Uma das expressões que frequentemente
se ouve nos contextos escolares a propósito das diferenças entre os alunos é,
"está a perder o comboio" significando com isso a dificuldade que
algum aluno possa estar a sentir em acompanhar o ritmo de trabalho e
aprendizagem da turma. Para muito alunos esta afirmação e o que dela decorre é o
primeiro e pequenino passo em direcção ao insucesso, eventual abandono e
consequente exclusão.
Na verdade, todos sabemos das
diferenças entre os alunos e das dificuldades em acomodar essas diferenças nas
salas de aula. Estas diferenças associam-se, obviamente, às características
individuais mas de forma extremamente relevante também aos seus contextos familiares, económicos, sociais
e culturais como, aliás, os resultados escolares agora tratados de diferente
forma para a construção dos incontornáveis rankings mostram com toda a clareza.
Nesta perspectiva, um dos grandes
objectivos da educação de qualidade é justamente criar respostas que acomodem
tanto quanto possível as diferenças entre os alunos o que passa pela definição
de dispositivos de apoio a professores, alunos e pais e por políticas
educativas que promovam autonomia das escolas, capacidade de diferenciação educativa
e assentes num inalienável princípio de equidade e inclusão face à diversidade.
Acontece que boa parte da PEC -
Política Educativa em Curso que temos vindo a sofrer é ela própria e cada vez mais
claramente alimentadora das difernças e desigualdades e co-responsável pela perda do comboio por parte de muitos alunos, ou seja, é mais parte do problema que da solução.
Gestão curricular burocratizada
numas insustentáveis (da forma como estão definidas) metas curriculares, crença
mágica nos exames, na medida, no produto, na normalização como fonte da
qualidade, cortes dramáticos nos recursos, docentes e funcionários, cortes nos
professores de educação especial, aumento delinquente do número de alunos por
turma com desrespeito dos normativos e dos direitos dos miúdos, caso de alunos
com nee, atalhos desqualificados e promotores de desigualdade para alunos com insucesso,
são apenas exemplos de medidas que empurram alunos para fora do comboio, por
assim dizer.
Acresce ainda a cada vez mais
clara intenção de apoiar fortemente uma espécie de comboio para executivos
assegurado fundamentalmente pelos estabelecimentos de ensino privado e por meia
dúzia de escolas públicas que consigam resistir a este vendaval que se abate
sobre o sistema de ensino publico e que irá transportar para o futuro e em
excelentes condições de conforto e segurança algumas, apenas algumas, das
crianças.
Talvez valha pena reflectir que não
só os alunos, muitos alunos, que correm o risco de perder o comboio, somos todos,
quase todos evidentemente.
2 comentários:
Não falta aqui uma palavra? "Diferenças", será?
«Acontece que boa parte da PEC - Política Educativa em Curso que temos vindo a sofrer é ela própria e cada vez mais claramente alimentadora das ?????? e co-responsável pela perda do comboio por parte de muitos alunos, ou seja, é mais parte do problema que da solução.»
Mais uma excelente análise. Infelizmente! (por ser real)
Olá Ana, obrigado pela correcção.
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