Estarão certamente lembrados da tragédia que
vitimou duas crianças em Alenquer há poucas semanas. Agora um novo drama em
Oeiras com a morte de outras duas crianças e da mãe. Embora em averiguação, o
cenário parece apontar para que a mãe tenha terminado com a vida dos três.
Como na altura escrevi, estas tragédias mostram o
muito que ainda temos de fazer em matéria de protecção a menores em risco.
Ao que parece e tal como em Alenquer, também
estas crianças estavam sinalizadas por parte da Comissão de Protecção de
Crianças e Jovens da área mas os pais recusaram apoios ou intervenção. Dado que
a Comissão não pode intervir sem consentimento, sendo eles eventualmente
responsáveis pelos riscos que as crianças enfrentam, o processo é enviado para
Tribunal e … ficamos à espera. A decisão pode vir em tempo útil a uma
intervenção que de facto proteja os menores ou, como foi o caso, acontece mais
uma tragédia.
De há muito e a propósito de várias questões, que
afirmo que em Portugal, apesar de existirem vários dispositivos de apoio e
protecção às crianças e jovens e de existir legislação no mesmo sentido, sempre
assente no incontornável “supremo interesse da criança, não existe o que me
parece mais importante, uma cultura sólida de protecção das crianças e jovens.
Poderíamos citar a insuficiência e falta de formação de juízes que se verifica
nos tribunais de Família, as frequentemente incompreensíveis decisões em casos
de regulação do poder parental, etc.
Temos também em funcionamento as Comissões de
Protecção de Crianças e Jovens que procuram fazer um trabalho eficaz mas em
difíceis circunstâncias, para além da falta de agilidade processual na
articulação das múltiplas entidades envolvidas como também é frequente entre
nós e terá acontecido nestas duas situações dramáticas.
É verdade que existem situações que se desenvolvem,
por vezes, de forma extremamente rápida e imprevisível, em ambos os casos
parece existir nas mães alguma perturbação do foro da saúde mental o que torna
tudo ainda mais difícil, mas também exige maior celeridade e atenção.
No entanto, boa parte das Comissões têm
responsabilidades sobre um número de situações de risco ou comprovadas que
transcendem a sua capacidade de resposta. A parte mais operacional das
Comissões, a designada Comissão restrita, tem muitos técnicos a tempo parcial.
Tal dificuldade repercute-se, como é óbvio, na eficácia e qualidade do trabalho
desenvolvido, independentemente do esforço e empenho dos profissionais que as
integram.
Este cenário permite que ocorram situações,
frequentemente com contornos dramáticos, envolvendo crianças e jovens que,
sendo conhecida a sua condição de vulnerabilidade não tinham, ou não tiveram, o
apoio e os procedimentos necessários. Ouve-se então uma das expressões que me
deixam mais incomodado, a criança estava “sinalizada” ou “referenciada” o que
foi insuficiente para a adequada intervenção. Em Portugal sinalizamos e
referenciamos com relativa facilidade, a grande dificuldade é minimizar ou
resolver os problemas referenciados ou sinalizados.
Por isso, sendo importante registar a menor
tolerância da comunidade aos maus tratos aos miúdos, também será importância
que desenvolva a sua intolerância face à ausência de respostas e surgimento de
tragédias como a de Alenquer ou agora a de Oeiras.
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