Na mesma linha do que já tinha proposto em 2011,
a Ordem do Enfermeiros propõe que nos Centros de Saúde exista um enfermeiro de
família e que sejam os enfermeiros a proceder à triagem e encaminhamento dos
cidadãos, tal como, aliás, já acontece nos hospitais. Na altura, os enfermeiros
sustentavam ainda que fosse aceite que este grupo profissional pudesse
prescrever fármacos, exames complementares de diagnóstico e ajudas técnicas em
determinadas circunstâncias, à semelhança do que já acontece em vários países,
como Espanha, Estados Unidos e Inglaterra. Tal como aconteceu em 2011 e sem surpresa a proposta da Ordem
dos Enfermeiros mereceu, como seria de esperar, uma recusa liminar por parte da
Ordem dos Médicos em termos pouco simpáticos, argumenta, que os Centros de
Saúde não precisam de "porteiros".
Esta reacção, obviamente de natureza corporativa,
resultará, por exemplo, de que a
prescrição é uma das reservas fundamentais de poder por parte da classe médica
que, prescindindo de parte dele, se sentiria enfraquecida. No entanto, a
proposta da global da Ordem dos Enfermeiros envolve vários outros actos de
natureza clínica e, repito, é uma situação que se verifica em vários outros
países da Europa ou nos Estados Unidos.
A argumentação com base na falta de qualificação
científica dos enfermeiros para alguns dos procedimentos que se propõem assumir
e, portanto, com a segurança dos doentes é naturalmente de ponderar pelo que
deixo duas notas breves.
Em primeiro lugar, a formação dos enfermeiros
portugueses é genericamente reconhecida internacionalmente. Sabe-se a
frequência com que são recrutados profissionais em Portugal para desempenho de
funções noutros países, por exemplo na Inglaterra, onde dentro dos limites
estabelecidos os enfermeiros podem prescrever e desempenhar outras funções.
Por outro lado, os estudos dos hábitos ligados à
saúde em Portugal mostram como somos um país com práticas muito enraizadas de
auto-medicação. Tal situação, além de nos tornar fortíssimos consumidores de
fármacos, representa, isto sim, uma ameaça à saúde por uso indevido do
medicamento. Neste quadro, a participação dos enfermeiros no processo de
acompanhamento com maior proximidade aos cidadãos, poderia, do meu ponto de
vista, ser um contributo para minimizar os efeitos desta situação.
No entanto, como sempre, vai ser uma questão de
poder e, como é hábito, no que respeita ao poder da classe médica, a tradição
ainda é o que era.
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