terça-feira, 12 de novembro de 2013

A CAMINHO DO XEQUE-MATE AO ENSINO PÚBLICO

De forma determinada o Ministro Nuno Crato vai cumprindo a sua agenda cada vez mais explícita, o financiamento do ensino privado à custa da degradação e desinvestimento do ensino público sob o princípio da liberdade de escolha.
Neste sentido, não se estranha que no OGE de 2014 para a Educação as verbas destinadas a financiar sob diferentes formas o ensino privado sejam reforçadas. Para além da inacreditável possibilidade de estabelecer contratos de associação ainda que exista ensino público com oferta educativa disponível na mesma área, teremos o cheque-ensino já com uma dotação de 19.4 milhões de euros e a desenvolver em termos experimentais. Em modo MEC, período experimental quer dizer pré-generalização como se verificou com o ensino vocacional que antes da avaliação entrou em generalização.
A experiência do que têm sido tais práticas de liberalização noutra paragens e o conhecimento dos territórios educativos portugueses exigem, de novo, uma notas sobre esta matéria.
Quero antes de mais sublinhar de novo que a existência de um subsistema educativo de ensino privado é absolutamente necessário para, por um lado permitir alguma liberdade de escolha, ainda que condicionada, por parte das famílias e, por outro lado, como forma de pressão sobre a qualidade do ensino público. Também já tenho referido que a chamada liberdade de educação, a escolha livre por parte dos pais dos estabelecimentos, públicos ou privados, em que querem os seus filhos educados, no modelo actual do nosso sistema educativo é, do meu ponto de vista, um enorme equívoco.
No que respeita às escolas públicas, conheço muitas situações de grande dificuldade ou mesmo impossibilidade de matrícula de uma criança em diferentes escolas da mesma zona, situação que as mudanças actuais, concentração de alunos em agrupamentos e mega-agrupamentos, estão a agravar e que muitas famílias sentem.
Por outro lado, no que respeita ao cheque-ensino e à liberdade de escolha dos pais, as experiências de vários países, sempre referidas e cujos resultados não são conclusivos, assentam genericamente num princípio que quando se fala entre nós desta hipótese é sempre esquecido e que também não consta dos princípios enunciados por Nuno Crato, isto é, a obrigatoriedade (a questão central) de aceitar qualquer criança. A legislação agora definida também não contempla, evidentemente, esta obrigatoriedade, talvez a proposta já não fosse tão bem acolhida pela generalidade dos estabelecimentos de ensino. Acresce que como já referi, os estudos sobre os efeitos deste tipo de modalidades não são conclusivos, longe disso, como há algum tempo um trabalho divulgado no Público sublinhava.
Na verdade, como todos sabemos, sem um carácter de obrigatoriedade muitas instituições de ensino privado não receberão nunca alguns alunos, independentemente de poderem ser financiados de formas diferenciadas.
Não é uma questão económica, é uma questão de defender a instituição de situações de risco que lhe comprometam a imagem de excelência ou a posição nos rankings, sejam os dos resultados escolares sejam os do "capital social" que detêm. Os trabalhos publicados nos últimos dias em torno dos rankings ostra este quadro com clareza. A cultura mais generalizada entende os estabelecimentos de ensino privado como exclusivos e muitos deles são profundamente selectivos na população que acolhem, aliás muitos pais "compram", por assim dizer, essa exclusividade.
Por outro lado e curiosamente, aos estabelecimentos de ensino privado é concedido um nível de autonomia pedagógica e curricular superior à escola pública que não pode ser apenas justificado por serem privados, pois a autonomia é uma ferramenta de desenvolvimento da qualidade, também na escola pública.
Insisto de há muito que a melhor forma de proteger a liberdade de educação é uma fortíssima cultura de qualidade, autonomia e exigência na escola pública e uma acção social escolar eficaz e oportuna. Assim teremos mais facilmente boas escolas, públicas ou privadas.
No entanto, cada vez é mais claro que este não é o entendimento de quem actualmente gere os destinos da educação em Portugal. É uma questão de agenda, evidentemente. Será que ainda haverá tempo de proteger a qualidade do ensino público antes da implosão final, do xeque-mate?

1 comentário:

GA disse...

Muito bom! Parabéns e Obrigado!!!