O Observatório de Mulheres
Assassinadas, da União de Mulheres Alternativa e Resposta, registou 33
homicídios consumados e 32 tentados desde o início do ano, mais de três
mulheres assassinadas por mês sendo recorrente a referência na imprensa a
episódios desta natureza, felizmente nem sempre com a tragédia da morte e sendo
apenas a ponta do icebergue, muitas situações de violência doméstica não são
denunciadas e conhecidas.
Relembro que no âmbito do período experimental de
um novo modelo de avaliação de risco desenvolvido por uma equipa da
Direcção-geral da Administração Interna, entre 15 de Novembro e 31 de Dezembro
passado registaram-se nos distritos de Lisboa e Porto mais de 800 denúncias à
PSP e à GNR de casos de violência doméstica.
Tal volume de ocorrências e ainda o facto
conhecido de que nem todos os episódios são denunciados obriga, de facto, a
medidas proactivas de combate a este tipo de situações.
Recordo ainda que no âmbito do Dia Internacional
para a Eliminação de Todas as Formas de Violência Contra as Mulheres em
Novembro no ano passado, se sublinhava os efeitos que os episódios de violência
doméstica podem ter nos filhos, pois cerca de 41.5% das situações reportadas
ocorrem na presença dos miúdos, com consequências negativas óbvias e que apenas
acentuam a necessidade de se minimizar ou eliminar este tipo de ocorrências.
Deste universo releva, como disse, um número de
situações muito significativo que muitas vezes não é reportado, pois alguns
estudos mostram a desconfiança que as vítimas sentem sobre a eficácia a
justiça.
Na verdade, os últimos números que conheço, 2011,
referem que do total de inquéritos instaurados, 83 % acabam arquivados, apenas
15 % chegam a julgamento que, com frequência, terminam com condenações. Quando
se verificam condenações a maioria, 82 %, é com pena suspensa, veja-se que de
58 sentenças em processos-crime por violência doméstica relatadas à DGAI no
primeiro trimestre de 2011, 52 por cento foram absolvições e 48 por cento
condenações. Das condenações, apenas 6% merecem pena de prisão efectiva.
Por diferentes ordens de razões e embora a
realidade se vá modificando lentamente, refira-se o aumento de denúncias por
parte dos homens, parece assumir-se ainda uma espécie de fatalidade face à
tolerância do crime de violência doméstica dirigida às mulheres, mas não só,
provavelmente. Esta tolerância relativiza-se à dificuldade de prova, ao sistema
de valores e situação de dependência emocional e económica de muitas das
vítimas, à atitude conservadora de alguns juízes, etc. Permanece ainda com
alguma frequência a dificuldade de promover a retirada do agressor do ambiente
doméstico, procedendo-se à saída da vítima numa espécie de dupla violência que,
aliás, também se verifica em situações de maus tratos a crianças, em que o
agressor fica em casa e a criança é “expulsa”.
Importa ainda combater de forma mais eficaz o
sentimento de impunidade instalado e ainda, como referi, alguma “resignação” ou
“tolerância” das vítimas face à percepção de eventual vazio de alternativas ou
a uma falsa ideia de protecção dos filhos em caso de separação do agressor.
Nesta perspectiva, torna-se fundamental a existência de dispositivos de
avaliação de risco e de apoio como instituições de acolhimento e, naturalmente,
um sistema de justiça eficaz e célere.
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