Os tempos não vão fáceis, antes pelo contrário,
as dificuldades são enormes e, nas mais das vezes, transcendem a nossa
capacidade individual de as prevenir ou remediar. No entanto, estes tempos
ainda ficam mais pesados quando nós, ou alguns de nós, por comportamentos ou
discursos ainda os tornamos mais difíceis, mais feios, acho eu.
Atentem nesta história que um dia destes entrou
cá em casa.
Uma senhora das nossas relações, Mãe de um jovem
adulto com uma severa deficiência motora e mental que se desloca exclusivamente
em cadeira de rodas e sem autonomia, depois de recolhidas as compras nas
prateleiras do supermercado, chegou com o filho à zona das caixas e colocou-se
na fila da caixa com prioridade.
Uma senhora diz-lhe “Então a aproveitar-se” e
continua depois do ar perplexo da Mãe “aproveita-se da situação para se safar”.
A Mãe, embaraçada, ainda tentou explicar que a situação do filho na cadeira de
rodas e mais as compras era complicada mas ouviu, “ele está melhor que eu, está
sentado”. A Mãe fugiu dali para não bater na senhora.
Que se passa na cabeça das pessoas que as torna
tão feias? É da crise económica? É da crise dos valores? Como pode uma pessoa
estar tão doente ou ser tão infeliz que precisa de cobrar alguma coisa a uma
Mãe naquela situação?
Têm alguma ideia?
1 comentário:
Infelizmente, estas histórias muito feias sempre existiram, não sei se resultantes de falta de educação de muitos dos nossos concidadãos, se de falta de sensibilidade e solidariedade social, se de falta de valores...
Nestes tempos difíceis apenas sobressaem mais, porque o resto que nos rodeia, menos feio, também é cinzento. E as histórias acontecem com pessoas mais ou menos diferentes ou mais ou menos iguais, aleatoriamente.
Ainda no outro dia, um senhor aparentemente normal resolveu fazer uma fila dupla, juntinho a mim (que já lá estava), rumo à mesma caixa de um supermercado. Embora incomodada com a situação, fui andando, sempre com ele ao lado, sem dizer nada. Quando chegou a hora de colocar as compras no tapete, dirigi-me ao senhor para solicitar um pouco de espaço: "- Dá-me licença? Parece que está na minha vez." E qual não foi o meu espanto quando, a rir-se e recuando um pouco para o lugar dele (atrás), me respondeu: "- E só agora é que você se queixa? Já estava a ver que lhe passava à frente mesmo."
Fiquei pasmada.
Porém, a história mais chocante que conheço passou-se na própria família. Temos um rapazote autista (primo), hoje adolescente e muito evoluído,com considerável autonomia e auto-controlo para a deficiência, mas que continua a ser quase incontrolavelmente ávido por dois alimentos: pão e batatas fritas. Há uns anos, na fila de um restaurante McDonald's em que aguardava a sua vez com os pais que se distraíram uns segundos com o irmão mais novo, o pequeno (então com 8 anos) não se conteve na espera e deitou a mão a um pacote de batatas fritas que uma senhora, acabada de ser atendida, trazia no respectivo tabuleiro. A mãe do rapazote, muito aflita, ralhou com ele e pediu muita desculpa à senhora, garantindo que lhe levaria um pacote novo mal fosse atendida, e explicando que ele era autista, que tinha uma deficiência mental(caso a senhora não conhecesse o autismo).
Nada disto adiantou. A senhora fez uma escandaleira, com um ar muito exaltado, dizendo alto e bom som: "- Se ele é deficiente e não se sabe comportar, não o traga à rua, não tem nada que vir incomodar os outros! Quase me derrubava o tabuleiro. Parece um bicho e os bichos não vêm aos restaurante."
Palavras para quê?!
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