No Público de hoje surge um trabalho que pode ser um retrato da tragédia em que a vida de muitas pessoas se transformou e é verdadeiramente inquietante.
A peça centra-se sobre o drama de famílias que esmagadas pela sobrevivência recorrem a empréstimos de particulares, incluindo vizinhos, pelos quais lhes são cobrados juros escandalosos, incomportáveis e a subir rapidamente, mas que são aceites para assegurar a sobrevivência naquele dia sendo que no dia seguinte, "logo se vê". O não pagamento acarreta represálias severas desde a agressão à tomada dos pertences disponíveis. Muitos testemunhos mostram gente aterrorizada, incapaz de pagar o que deve devido à miséria do rendimento disponível, sendo referido o caso de famílias que fogem, procurando esconder-se do medo.
Verifica-se também a impossibilidade do recurso às autoridades justamente por causa das represálias e das dificuldades da prova.
É esta a vida na selva em que transformaram e transformámos a nossa vida, o despudorado aproveitamento da miséria e das dificuldades alheias, seja de uma pessoa, de uma família, de uma empresa ou, finalmente, de um país. É apenas uma questão de escala, de juros e de oportunidade.
Os abutres com a sua reconhecida capacidade de detecção dos mais frágeis e vulneráveis estão atentos, não dormem, vivem sem alma, sem afecto, sem ética, sem escrúpulos de qualquer espécie. Ao mínimo sinal de fraqueza avançam e esmagam, são empreendedores, atentos às oportunidades e, às vezes, até dizem que estão a "ajudar", a apoiar programas de "assistência".
A vida da gente, de muita gente, é um inferno. Manter-se vivo e proteger a a dignidade até ao limite da resistência é o dia a dia da vida na selva.
Decididamente, o mundo anda mesmo feio, com gente muito feia. E não se pode exterminá-los.
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