segunda-feira, 25 de novembro de 2013

MALTRATAR NÃO É GOSTAR

O calendário das consciências determina para hoje o Dia Internacional para a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra as Mulheres. Apesar da frequência com que me refiro a esta matéria, a sua gravidade justifica o retomar de algumas notas.
O Observatório de Mulheres Assassinadas, da União de Mulheres Alternativa e Resposta, registou 33 homicídios consumados e 32 tentados desde o início do ano, mais de três mulheres assassinadas por mês sendo recorrente a referência na imprensa a episódios desta natureza, felizmente nem sempre com a tragédia da morte e sendo apenas a ponta do icebergue, muitas situações de violência doméstica não são denunciadas e conhecidas.
Relembro que no âmbito do período experimental de um novo modelo de avaliação de risco desenvolvido por uma equipa da Direcção-geral da Administração Interna, entre 15 de Novembro e 31 de Dezembro passado registaram-se nos distritos de Lisboa e Porto mais de 800 denúncias à PSP e à GNR de casos de violência doméstica.
Tal volume de ocorrências e ainda o facto conhecido de que nem todos os episódios são denunciados obriga, de facto, a medidas proactivas de combate a este tipo de situações.
Recordo ainda que no âmbito do Dia Internacional para a Eliminação de Todas as Formas de Violência Contra as Mulheres em Novembro no ano passado, se sublinhava os efeitos que os episódios de violência doméstica podem ter nos filhos, pois cerca de 41.5% das situações reportadas ocorrem na presença dos miúdos, com consequências negativas óbvias e que apenas acentuam a necessidade de se minimizar ou eliminar este tipo de ocorrências.
Deste universo releva, como disse, um número de situações muito significativo que muitas vezes não é reportado, pois alguns estudos mostram a desconfiança que as vítimas sentem sobre a eficácia a justiça.
Na verdade, os últimos números que conheço, 2011, referem que do total de inquéritos instaurados, 83 % acabam arquivados, apenas 15 % chegam a julgamento que, com frequência, terminam com condenações. Quando se verificam condenações a maioria, 82 %, é com pena suspensa, veja-se que de 58 sentenças em processos-crime por violência doméstica relatadas à DGAI no primeiro trimestre de 2011, 52 por cento foram absolvições e 48 por cento condenações. Das condenações, apenas 6% merecem pena de prisão efectiva.
Por diferentes ordens de razões e embora a realidade se vá modificando lentamente, refira-se o aumento de denúncias por parte dos homens, parece assumir-se ainda uma espécie de fatalidade face à tolerância do crime de violência doméstica dirigida às mulheres, mas não só, provavelmente. Esta tolerância relativiza-se à dificuldade de prova, ao sistema de valores e situação de dependência emocional e económica de muitas das vítimas, à atitude conservadora de alguns juízes, etc. Permanece ainda com alguma frequência a dificuldade de promover a retirada do agressor do ambiente doméstico, procedendo-se à saída da vítima numa espécie de dupla violência que, aliás, também se verifica em situações de maus tratos a crianças, em que o agressor fica em casa e a criança é “expulsa”.
Importa ainda combater de forma mais eficaz o sentimento de impunidade instalado e ainda, como referi, alguma “resignação” ou “tolerância” das vítimas face à percepção de eventual vazio de alternativas ou a uma falsa ideia de protecção dos filhos em caso de separação do agressor. Nesta perspectiva, torna-se fundamental a existência de dispositivos de avaliação de risco e de apoio como instituições de acolhimento e, naturalmente, um sistema de justiça eficaz e célere.  

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