Algumas notícias deixam-nos uma
sensação estranha pois tanto podem ser vistas de um ponto de vista mais lúdico,
divertido ou, pelo contrário, provocar alguma amargura e inquietação.
O I coloca hoje em primeira página que Isaltino
Morais, após a condenação a prisão efectiva em Agosto de 2009, já apresentou 44
recursos, 29 dos quais após Setembro de 2011, que lhe custaram cerca de 133 000
€, para além dos honorários dos advogados. Com estes expedientes a sentença
continua por cumprir e, provavelmente, pouca gente acredita que alguma vez o
seja por mais estranheza que se sinta, incluindo entre alguns agentes da
justiça, caso do Ministério Público.
Muitas vezes tenho referido no Atenta Inquietude
que uma das dimensões fundamentais para uma cidadania de qualidade é a
confiança no sistema de justiça. É imprescindível que cada um de nós sinta
confiança na administração equitativa, justa e célere da justiça. Assim sendo,
a forma como é percebida a justiça em Portugal, forte com os fracos, fraca com
os fortes, lenta, mergulhada em conflitualidade com origem nos interesses
corporativos e nos equilíbrios da partidocracia vigente constitui uma das
maiores fragilidades da nossa vida colectiva.
Relembro que em 2009, a prescrição evitou a
condenação de 1489 arguidos já condenados em primeira instância. Não se
estranha, são recorrentes a demora, a manha nos processos judiciais com a
utilização de legislação complexa, ineficaz e cirurgicamente construída para ser
manhosamente usada por quem a construiu que, com base em expedientes
dilatórios, promove a injustiça, ou seja, é uma justiça manifestamente marcada
pelas desigualdades de tratamento como, aliás, a actual Ministra já referiu,
etc.
No entanto, ao reflectirmos sobre o cenário da
justiça em Portugal, o que me parece verdadeiramente preocupante é a percepção
de que ninguém parece verdadeiramente interessado em alterar este quadro apesar
da retórica das afirmações. Sofrem os cidadãos individualmente e sofre a qualidade
da vida cívica de um país que percebe o seu sistema de justiça como forte com
os fracos, fraco com os fortes, partidarizado, moroso, ineficaz e,
definitivamente injusto. É mau, muito mau.
A reforma do sistema de justiça é uma das
componentes do programa estabelecido pela "troika". Pode ser que por
imposição estrangeira, aí costumamos ser bons alunos, alguma mudança
significativa possa ocorrer.
Para já, temos adiado as reformas. Estamos no bom
caminho.
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