sábado, 23 de março de 2013

ESTE PAÍS VAI TER QUE SER PARA VELHOS

No Público divulga-se um estudo da DECO sobre os custos da estadia em lares para idosos segundo o qual dois terços dos utilizadores não têm rendimentos que lhes permitam suportar os custos da estadia nas instituições, dependendo assim das ajudas familiares. As graves dificuldades que muitas famílias atravessam criam situações muito complicadas para milhares de pessoas. Talvez este cenário contribua para entender os resultados da Operação Censos Sénior realizada pela GNR que encontrou mais de 28 000 idosos a viver sós ou em situação de isolamento. Deve registar-se que esta operação decorre fora das áreas urbanas e o número encontrado representa um aumento de 22.6% relativamente a 2012. Nas áreas urbanas o número de idosos a viver sós está também em crescimento. Acresce em todo este universo o movimento de envelhecimento progressivo da população portuguesa levando a que para 2030 as projecções apontem para que metade da população portuguesa esteja acima dos 50 anos.
Numa altura em que continua na agenda a reforma do estado que, parece, assenta nos cortes das suas funções sociais este cenário exige uma profunda atenção. A discussão necessária sobre o chamado estado social decorre num contexto particularmente adverso que pode, existe esse sério risco, fazer emergir ameaças sobre a sua sustentabilidade e, naturalmente, sobre a sua matriz conceptual.
Na verdade e pensando sobretudo no quadro actual e futuro próximo, a nossa população mais velha vive de uma forma genérica em condições muito precárias, como também sabemos que a população mais jovem é a mais exposta ao risco de pobreza para além dos velhos. Aliás, como é conhecido a tragédia do desemprego afecta sobretudo os mais novos e os mais velhos.
Os idosos começam por ser desconsiderados pelo sistema de segurança social que com pensões miseráveis, transforma os velhos em pobres, dependentes e envolvidos numa luta diária pela sobrevivência. Continua com um sistema de saúde que deixa muitos milhares de velhos dependentes de medicação e apoio sem médico de família. Em muitas circunstâncias, as famílias, seja pelos valores, seja pelas suas próprias dificuldades, não se constituem como um porto de abrigo, sendo parte significativa do problema e não da solução. Por outro lado e para além dos custos das instituições, importa ainda considerar a acessibilidade da oferta e a respectiva qualidade.
Segundo o INE e reportando-se a 2009 a taxa de risco de pobreza em Portugal continua alta, tendo subido na população idosa, 20.1 % deste grupo etário vive esta situação. Se considerarmos os efeitos conjugados das dificuldades económicas e dos cortes em políticas sociais de 2010, 2011 e 2012, esta taxa tenderá seguramente a subir.
É também pertinente relembrar que dados do Eurobarómetro sobre os impactos sociais da crise, mostravam em Junho de 2010 que os portugueses tinham como preocupação fundamental a pobreza, 91% dos inquiridos, e a velhice, 69% dos inquiridos.
Se olharmos para conjunto de dados que vão sendo disponibilizados, verifica-se que as condições estruturais se mantêm sem alterações, estamos na mesma posição de pobreza há vários anos e, por outro lado, as condições conjunturais, a crise, acentuam a preocupação com a pobreza e com a velhice o que define um cenário altamente inquietante em termos de confiança no futuro e na desejada e necessária qualidade de vida.
Temos vindo a assistir a um acréscimo de dificuldades das organizações de solidariedade social no providenciar de apoios às dificuldades crescentes da população, sobretudo à mais idosa, e retorna a mendicidade ou o bater à porta das instituições, porventura de forma mais envergonhada e a atingir camadas diferentes.
Neste cenário, todas as medidas que de alguma forma atinjam os mais velhos devem ser objecto de uma extrema reflexão no sentido de evitar que se acentuem as dificuldades no (sobre)viver de uma parte significativa da população portuguesa.
Lamentavelmente, boa parte dos velhos, sofreu para chegar a velho e sofre a velhice.
Não é um fim bonito para nenhuma narrativa.
Se a este quadro já instalado acresce o envelhecimento progressivo, o futuro exigirá mudanças substantivas e soluções novas.
Este país não estando a ser para jovens vai ter que ser para velhos.

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