segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

OS PROBLEMAS ESPECIAIS DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

A Fenprof, a Confederação Nacional dos Organismos de Deficientes, a Associação Portuguesa de Deficientes e a Pró-Inclusão - Associação Nacional de Docentes de Educação Especial, vão avançar com uma queixa junto da UNESCO contra o Estado português, por incumprimento dos apoios aos alunos com necessidades educativas especiais a frequentar (nem todos) a escolaridade obrigatória. Algumas notas.
O próximo OGE para 2014 para a Educação contempla menos 14 milhões de euros para a área da designada Educação Especial. Não será estranho, trata-se certamente de uma questão administrativa dentro da normalidade a que o MEC nos habituou. Se considerarmos também os cortes nesta área envolvendo competências do Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social os cortes ascendem aos 17 milhões.
Recordo que em Julho foi conhecido o Relatório da Inspecção-geral da Educação e Ciência, Educação Especial: Respostas Educativas, respeitante ao ano 2011/2012.
A avaliação envolveu 97 agrupamentos e escolas nas quais existiam 3489 turmas com alunos com necessidades educativas especiais integrados e apenas metade tinham a redução de alunos prevista na lei. Nada de estranho, como é sabido, o Ministro Nuno Crato acredita que turmas grandes favorecem o sucesso educativo, mesmo o de alunos com necessidades especiais.
No Relatório identificam-se alguns constrangimentos, alunos cegos ou com baixa visão sem acompanhamento adequado ou mesmo sem ensino de braille ou de orientação e treino de mobilidade, escolas que recebem alunos surdos sem ensino de Língua Gestual Portuguesa ou sem intérprete, a maioria das escolas não estrutura programas de transição para chamada vida activa, pós-escolar, não promovendo eficazmente projectos de integração social que seriam desenvolvidos em parceria com outras instituições. Este facto, que não me surpreende, lamentavelmente, decorre de um dos equívocos estabelecidos nos últimos anos neste universo, as Parcerias Público Privadas para a inclusão. O Relatório refere ainda a insuficiência de professores, técnicos e intérpretes para o número de alunos com necessidades especiais a frequentar as escolas analisada.
O ano de 2012/13 desenvolveu-se nos mesmos parâmetros e o ano lectivo em curso foi e está ser catastrófico, falta de respostas, professores, funcionários, transportes, técnicos, desrespeito pelos próprios normativos relativos o número de alunos por turma, quer no que respeita aos alunos com NEE quer no que respeita aos seus colegas, etc., daí a queixa agora anunciada.
O futuro, pelo que nos é dado conhecer também não se afigura positivo.
Continuo a entender que com base num incompetente normativo que carece de urgente revisão, o lamentável Decreto-Lei 3/2008, temos milhares de crianças com necessidades de apoio educativo e que estão abandonadas e "entregadas" em vez de integradas, pese o empenho de muitos profissionais dedicados. Este cenário acontece muito por força do que o Relatório da IGE aponta, falta de formação, de recursos e de estratégias concertadas e consistentes de acolhimento das diferenças dos miúdos diferentes, mais diferentes.
Também tenho a convicção e o conhecimento de que esta legislação inibe, em muitas circunstâncias, a prestação de apoios a crianças que deles necessitam, quer por via da gestão de recursos impondo taxas de prevalência de problemas fixadas administrativamente e sem qualquer correspondência com a realidade, quer pelos modelos de organização de respostas que impõe.
A forma como está, em muitas situações, a ser colocada em prática a extensão da escolaridade obrigatória até aos 18 anos para muitos alunos com necessidades especiais é também pouco aceitável em termo de educação inclusiva, qualidade e respeito pelos direitos dos miúdos e famílias.
Entendo também que a prestação de serviços educativos, na área da psicologia por exemplo, em "outsourcing" ou as parcerias estabelecidas com as instituições assentam num enorme equívoco que os cortes orçamentais tornaram evidentes as dificuldades e o desajustamento do modelo escolhido, que na altura designei como um logro criado junto das instituições privadas que intervinham na área da educação especial e ao qual, por razões também económicas e de sobrevivência, tiveram de aderir.
Como é evidente, mais uma vez, em situações de dificuldade económica, as minorias, são sempre mais vulneráveis, falta-lhes voz. Como sempre afirmo, os níveis de desenvolvimento das comunidades também se aferem pela forma como cuidam das minorias.
Lamentavelmente, estamos num tempo em que desenvolvimento se confunde com mercados bem sucedidos, com cortes nos recursos necessários e na "normalização" dos procedimentos e dos miúdos, mesmo dos miúdos especiais.

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