quinta-feira, 2 de maio de 2013

ESQUEÇAM, A TRADIÇÃO AINDA É O QUE ERA

Na mesma linha do que já tinha proposto em 2011, a Ordem do Enfermeiros propõe que nos Centros de Saúde exista um enfermeiro de família e que sejam os enfermeiros a proceder à triagem e encaminhamento dos cidadãos, tal como, aliás, já acontece nos hospitais. Na altura, os enfermeiros sustentavam ainda que fosse aceite que este grupo profissional pudesse prescrever fármacos, exames complementares de diagnóstico e ajudas técnicas em determinadas circunstâncias, à semelhança do que já acontece em vários países, como Espanha, Estados Unidos e Inglaterra. Tal como aconteceu  em 2011 e sem surpresa a proposta da Ordem dos Enfermeiros mereceu, como seria de esperar, uma recusa liminar por parte da Ordem dos Médicos em termos pouco simpáticos, argumenta, que os Centros de Saúde não precisam de "porteiros".
Esta reacção, obviamente de natureza corporativa, resultará, por  exemplo, de que a prescrição é uma das reservas fundamentais de poder por parte da classe médica que, prescindindo de parte dele, se sentiria enfraquecida. No entanto, a proposta da global da Ordem dos Enfermeiros envolve vários outros actos de natureza clínica e, repito, é uma situação que se verifica em vários outros países da Europa ou nos Estados Unidos.
A argumentação com base na falta de qualificação científica dos enfermeiros para alguns dos procedimentos que se propõem assumir e, portanto, com a segurança dos doentes é naturalmente de ponderar pelo que deixo duas notas breves.
Em primeiro lugar, a formação dos enfermeiros portugueses é genericamente reconhecida internacionalmente. Sabe-se a frequência com que são recrutados profissionais em Portugal para desempenho de funções noutros países, por exemplo na Inglaterra, onde dentro dos limites estabelecidos os enfermeiros podem prescrever e desempenhar outras funções.
Por outro lado, os estudos dos hábitos ligados à saúde em Portugal mostram como somos um país com práticas muito enraizadas de auto-medicação. Tal situação, além de nos tornar fortíssimos consumidores de fármacos, representa, isto sim, uma ameaça à saúde por uso indevido do medicamento. Neste quadro, a participação dos enfermeiros no processo de acompanhamento com maior proximidade aos cidadãos, poderia, do meu ponto de vista, ser um contributo para minimizar os efeitos desta situação.
No entanto, como sempre, vai ser uma questão de poder e, como é hábito, no que respeita ao poder da classe médica, a tradição ainda é o que era.

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