. Para cada vez mais gente, o abismo está mais perto,
não está mais longe, como Passos Coelho sustentava há algum tempo.
Contrariamente ao que nos querem fazer acreditar
a maioria das famílias portuguesas não viviam ou vivem acima das suas
possibilidades, mas cada vez mais famílias estão a viver abaixo das suas
necessidades, pobres, sem apoio e em risco de exclusão. Os sucessivos Governos,
desta e de outras terras, é que subscreveram políticas públicas que assentes em
modelos económicos sem alma nem ética produziram o inferno em que vivemos, não
foram as famílias, na sua maioria que o produziram.
Com este terramoto social e económico ainda
insistem em que temos de empobrecer, expressão que indigna até à raiva, e
apresentam novas propostas que não passam de um terrorista. NÓS JÁ ESTAMOS POBRES, NÃO PODEMOS
FICAR MAIS POBRES, entendam isto de uma vez por todas.
Nós não precisamos de empobrecer, falar de
empobrecer é insulto e terrorismo social como já afirmei. Nós precisamos de
combater a assimetria da distribuição da riqueza e produzir mais riqueza,
precisamos de combater mordomias e desperdício de recursos e meios ineficientes
e muitas vezes injustificados que alimentam clientelas e interesses outros. Nós
precisamos de combater a teia de protecção legal e política aos interesses dos
mercados e dos seus empregados que conflituam com os interesses das pessoas.
Nós não precisamos de empobrecer, nós já somos um
dos países mais pobres e assimétricos da Europa com perto de um terço da sua
população pobre ou em risco de pobreza, com miúdos a chegar às escolas com
fome, com gente sem trabalho e sem apoio social.
O que precisamos é de coragem e visão sem
subserviência ao ditado dos mercados e dos seus agentes para definir modelos
económicos, sociais e políticos destinados a pessoas e não a mercados ou a
grupos minoritários de interesses mesmo que mascarados em malditos planos de
"ajustamento", de "resgate" ou ainda e de forma ofensiva de
"ajuda".
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