O Presidente da República, na busca de um segundo mandato
tranquilo e sem ondas, acentuou a sua semi-clandestinidade num período em que
seria fundamental ter uma presença próxima e envolvida com os portugueses.
No tom de quem nunca tem dúvidas e raramente se engana,
típico de uma arrogância que procura mascarar com referências recorrentes às
suas humildes origens e o horror a essa coisa da política, terreno pouco
recomendável, de que afirma não fazer parte, quando é justamente o político em
exercício com mais tempo de poder político, gere milimetricamente a sua
intervenção e actividade pública. No seu tom professoral propõe-se dar-nos
lições de como se deve comportar um Presidente em tempos de crise.
A nós, alunos bem comportados e também sem dúvidas,
resta-nos retirar apontamentos com diligência e reconhecer os dotes do Presidente.
Como seria de esperar de quem não quer problemas e apenas um
tempo final de mandato sem sobressaltos e uma sofrível reforma em seguida, as intervenções
do Professor Cavaco Silva são razoavelmente inócuas para que, quer as
oposições, quer o governo, concordem com o tom geral das diferentes e cada vez
mais raras intervenções.
Aproveitando a publicação do Volume VII dos Roteiros, Cavaco
Silva volta a tentar demonstrar como exerce a sua “magistratura de influência”,
um dos mais estimulantes enunciados políticos dos últimos anos. Na verdade,
magistratura de influência parece ser o guarda-chuva de uma atitude distanciada
e pouco envolvida com os problemas graves das pessoas apesar das palavras de
circunstância, que de retórica não passam pois são inconsequentes. A referência ao "cansaço" dos portugueses face à austeridade é um bom exemplo. Cansaço?! A pobreza não "cansa", agride a dignidade e as condições de vida.
O Presidente procura demonstrar, o que do meu ponto de
vista, não deveria fazer pois fragiliza justamente a mensagem que quer fazer
passar, de que trabalha imenso nos bastidores e que é assim que as coisas se
fazem, Professor sabe, obviamente. Mais do que acreditar, o cidadão comum
precisa de “sentir” que existe um Presidente está atento, aos problemas dos
portugueses e “sentir” que tem um Presidente que analisa as políticas em função
do impacto nas pessoas e não em função de outros interesses.
No quadro da nossa organização política e quando se
atravessam tempos de tanta dificuldade para tanta gente, seria de esperar uma
maior proximidade do Presidente da República, a expressão da preocupação e
solidariedade para com as condições de vida de muitos milhares de pessoas e não
um silêncio quebrado, incompreensivelmente, no Facebook e a cobertura óbvia a
políticas que reconhecidamente carecem de ajustamentos para que não se mate o
doente com uma suposta e milagrosa cura.
Apesar de tudo e estranhamente, não emitiu um “Deixem-me
influenciar”.
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