É a segunda vez em poucos dias que no Público se
reflecte sobre o acesso ao voto por parte de crianças e adolescentes. Primeiro
surgiu um texto interessante do Professor Mário Cordeiro e hoje surge um
trabalho jornalístico sobre a mesma questão, embora mais centrado na
possibilidade do voto aos 16 anos.
A questão não está na agenda politica, mas justifica a abordagem. Na verdade, em Portugal e aos 16 anos, as pessoas
têm a possibilidade legal de casar, trabalhar ou serem responsabilizados
criminalmente. Porque não a acessibilidade ao voto?
Dizem alguns que estes adolescentes não terão
maturidade para o uso "responsável" do voto. Provavelmente, algumas
das pessoas que entendem que as pessoas com 16 anos não têm maturidade, ficarão
indiferentes ao espectáculo indecorosos de "manipulação" e
"compra" dos votos a que assistimos em todos as campanhas eleitorais,
que envolvem desde as ofertas, os passeios, as promessas que não se vão
cumprir, até às recompensas com lugares aos mais empenhados e melhor colocados
nos aparelhos. Parece-me fraco o argumento se considerarmos o que socialmente e
pessoalmente as pessoas com 16 anos são capazes e como tal consideradas pela
comunidade e pela lei, relembro casar e trabalhar, por exemplo.
O voto sem restrições a partir dos 16 anos
apenas se verifica na Áustria,
registando-se menor abstenção que no escalão 18-20 anos, o que sugere o interesse dos
mais jovens pela participação cívica.
Do meu ponto de vista esta é a questão central, a
participação cívica. O modelo e cultura política instalados há décadas na nossa
comunidade, a partidocracia, fomentam, explicita ou implicitamente, o
afastamento de grande parte dos cidadãos da participação cívica activa pois,
basicamente, ela corre por dentro ou sob tutela dos aparelhos partidários. Aliás
os níveis crescentes e muito altos da abstenção em sucessivas eleições espelham
isso mesmo.
Tal cenário alimenta um significativo e
comprovado desinteresse dos jovens, mas não só, pela coisa pública e pelo
envolvimento activo. A participação dos jovens na coisa política é conformada,
quase que exclusivamente, às juventudes partidárias, que servem, com excessiva
frequência de trampolim para os lugares políticos, Passos Coelho e António José
Seguro, são dois actuais e excelentes exemplos desta carreira.
Por outro lado, esse desinteresse pela
participação cívica, alinhada nos aparelhos, alia-se a um outro entendimento de
consequências extremamente importantes, a falta de esperança e confiança em que
as coisas possam tornar-se diferentes, ou seja, isto não muda, não adianta.
Neste cenário, parece-me, por um lado, que o voto
aos 16 anos é sustentável pelas características e competências das pessoas
nesta idade e por aquilo de que já são responsáveis e autónomos. Por outro
lado, talvez o alargamento do voto possa ser um contributo para o
rejuvenescimento e melhoria da saúde da nossa democracia minimizando as
consequências da captura pela partidocracia da participação cívica dos
cidadãos.
Gente mais nova, pode trazer comportamentos
e ideias mais novas.
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