terça-feira, 14 de maio de 2013

O BOM CAMINHO DOS DIAS DE CHUMBO

O Ministro Vítor Gaspar recuperou ontem a apreciação de que estamos no caminho certo. Lamento a insistência mas não consigo ouvir este tipo de discursos sem algum embaraço.
O bom caminho em que entrámos após a tomada de posse das entidades que em nome dos mercados se apoderaram dos nossos destinos e nos transformaram numa obediente feitoria administrada por um Primeiro-ministro adjunto da Troika continua bastante claro. Os indicadores conhecidos relativos Portugal mostram o resultado do caminho imposto.
Vejamos alguns desses dados que têm sido divulgados nos últimos dias. A economia apenas gerou empregos com salários até 310€, montante suficiente para manter o empobrecimento, o bom caminho defendido.
Temos 17.7% de desemprego oficial, que se sabe ser superior em termos reais e que se estima continuar a crescer. Este cenário representa cerca de 1,8 milhões de portugueses em emprego ou função laboral a tempo inteiro. No escalão mais jovem o desemprego está nos 42.1% e mais de metade dos desempregados, cerca de 560 000, são de longa duração e, portanto, sem expectativa realista de voltar a entrar no mercado de trabalho.
A este quadro acresce um programa de rescisões por “acordo mútuo” na administração pública, ou seja, despedimentos, a contínua redução dos apoios sociais, reformas e pensões e, claro, estamos no bom caminho. Bom caminho para quem? Perguntem a milhões de portugueses na pobreza ou risco de pobreza se se sentem no bom caminho.
Com uma cumplicidade e fidelidade canina que embaraçam, os feitores e os donos dos destinos concebem uma devastadora situação da qual releva o aumento brutal de situações de pobreza, bem acima das estatísticas oficiais, o aumento fortíssimo do desemprego e do número de pessoas desempregadas sem subsídio de desemprego, o abaixamento dos apoios sociais, a pobreza a afectar crianças e idosos, sempre os grupos mais vulneráveis, a manutenção de simetrias gritantes na distribuição da riqueza, enfim, um inferno para milhões de portugueses.
Este é o resultado de uma persistência cega e surda no “custe o que custar", no cumprimento dos objectivos do negócio com a troika e dos objectivos de uma política "over troika", atingindo claramente o limite do suportável e afectando gravemente as condições de vida de milhões. Estamos a falar de pessoas, não de políticas, ou melhor estamos a falar do efeito das políticas na vida das pessoas. E estamos no “bom caminho”?
Creio que já ninguém consegue sustentar que este trajecto nos possa levar a bom porto, está à vista o quanto é insustentável a insistência neste caminho. Na verdade, o caminho decidido, por escolha de quem o faz, é bom registar que existem alternativas, está a aumentar assimetrias sociais e obviamente a produzir mais exclusão e pobreza mas, insisto, mais preocupante é a insensibilidade da persistência neste caminho.
Com este terramoto social e económico ainda se insiste no discurso do “temos que empobrecer”, é esse o “bom caminho”. Isto indigna até à raiva, nós já estamos pobres, nós não precisamos de ficar mais pobres.
Insistir no empobrecimento afirmando ser esse o "bom caminho" é insulto e terrorismo social é armar uma bomba de efeitos devastadores. Nós precisamos de combater a assimetria da distribuição da riqueza e produzir mais riqueza, precisamos de combater mordomias e desperdício de recursos e meios ineficientes e muitas vezes injustificados que alimentam clientelas e interesses outros. Nós precisamos de combater a teia de protecção legal e política aos interesses dos mercados e dos seus empregados que conflituam com os interesses das pessoas.
O que precisamos é de coragem e visão sem subserviência ao ditado dos mercados e dos seus agentes para definir modelos económicos, sociais e políticos destinados a pessoas e não a mercados ou a grupos minoritários de interesses.

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