O chefe de missão do FMI, Abebe Selassie, nosso governante
não eleito, fiscal do trabalho dos feitores que nos administram, produz em
entrevista à Lusa um conjunto de afirmações inacreditáveis. Entre outras referências,
o Sr. Selassie entende que “o resultado do emprego é muito infeliz”,
manifesta-se “desapontado com o facto dos preços da electricidade e das
telecomunicações não terem descido”. Estas afirmações são proferidas por quem é o
mandante das políticas que produzem os efeitos que acha “infelizes” e o “desapontam”.
Esta gente não se enxerga. Não têm que ser humanos, no
entanto, poderiam, pelo menos, tentar parecer. Na verdade, com alguma
regularidade são produzidas afirmações que me deixam alguma perplexidade.
Lembrar-se-ão as afirmações do Primeiro-ministro considerando que o
"desemprego pode ser uma oportunidade para mudar de vida" e "não
tem de ser visto como negativo". Recordo ainda os discursos aconselhando a
emigração, a necessidade de se sair da "zona de conforto" ou ainda a
famosa referência à necessidade de não sermos "piegas".
Umas notas breves, de um não especialista, sobre
a questão da comunicação, sobretudo das lideranças políticas.
A primeira questão é exactamente essa, o peso
social do mensageiro condiciona o conteúdo da mensagem, ou seja, a mesma frase
não tem o mesmo valor afirmada por um cidadão comum ou proferida por uma figura
com responsabilidades de decisão sobre a vida das pessoas. Assim sendo, as
lideranças políticas assumem maior responsabilidade pelas afirmações que fazem.
Uma segunda nota prende-se com a justificação das
afirmações, o seu conteúdo e forma. Todos os dias a imprensa e responsáveis de
instituições de solidariedade social nos dão conta de situações de pessoas,
milhares de pessoas, que estão a viver abaixo de um limiar que lhes garanta
padrões mínimos de qualidade de vida, incluindo dificuldades de alimentação
afectando crianças. Conhecemos muitas histórias de inacessibilidade a
tratamentos e serviços de saúde por dificuldades económicas. Muitos milhares de
famílias têm entregado as suas casas à banca por incumprimento de créditos,
etc. Para muitas destas pessoas, afirmações como as que estão em análise são
quase insultuosas e, portanto, inaceitáveis. Na verdade, este cenário
devastador aumenta a pressão sobre o discurso dos líderes políticos,
exactamente os que são responsabilizados pelos problemas ou, pelo contrário, de
quem se espera a minimização desses problemas.
Pode sempre afirmar-se que haverá alguma razão
nas afirmações ou que a intenção não é a de desvalorizar os dramas que afectam
muitos milhares de pessoas.
No que respeita à eventual razão, mesmo que em
algumas situações pudessem ser entendidas, toda a gente as ouve pelo que não
podem deixar de se sentir envolvidas e agredidas. Quanto à intenção, a sua não
existência, e acredito que não exista, não colhe. Numa certa altura do
desenvolvimento dos miúdos, o seu desenvolvimento moral e intelectual leva-os a
considerar que a sua não intenção de realizar algo, desculpa o que aconteceu,
tal entendimento traduz-se no frequente "foi sem querer" e como
"foi sem querer", não tem problema.
A questão é que os líderes políticos, os que
verdadeiramente são líderes, apesar de não possuírem, felizmente, o dom da
infalibilidade e da perfeição, não podem, não devem proferir determinadas
palavras e persistirem teimosamente na sua afirmação.
São palavras mal ditas.
O Sr. Selassie perdeu uma excelente oportunidade
de ficar calado ou, em alternativa, mesmo que não passasse de hipocrisia,
expressar uma palavra de solidariedade para com os portugueses.
Sem comentários:
Enviar um comentário