Já se torna difícil descrever a situação gravíssima que o
país atravessa, sobretudo, os níveis de desemprego, pobreza e desesperança.
Neste quadro, causam-me sempre um enorme embaraço os
discursos produzidos por muitas figuras nacionais e internacionais com
fortíssimas responsabilidades na situação que vivemos.
Um bom exemplo disto é a entrevista de Christine Lagarde,
directora do FMI, ao Expresso.
Ao longo da entrevista, uma das responsáveis pelo programa
de “ajustamento” que transformou Portugal numa feitoria administrada em nome
dos mercados, referiu a “coragem dos portugueses”, a enorme “determinação
colectiva” ou “a execução do programa está a correr bem”.
Na verdade, quase milhão e meio de desempregados são
corajosos e determinados, perto de 3 milhões de portugueses em risco de pobreza
sentem a execução do programa a correr bem. Miúdos com fome nas escolas
exemplificam a determinação e coragem exigidas pelos sacrifícios, etc., etc.
Este tipo de afirmações cola-se aos famosos e nacionais “ai
aguenta, aguenta” de Fernando Ulrich, ao “melhor povo do mundo” de Vítor
Gaspar, ao “nada me pesa na consciência” de Miguel Relvas, ou a mítica
referência de Cavaco Silva à insuficiência das suas reformas.
Eu sei que discursos como o que estou a escrever conterão
sempre alguma ponta de demagogia mas, o despudor e a ligeireza com que esta
gente abre a boca, fere a sensibilidade e solidariedade devida a gente que está
a passar mal, muito mal, em nome, dizem, de um futuro que muitos não terão nem
vislumbram.
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