Os professores manifestam-se hoje contra alguns
aspectos da PEC- Política Educativa em Curso. Do meu ponto de vista, alguns dos
motivos que estão na base do protesto, para além das consequências na questão
profissional dos docentes, são preocupantes numa perspectiva mais alargada da
qualidade da educação e de defesa da escola pública de qualidade. Algumas notas
sobre a profissão docente, a sua importância e a forma como muitas vezes são
olhados.
Um estudo desenvolvido pelo ISEG-UTL conclui que
as variáveis exteriores à escola, (nível de escolaridade dos pais, por exemplo)
explicam apenas 30% do sucesso dos alunos no ensino secundário, ou seja, 70% é
explicada pelo trabalho das escolas, dos professores. Numa conferência
realizada em Lisboa, o Professor Erik Hanushek sublinhou o factor
"qualidade do trabalho do professor" como a chave do sucesso na
educação, mesmo no sentido de contrariar desigualdades sociais de origem nos
alunos. Cito com frequência uma afirmação de 2000 do Council for Exceptional
Children, "o factor individual mais contributivo para a qualidade da
educação é a existência de um professor qualificado e empenhado".
Neste quadro, parece-me sempre importante
sublinhar algo que de tão óbvio por vezes se esquece, a importância essencial e
a responsabilidade que o trabalho dos professores assume na construção do
futuro. Tudo passa pela escola e pela educação. Assim sendo, as mudanças na
educação só podem ocorrer e ser bem sucedidas com o envolvimento dos
professores.
Alguns dos discursos que de forma ligeira e
muitas vezes ignorante ocupam tempo de antena na imprensa parecem esquecer a
importância deste trabalho e das circunstâncias em que se desenvolve.
Pensemos no que é ser professor hoje, em algumas
escolas que décadas de incompetência na gestão urbanística e consequente
guetização social produziram.
Pensemos em como os valores, padrões e estilos e
vida das famílias se alteraram fazendo derivar para a escola, para os
professores, parte do papel que compete à família.
Pensemos na forma como milhares de professores
cumprem a sua carreira de poiso, em poiso, sem poiso e sem condições de pensar
num projecto de vida familiar com estabilidade. E não nos esqueçamos também da
imprescindível necessidade de que o seu trabalho seja avaliado através de
dispositivos sólidos, eficazes e justos de forma a proteger a própria classe,
os miúdos e as famílias.
Pensemos nos professores que nos ajudaram a
chegar ao que hoje cada um de nós é, aqueles que carregamos bem guardadinhos na
memória, pelas coisas boas, mas também pelas más, tudo contribuiu para sermos o
que somos.
Pensemos na deriva política a que o universo da
educação tem estado exposto nas últimas décadas, criando instabilidade e ruído
permanente sem que se perceba um rumo, um desígnio que potencie o trabalho de
alunos, pais e professores. Assume especial actualidade, o aumento de alunos
por turma, o corte de recursos, a dispensa de professores obviamente
necessários, etc.
Pensemos em como os professores são injustiçados
na apreciações de muita gente que no minuto a seguir à afirmação de uma
qualquer ignorante barbaridade, vai, numa espécie de exercício sadomasoquista,
entregar os filhos nas mãos daqueles que destrata, depreendendo-se assim que,
ou quer mal aos filhos ou desconhece os professores e os seus problemas.
Pensemos como é imprescindível que a educação e
os problemas dos professores não sejam objecto de luta política baixa e
desrespeitadora dos interesses dos miúdos, mesmo por parte dos que se assumem
como seus representantes.
Pensemos em como a forma como os miúdos, pequenos
e maiores, vêem e se relacionam com os professores está directamente ligada à
forma como os adultos os vêem e os discursos que fazem.
Pensemos, finalmente, como ser professor deve ser
uma das funções mais bonitas do mundo, ver e ajudar os miúdos a ser gente.
Esperemos, pois, pelas mudanças necessárias que
defendam a qualidade da escola e as condições para que o trabalho de
professores, alunos e pais tenha o melhor resultado possível.
2 comentários:
é de dizer ao Herberto Helder que isto é mesmo é sem contemplações.
Obrigada, Zé Morgado!
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