Na sequência de queixas da Associação Nacional dos Professores
Contratados e de queixas por iniciativa individual
de professores, a que o Provedor de
Justiça também deu acolhimento, a Comissão Europeia produziu um ultimato ao
Governo português no sentido de comunicar num prazo de dois meses as
iniciativas de revisão das condições laborais dos professores contratados em
escolas públicas. O não cumprimento implicará o envio do problema para o
Tribunal de Justiça da UE.
A questão é velha e envolve o tratamento considerado
discriminatório de largos milhares de professores em diferentes matérias e que
exercem a mesma função bem como o abuso inaceitável da situação de precariedade
criando a vergonhosa condição de "descartável", qualquer coisa como
mais de 37 000 professores contratados com mais de quatro anos de tempo de
serviço, cerca de 11 000 com mais de dez
anos e cerca de 1000 com mais de 18 anos de serviço, repito, 18 anos de serviço,
avaliado de dizer-se, e a exercer funções que, obviamente, correspondiam a
necessidades permanentes do sistema.
Entretanto, o MEC criou cerca de 600 vagas que transformaram
alguns, poucos, dos "descartáveis" em recicláveis, ou seja, 98% dos
docentes que reuniam condições face à lei, mantiveram-se "descartáveis" e
muitos vão sendo "descartados". como é sabido.
Para essas 600 vagas apresentaram-se a concurso cerca de 23
000 candidatos, pessoas que, de acordo com os requisitos, são “docentes com
exercício efectivo de funções docentes com qualificação profissional, em pelo
menos 365 dias, nos três anos lectivos imediatamente anteriores ao da data de
apresentação do concurso” e com “avaliação de desempenho com menção qualitativa
não inferior a ‘Bom’ naquele período”, ou seja, não são pessoas que se
candidatam a um primeiro emprego de professor mas profissionais com vários anos
de serviço que não obtendo colocação ficam, de facto, despedidos.
Na altura, o MEC sustentou o número de vagas
definido com “a actual conjuntura económica e financeira” pelo que promove “a
empregabilidade possível”, sendo que as “vagas colocadas a concurso foram
definidas em função das necessidades reais e futuras do sistema”.
Como já tenho referido, parece-me claro que a
questão do número de professores necessário ao funcionamento do sistema é uma
matéria bastante complexa que, por isso mesmo, exige serenidade, seriedade,
rigor e competência na sua análise e gestão, exactamente tudo o que tem faltado
neste já longo processo, incluindo a alguns discursos de representantes dos
professores.
Para além da questão da demografia escolar que,
aliás, o MEC tratou de forma incompetente e demagógica, importa não esquecer
que existem muitos professores deslocados de funções docentes, boa parte em
funções técnicas e administrativas que em muitos casos seriam dispensáveis pois
fazem parte de estruturas do Ministério pesadas, burocráticas e ineficazes que,
aliás, o ministro Nuno Crato achou que deveriam implodir. Para já, o risco de
implosão ameaça muito mais seriamente a escola pública que o Ministério.
Por outro lado, os modelos de organização e
funcionamento das escolas, com uma série infindável de estruturas intermédias e
com um excesso insuportável de burocratização, retiram muitas horas docentes ao
trabalho dos professores.
No entanto e do meu ponto de vista, o “excesso”
de professores no sistema e sem trabalho deve ser também analisado à luz das
medidas da PEC – Política Educativa em Curso. Vejamos alguns exemplos.
Em primeiro lugar, a mudança no número de
professores necessário decorre do aumento do número de alunos por turma que,
conjugado com a constituição de mega-agrupamentos e agrupamentos leva que em
muitas escolas as turmas funcionem com o número máximo de alunos permitido, ou
mesmo acima, com as evidentes implicações negativas que daí decorrem.
As mudanças curriculares com a eliminação das
áreas não curriculares que, carecendo de alterações registe-se, também produzem
um desejado e significativo “corte” no número de professores, a que acrescem
outras alterações no mesmo sentido.
O Ministro “esquece-se” sempre, obviamente,
destes “pormenores”, apenas se refere à demografia, em termos errados e
habilidosos, e aos recursos disponíveis para, afirma, definir as necessidades
do sistema, processo obviamente incompetente.
Este conjunto de medidas, além de outras, virão a
revelar-se, gostava de me enganar, muito mais caras do que aquilo que o MEC
poupará na diminuição do número de docentes que ficarão no desemprego, muitos
deles tendo servido o sistema durante anos.
Ficarão sem trabalhar, não porque sejam
incompetentes, a maioria não o é, não porque não sejam necessários, a maioria
é, mas “apenas” porque é preciso cortar, cortar, custe o que custar.
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