sexta-feira, 31 de maio de 2013

OS BRANDOS COSTUMES REVISTOS EM BAIXA

"Manifestantes insultam deputados e são retirados do plenário", na imprensa. "Soares alerta Cavaco para “perda de pacifismo” dos portugueses", na imprensa. Sucedem-se os episódios de hostilidade, insultos e vaias, dirigidos a membros do Governo e ao Presidente da República.
Na verdade, são já regulares e mais evidentes os sinais de descontentamento e sobretudo da desesperança que se traduzem em comportamentos de hostilidade.
Este sentimento emerge, naturalmente, das dificuldades progressivamente mais pesadas, e para muitos já insustentáveis, da dignidade ameaçada e, importa acentuar, das imprudentes, insensatas e inaceitáveis declarações e comportamentos de algumas lideranças.
A voz insuspeita do ainda Cardeal Patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, avisava há semanas, "o país aguenta tudo menos o  poder imprudente".
Se bem estarão recordados os mais atentos, há algum tempo, um especialista em saúde mental referia num trabalho divulgado na imprensa os riscos potenciais de alterações do comportamento que derivam do grave conjunto de dificuldades que muitos portugueses atravessam.
A instalação de uma clima de desconfiança face ao poder e ao futuro e a desesperança em mudanças significativas em tempo útil, em cima de situações como desemprego, por exemplo, podem provocar níveis de sofrimento que potenciem fenómenos reactivos de natureza agressiva mais extremados e dirigidos a terceiros, os identificados como responsáveis, caso dos ocupantes da cargos políticos de relevo, ou mesmo dirigidos contra si próprio através do suicídio, como também se tem verificado.
Dito de outra maneira, os comportamentos correm o risco de forma cada vez mais intensa conterem cargas emocionais que potenciam o seu descontrolo. Aliás, se bem atentarmos nos testemunhos recolhidos em manifestações ou protestos é bastante clara a carga emocional que envolve os comportamentos observados e que se traduzem em comportamentos extremados como verificamos na Grécia, em Espanha ou no extremo do recurso à tragédia das imolações ou do suicídio como forma de protesto.
Assim, um contexto de situações de desemprego, pobreza e exclusão percebido como resultantes de decisões políticas é fortemente perturbador das pessoas e ajuda a explicar o aumento significativo dos casos de perturbações depressivas ou da ansiedade ou de comportamentos de natureza mais agressiva.
Se a tudo isto ainda juntarmos sucessivas declarações, algumas inaceitáveis e insultuosas, de pessoas com funções públicas de relevo, está criado um caldo de cultura potencialmente explosivo e onde facilmente germinam os excessos.
É frequente a afirmação de que somos um povo de brandos costumes. A questão é que, como dizia Camões, todo o mundo é composto de mudança, tomando sempre novas qualidades. Um dia cansamo-nos de ser bons rapazes.

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