domingo, 30 de junho de 2013

VIGILÂNCIA ELECTRÓNICA, TRABALHO COMUNITÁRIO E PRISÃO

A utilização da pulseira electrónica em situações de prisão preventiva tem vindo  aumentar. De acordo com a Direcção-geral de Reinserção e Serviços Prisionais a taxa de incumprimento é de 5.9% o que sustenta a pertinência da medida, havendo, por isso, quem defenda a sua utilização como forma de cumprimento da pena de prisão para crimes de natureza menos grave.
Acresce que a utilização deste dispositivo aliviaria a pressão sobre os estabelecimentos prisionais que se encontram em sobrelotação, bem como teria impacto nos custos, a prisão tem um custo diário de 40.10 € face aos 16.35 € da prisão domiciliária.
Mais importante ainda, dada a natureza flexível das restrições impostas com este procedimento, em alguns casos a pessoa pode sair para trabalhar ou assistir a aulas, por exemplo, os processos de reinserção são, naturalmente incentivados e mais eficazes.
Parece-me importante sublinhar também que nos últimos anos tem vindo a acentuar-se o recurso à aplicação de penas de “trabalho a favor da comunidade” em vez da mais habitual medida de prisão, em 2010 foram aplicadas 11166 penas deste tipo, enquanto em 1966 se contavam 124 casos.
Parece-me muito positivo este caminho, alternativo à prisão clássica, por assim dizer, que de há muito defendo sobretudo em situações que envolvam gente mais nova e conjugado com a obrigação de frequência de programas de formação escolar ou profissional.
Existe, no entanto, um discurso e um pensamento mais conservadores sustentados numa visão securitária que continuam a fazer-se ouvir defendendo a prisão como a medida mais correcta o que, comprovadamente, se reconhece não se verificar. Os estudos sobre a reincidência sugerem que as medidas de restrição de liberdade quando não acompanhadas por outro tipo de intervenção não a minimizam significativamente. Também se reconhece que frequentemente o universo prisional é uma "escola" e um factor de risco de agravamento de comportamentos de delinquência.
Como é óbvio tal entendimento não significa que nas situações de maior gravidade no crime cometido ou de risco de continuidade da actividade criminosa não seja de recorrer a medidas mais restritivas. De qualquer forma e sobretudo com gente mais nova a prisão dever ser de natureza excepcional e, desejavelmente, de curta duração.
Os comportamentos delinquentes são no fundo um desrespeito e agressão aos valores da comunidade pelo que parece lógico que em consequência desses comportamentos o seu autor seja colocado a desenvolver actividades que sirvam e “reparem” a comunidade “ofendida” e que, simultaneamente, forneçam sistemas de valores que possam influenciar e reabilitar os valores dos indivíduos envolvidos.
Apesar deste caminho de alteração na forma como a jusante lidamos com os comportamentos delinquentes de jovens e adultos, é fundamental que percebamos o que a montante contribui para a emergência desses comportamentos, ou seja, as causas. E também nesta matéria me parece de privilegiar intervenções de natureza comunitária.
Não há outro caminho.
 

DE TRAPALHADA EM TRAPALHADA. Esclarecimentos no briefing

O Ministro Poiares Maduro, o geniozinho que substituiu o "Dr." Relvas para tratar da propaganda, tem pela frente uma tarefa extraordinária.
Encontrar justificações para as sucessivas falhas nas previsões, aquela da chuva inventada pelo Ministro Vítor Gaspar foi fraquinha, explicar os números e indicadores que apesar da tortura sofrida insistem sempre em contrariar os discursos do Primeiro-ministro e dos génios que o rodeiam, é, na verdade, um empreendimento difícil.
Se considerarmos que se propõe tratar da propaganda diariamente num briefing com a imprensa, antecipo uns momentos interessantes todos os santos dias. Imagino uma espécie de "tesourinhos deprimentes"
Vem esta introdução a propósito de mais uma trapalhada, esta em torno dos tais "swaps", agora tão na agenda. Em sucessivas ocasiões, a Secretária de Estado Maria Luís Albuquerque negou que o anterior governo tivesse informado o actual governo sobre a existência destes produtos nas empresas públicas. Curiosamente, a mesma personagem tinha negociado contratos dessa natureza enquanto administradora da Refer, ou seja, ela enquanto ex-administradora da Refer sabia dos contratos, mas enquanto actual Secretária de Estado, desconhecia a sua existência por falta de informação do governo anterior. Por uma vez dou a razão a Scolari, "e o burro sou eu?".
Acontece que agora e com alguns dados factuais, datas e relatórios, o ex-ministro Teixeira dos Santos vem dizer que durante o processo de transição de governos houve passagem de informação sobre os tais "swaps" o que relança a trapalhada. O actual governo ainda não reagiu.
Creio que nesta altura o Ministro Poiares Maduro prepara um briefing com a comunicação social para esclarecer e repor a verdade, isto é, aquilo que deve ser considerado a verdade. Se é ou não, bom ... isso é uma outra questão.
Já não há saco.

Post scriptum - O Governo já reagiu mas é melhor ir por partes. O Ministério das Finanças, em comunicado, afirma que de facto durante o processo de transição recebeu informação sobre os "swaps" num reunião que decorreu em ambiente de "colaboração e cordialidade". Entende, no entanto, que a informação era insuficiente.
Por outro lado, o Ministro Aguiar-Branco (não me esqueci do hífen), afirmou, parece que sem se rir, que "o Governo nunca mente" pelo que a Secretária de Estado Maria Luís Albuquerque é que tem razão quando afirmou, por exemplo na AR que "na transição de pastas, nada foi referido a respeito desta matéria". Extraordinário.
Poiares Maduro deve estar ainda aflito a preparar o briefing para acertar esta trapalhada.

A TRAGÉDIA DOS FOGOS. SERÁ DESTINO?

A subida das temperaturas, própria do tempo em que estamos, traz para a agenda a questão dos fogos florestais. O Público apresenta um trabalho sobre esta matéria sublinhando o progressivo desinvestimento na prevenção privilegiando o combate após a deflagração. O resultado é terrível conforme pudemos verificar com a tragédia de 2012 dos fogos na Madeira e em Tavira, a título de exemplo, dadas as suas gigantescas proporções e efeitos devastadores.
Um Inverno que se prolongou e foi chuvoso deixou as zonas não habitadas com uma enorme cobertura vegetal de enormes que se constitui como uma enorme quantidade de combustível a que só falta um gesto criminoso, um comportamento negligente ou um qualquer incidente para se transformar em potenciais tragédias.
Para este ano anunciam-se novas estruturas de resposta rápida e meios de combate, designadamente meios aéreos mais sofisticados. É sempre assim, todos os anos somos informados de melhorias nos dispositivos de prevenção e combate, no aumento de meios à disposição, na racionalização da gestão dos recursos, etc. etc.
Entretanto, quando se começar a verificar a ocorrência mais frequente de fogos teremos o costume, a comunicação social, sobretudo a televisiva, de forma frequentemente desajeitada,  a mostrar o "terreno", o "cenário dantesco", a ouvir "moradores que passaram uma noite em branco", a ouvir o "senhor comandante dos bombeiros", a referir os "meios aéreos, dois Canadairs e um Kamov", a ouvir os "responsáveis locais ou regionais da protecção civil", a gravar despudoradamente imagens de dor, sofrimento e perda de gente anónima que tendo quase nada, vê arder o quase tudo, parece um filme sempre visto e sem surpresas.
É evidente que temperaturas muito altas e vento que nos caracterizam durante os meses de Verão são condições desfavoráveis, mas a falta de prevenção, a negligência e delinquência dão um contributo fortíssimo ao inferno que sobressalta cada Verão.
Sem nenhuma espécie de conhecimento destas matérias, para além do interesse e preocupação de um cidadão atento e preocupado com os custos enormes destes cenários de destruição, tenho alguma dificuldade, considerando a dimensão do nosso país, em compreender a inevitabilidade destes cenários. Os espanhóis têm por uso afirmar que os incêndios se combatem no inverno, nós combatemo-los no inferno.
Trata-se de um destino que não pode ser evitado? Trata-se de uma área de negócios, a fileira do fogo, que, pelos muitos milhões que envolve, importa manter e fazer funcionar sazonalmente? Trata-se "só" de incompetência na decisão política e técnica em termos de resposta e prevenção? Trata-se da falência de modelos de desenvolvimento facilitadores de desertificação e abandono, designadamente das área rurais?
O poeta falava de um fogo que arde sem se ver, é bonita a imagem. Mas quando um fogo arde e se vêem os seus efeitos devastadores e dramáticos, dói mais e não se perdoa.
Acresce que em Portugal passamos o ano todo a apagar fogos de diferentes naturezas e implicações.

sábado, 29 de junho de 2013

A AJUDA À BANCA E A AJUDA AO EMPREGO JOVEM

No I surge um trabalho muito interessante.
Num artigo escrito em Agosto de 2012, Durão Barroso divulgava que o montante de ajudas da Comissão Europeia à banca era de 4,5 biliões de euros, quase 28 vezes o PIB português.
O programa de apoio ao emprego para jovens desempregados, cerca de seis milhões de pessoas, agora aprovado por Bruxelas envolve um máximo de 8 000 milhões em três anos o que equivale a 0.1777 % da ajuda dada à banca, repito, 0,1777% da ajuda dada à banca.
Uma outra curiosidade, o montante a usar em 2014 e 2015 deste programa para promoção do emprego jovem é de 6 milhões de euros, justamente o valor que os contribuintes portugueses injectaram na banca.
Numa primeira leitura estes dados poderiam causar alguma estranheza, mas creio que são profundamente normais.
A tradição ainda é o que era, mercados são mercados e pessoas são pessoas. Os mercados não podem ficar nervosos e devem estar confiantes e as pessoas podem ser pobres, perder a dignidade e ver o seu projecto de vida adiado sine die. A banca, mesmo que envolvida em produtos tóxicos, não pode correr riscos mas as pessoas e as empresas podem falir.
Nada de novo, portanto. É uma questão de prioridades e valores.

A INCUBAÇÃO DO MAL

Nas últimas semanas têm-se registado múltiplos episódios de extrema violência envolvendo jovens e o uso de armas, designadamente, armas brancas. Esta noite ocorreu um novo e trágico incidente do qual resultou mais uma morte.
Apesar de há poucos dias aqui ter deixado algumas notas a frequência e gravidade das situações obrigam a uma enorme atenção e a exigir reflexão.
Na verdade, esta sucessão de incidentes graves leva-nos a questionar os nossos valores, códigos e leis pela perplexidade que nos causam.
A questão que me leva de novo a estas notas é mais no sentido de tentarmos perceber um processo que designo como "incubação do mal" que se instala nas pessoas, muitas vezes logo na adolescência, a partir de situações de mal-estar que podem passar relativamente despercebidas mas que, devagarinho, insidiosamente, começam interiormente a ganhar um peso insuportável cuja descarga apenas precisa de um gatilho, de uma oportunidade.
A fase seguinte pode passar por duas vias, uma mais optimista em que alguma actividade, socialmente positiva, possa drenar esse mal-estar, nessa altura já ódio e agressividade, ou, a outra via, aumenta exponencialmente o risco de um pico que pode ser um tiroteio numa escola, a bomba meticulosamente e obsessivamente preparada ou a entrada numa espiral de violência cheia de "adrenalina" que é banalizada e "normalizada", em nome de coisa nenhuma a não ser de um "mal-estar" que destrói valores e gente.
É evidente que a punição e a detenção constituírem um importante sinal de combate à sensação de impunidade perigosamente presente na nossa comunidade, mas é minha forte convicção de que só punir e prender não basta.
Assim, sabendo que prevenção e programas comunitários e de integração têm custos, importa reflectir sobre o clima social das nossas comunidades e ponderar entre o que custa prevenir e os custos posteriores da violência, da delinquência continuada e da insegurança.
Finalmente, a importância de uma permanente atenção às pessoas, desde pequenas, ao seu bem-estar, tentando detectar, tanto quanto possível, sinais que indiciem o risco de enveredar por um caminho que se percebe como começa, mas nunca se sabe como acaba.
E, como se tem visto, às vezes acaba mal.

A QUALIFICAÇÃO É UM BEM DE PRIMEIRA NECESSIDADE

Considerando as dificuldades económicas que muitas famílias atravessam, a maioria das instituições de ensino superior entendeu não aumentar as propinas dos seus alunos. Apenas quatro instituições irão cobrar a valor mais alto que a lei permite.
Vale a pena recordar, o recente Relatório da OCDE, Education at a glance 2013, que há dias aqui referi também a propósito desta matéria e de que retomo algumas notas. De facto, Portugal é um dos países europeus em que a frequência de ensino superior mais depende do financiamento das famílias, cerca de 31% dos gastos de universidades e politécnicos. A média da OCDE é 32% e a da União Europeia (UE) 23,6%.
Esta informação não é nova. Na verdade e como é do conhecimento das pessoas mais perto deste universo, o ensino superior, Portugal, contrariamente ao que muitos afirmam, tem um dos mais altos custos de propinas da Europa. Conforme dados de 2011/2012 a rede Eurydice, Portugal tem o 10º valor mais alto de propinas na Europa mas se se considerarem as excepções criadas em cada país, temos na prática o terceiro custo mais alto no valor das propinas.
Em 2012 foi divulgado um estudo realizado pelo Instituto de Educação da Universidade de Lisboa que contribui para desmontar um equívoco que creio instalado na sociedade portuguesa. Comparativamente a muitos outros países da Europa, Portugal tem um dos mais altos custos para as famílias para um filho a estudar no ensino superior, ou seja, as famílias portuguesas fazem um esforço bem maior, em termos de orçamento familiar, para que os seus filhos acedam a formação superior. Se considerarmos a frequência de ensino superior particular o esforço é ainda maior.
Tem vindo a ser regularmente noticiada a desistência da frequência dos cursos por muitos alunos que, por si, ou os respectivos agregados familiares não suportam os encargos com o estudo. Sabe-se também dos constrangimentos na atribuição de bolsas de estudo.
Segundo um estudo da Universidade do Porto, quase um quarto dos seus alunos abandona o curso durante os três primeiros anos. Os números dos diferentes cursos têm variações acima ou abaixo do valor médio, mas são muito elevados. Embora existam outros factores contributivos, as dificuldades económicas parecem constituir a razão fundamental para esta enorme taxa de abandono.
Também um inquérito envolvendo estudantes de todo o país coordenado pela Associação Académica da UTAD, apurou que 48% dos inquiridos já passaram por dificuldades económicas e cerca de 65% temem abandonar o curso em consequência das dificuldades.
Recordo ainda informações divulgadas na imprensa e recolhidas junto de um grupo significativo de estabelecimentos de ensino superior, que relatam que face a igual período do ano passado, aumentou 6% o número de desistências do ensino superior por efeitos da crise. Esta percentagem corresponde a cerca de 3300 estudantes o que é significativo. As dificuldades económicas, a dificuldade no acesso a bolsas e o aumento de propinas são os motivos identificados.
As dificuldades pelas quais passam muitos estudantes do ensino superior e respectivas famílias, quer no sistema público, quer no sistema privado, são, do meu ponto de vista, considerados frequentemente de forma ligeira ou mesmo desvalorizadas. Tal entendimento parece assentar na ideia de que a formação de nível superior é um luxo, um bem supérfluo pelo que ... quem não tem dinheiro não tem vícios.
Neste quadro, a redução significativa das bolsas e apoios, as dificuldades enormes que muitas famílias atravessam e o desemprego mais elevado entre os jovens, que poderia constituir uma pressão para continuar os estudos, as elevadas propinas, designadamente no 2º ciclo, tornam ainda mais difícil a realização de percursos escolares que promovam mobilidade social e que se traduzem, por exemplo, no aumento das desistências.
Considerando tal como Relatório referia, o ainda baixo nível de qualificação da população portuguesa e quando se espera e entende que a minimização das assimetrias possa, também, depender da educação e qualificação, o seu preço e as dificuldades actuais, longe de as combater, alimenta-as.
É preocupante.

sexta-feira, 28 de junho de 2013

A DESPUDORADA DANÇA DAS CADEIRAS. Novo episódio

O Dr. Menezes está a ver a vida andar para trás. O Tribunal Constitucional acaba de rejeitar o recurso que interpôs contestando a legitimidade do Movimento Revolução Branca para apresentar a providência cautelar que levou o tribunal a determinar o impedimento de se candidatar à Câmara do Porto depois de três mandatos em Gaia, tal como aconteceu com Fernando Seara em Lisboa.
Como é evidente, a questão ainda está longe do fim, ainda faltam muitos recursos até à decisão final dessa força de bloqueio que existe só para atrapalhar quem trabalha, o Tribunal Constitucional.
No caso mais particular do Dr. Menezes, o que me parece absolutamente patético e significativo é a contestação à legitimidade da acção interpostas pelo Movimento Revolução Branca, não é sustentar a legitimidade da sua candidatura. E esta é justamente a questão central que envolve candidatos nestas circunstâncias como, recorrentemente aqui tenho referido.
As decisões impeditivas das candidaturas radicando na legislação parecem-me, talvez por não ser jurista, as mais óbvias das decisões e um indicador importante para os preparativos em curso na dança das cadeiras e que produzem o deprimente espectáculo a que vamos assistindo na tentativa de promover e dar cobertura às migrações de "dinossauros" autarcas que assim se eternizam ao serviço da partidocracia.
A lei de limitação de mandatos parece clara na sua intenção e formulação mas, como sempre, se não serve os interesses partidários de ocasião, torce-se a lei, é simples, e ela passa a dizer o que nós queremos que ela diga. Até tivemos um episódio, de uma mestria insuperável, a "descoberta" feita em Belém de que se trocaram os "da" pelos "de" entre a lei aprovada na AR e a publicada no DR e, claro, avoluma-se o alarido.
Não sou jurista nem constitucionalista, mas como cidadão parecem-me razoavelmente claras duas ideias, a saber, em primeiro lugar é saudável e desejável do ponto de vista, político, democrático e ético que se limitem os mandatos de cargos políticos exercidos pelo mesmo cidadão, ponto. Em segundo lugar, a Constituição estabelece o mesmo entendimento político no artigo 118º, "Princípio da Renovação" afirmando, "Ninguém pode exercer a título vitalício qualquer cargo político de âmbito nacional, regional ou local", ponto.
Parece-me, pois, claro, que qualquer lei que cumpra a Constituição, como não pode deixar de ser, não pode aceitar e admitir que um cidadão, desde que vá saltando de município em município, possa ocupar a função de presidente de câmara, por exemplo, a título vitalício.
É este entendimento manhoso, inconstitucional, que a maioria dos partidos representados na Assembleia da República assume na defesa dos seus interesses locais onde impera amiguismo, aparelhismo e pagamento de favores de natureza variada. No entanto, deve sublinhar-se que mesmo dentro dos partidos que enquanto tal "torcem" a lei, interpretando-a no restrito sentido dos seus interesses, existe muita gente que sustenta o óbvio, autarcas com três mandatos cumpridos não podem candidatar-se.
No entanto, em termos de saúde ética da nossa vida cívica, o preço deste pântano é altíssimo. O despudor e a partidocracia capturaram e debilitaram a qualidade da democracia, a confiança e o envolvimento cívico dos cidadãos.
Este é, também, uma dimensão enorme da crise, das crises. As decisões dos tribunais de Lisboa e Porto e esta decisão do Tribunal Constitucional possam ser um sinal de que algo pode mudar. Aliás, mesmo os tribunais que têm expressado entendimento diferente, não tem sido no sentido de aceitar este tipo de candidaturas mas pronunciam-se, sobretudo, sobre a sua competência para decidir nesta matéria ou sobre razões processuais, pelo que também por aqui não é uma situação fechada e tudo irá ser decidido no Tribuna Constitucional.
Como diz o Velho Marrafa no Meu Alentejo, "Deixe lá ver". Até porque ainda falta esgotar os recursos, é claro.

O BRIEFING DIÁRIO DA CENTRAL DE INFORMAÇÃO

Começam a conhecer-se os pormenores da grande iniciativa do Ministro Poiares Maduro, um outro geniozinho deste executivo, que visa melhorar os tão referidos problemas de comunicação do Governo, a realização de um briefing diário com a imprensa.
O briefing ocorrerá ao meio dia e será gerido pelo Secretário de Estado Pedro Lomba. Pelas 10 horas de cada dia as redacções conhecerão a agenda do briefing, na meia hora seguinte podem colocar algumas questões que serão respondidas às 12 horas sendo que poderão ainda ser colocadas mais questões. Consoante a agenda, o briefing poderá contar com a presença de outros membros do Governo.
Considerando que muitos opinadores, politólogos e outros palpitólogos têm referido a existência de um problema de comunicação por parte do Governo este sofisticado e inédito, entre nós, modelo vai produzir uma torrente de informação que nos deixará submersos ou mesmo intoxicados.
É na verdade uma mudança substantiva face ao tempo em que o “Dr.” Relvas tutelava a informação. Tudo era mais discreto, a informação circulava nas Lojas e nos telemóveis certos, ainda que em situações mais aflitivas um telefonema e uma "pressãozinha" para algum jornalista mais rebelde fossem necessários.
A agora passaremos a ter um briefing diário com a disponibilização da informação para os jornalistas. Fica assim mais organizado o trabalho de “soprar” para as redacções a informação amiga no tempo oportuno, tentação de todos os tempos e de todos os governos, embora possa esbater o papel fundamental dos “assessores” de imprensa dos gabinetes ministeriais e minimizar a promiscuidade que se verifica na circulação de muitos jornalistas entre as redacções e os gabinetes políticos num esforço enorme de garantir a melhor informação.
Com o briefing diário a comunicação andará mais controlada e evitar-se-á a sempre desagradável confusão de declarações politicas que frequentemente tem acontecido e que é origem de alguns embaraços.
Nada como uma central de informação.

ENSAIO SOBRE A INJUSTIÇA NA CEGUEIRA

A ver se compreendo.
Seis pessoas com problemas de saúde deveriam receber um tratamento no Hospital de Santa Maria envolvendo um determinado produto.
Em consequência do tratamento ficaram cegos, parcial ou totalmente. As investigações, ao que parece, não conseguiram determinar com exactidão qual o produto com que foram injectados ou se se verificou qualquer contaminação.
Dois técnicos do sector de preparação dos fármacos foram acusados por negligência e vão a julgamento.
Ao tempo dos acontecimentos, o serviço não tinha manual de procedimentos, foi amanhado um após a tragédia para mostrar se viesse alguma inspeccção, não se verificando também supervisão ou fiscalização de práticas. Mais, até à altura do grave episódio não existiam normas de rotulagem dos fármacos preparados no serviço e após os factos o número de técnicos passou de cinco para mais de trinta.
Neste cenário, a responsável do serviço entrou no processo como … testemunha de acusação, negando qualquer responsabilidade pelos factos.
Em tribunal não se consegue estabelecer nexo de causalidade ou explicação sólida para o sucedido e os dois técnicos são absolvidos apesar da “acusação” da responsável do serviço.
Entretanto, as pessoas lesadas, através de um outro processo judicial, acederam a indemnizações financeiras de montante variável conforme a gravidade da situação.
Em síntese, os dois técnicos são absolvidos, terão realizado o trabalho nos termos em que ele estava (mal) organizado, a investigação não consegue determinar com exactidão o que foi administrado às pessoas, a responsável por um serviço caótico e sem regras é acusadora e não expressa um sobressalto de responsabilidade pelo que aconteceu.
Temos assim que, na verdade, os verdadeiros culpados foram as pessoas que de forma inaceitavelmente negligente se deixaram adoecer de tal maneira que precisariam dos cuidados daquele serviço. Tal comportamento é, de facto, de uma enorme negligência.
Tudo isto parece ser uma situação estranha mas não, é apenas mais um episódio edificante da vida no Portugal dos pequeninos.
Esta recorrente situação de acidentes sem responsáveis sempre me recorda uma história que se conta no mundo da construção civil. Lembra-me uma velha história do mundo da construção civil.
No dia da inauguração uma ponte desaba. Com o objectivo de averiguar a causa da queda, abre-se o habitual inquérito inquirindo todos os potenciais envolvidos. O arquitecto não assumiu problemas com o projecto, o engenheiro garantiu a construção e os operários o seu trabalho. Ouviram-se então os materiais, com o betão estava tudo bem. Quando interrogaram o ferro, ouviram uma resposta estranha, “Não sei porque é que a ponte caiu, eu nem estava lá”.
Naquele dia 17 de Julho de 2009, em Santa Maria, apenas estavam seis pessoas que sem saber como nem porquê ficaram cegas ou parcialmente cegas. Nada nem ninguém mais lá estava.
 

FÉRIAS APESAR DA CRISE OU FÉRIAS POR CAUSA DA CRISE

Um estudo realizado pelo Instituto de Planeamento e Desenvolvimento do Turismo, referido no Público mostra que a percentagem de portugueses que expressam a intenção de fazer férias entre Junho e Setembro aumentou de 47% em 2012 para 50,2% este ano.
Não conheço os dados técnicos do estudo pelo que não discuto as conclusões referidas.
No entanto, discordo da interpretação que o título do Público sugere, “Há mais portugueses que não abdicam de Verão com férias, apesar da crise”.
Na verdade não creio que mais portugueses intentem gozar férias “apesar da” crise, creio que é justamente “por causa” da crise.
Acho que existe a secreta esperança de que se nos afastarmos ou pararmos um pouco, a crise nos dará um descanso.
O problema será o retorno.
Mas um tempo de cada vez.

A RECESSÃO VAI ABRANDAR, DESTA VEZ É QUE É. A SÉRIO. JURO.

O Primeiro-ministro anunciou hoje em Bruxelas pela enésima vez que a “recessão está a abrandar” o que indicia a “viragem económica até ao fim do ano”. Ao que parece, terá proferido estas afirmações com um ar formal, pose de estado, como lhe chamam. Também não sei se quem ouviu conseguiu conter um sorriso, amarelo, já se vê. Eu não consegui.
A propósito de previsões, recordo que em Maio, a OCDE divulgava previsões que contrariavam as previsões do Governo que nos administra e da Troika que nos governa no que respeita à recessão e ao crescimento. Para 2013, a OCDE prevê uma recessão de 2.7% enquanto Governo e Troika apontam para 2,3% e no crescimento para 2014 a OCDE indicia 0.2% face a 0.6% previstos pelo Governo e pela Troika.
Parece que as previsões continuam a não coincidir.
Recordo ainda um trabalho muito interessante realizado pelo I sobre o que designou por o "mundo delirante das previsões da troika" centrado, naturalmente na falha clamorosa de todas as previsões elaboradas pelos especializados e geniais técnicos que administram e governam o país exemplificando com dados relativos ao défice, ao crescimento ou ao desemprego.
Sabemos da falibilidade da obra humana mas é demasiado grave que estes gurus acompanhados, pelos seus adjuntos internos, Passos Coelho, Vítor Gaspar os geniozinhos que os rodeiam definam um conjunto de políticas gravosas, promotoras de exclusão e pobreza assentes em falhas inaceitáveis dos seus modelos de análise e que de tal processo não se extraia uma conclusão óbvia, é necessário e urgente redefinir modelos e políticas mas na qual, como parece óbvio, os adjuntos internos da troika não estão minimamente interessados.
O resultado de tudo isto é uma persistência cega e surda e uma inabalável fé nos seus falíveis modelos, traduzidas no “custe o que custar", no cumprimento dos objectivos do negócio com a troika e mesmo na definição de objectivos de uma política "over troika", atingindo claramente o limite do suportável afectando gravemente as condições de vida de milhões. Estamos a falar de pessoas, não de políticas, ou melhor, estamos a falar do efeito das políticas na vida das pessoas.
Este "mundo delirante das previsões da troika", como lhe chama o I, seria um bom exemplo da conhecida metáfora do burro meteorologista, não fora a tragédia que causa na vida de milhões de pessoas.
Aliás, por falar em meteorologia, há uns dias mereceu ampla divulgação umas previsões com origem em França que apontavam no sentido de que o próximo Verão será o mais frio dos últimos duzentos anos. Alguns especialistas olham com reserva estas previsões na medida em que os modelos probabilísticos usados contêm níveis significativos de falibilidade.
Continuamos com um problema de modelos e da sua falibilidade.
No entanto, creio que estas previsões da meteorologia e apesar da falibilidade dos modelos, parecem mais acertadas. Muitos milhares de portugueses irão viver um Verão, que apesar do calor de hoje, muito frio, com a esperança congelada e com um forte arrefecimento no ânimo e na confiança.

quinta-feira, 27 de junho de 2013

UM RAPAZ CHAMADO SE

Era uma vez um Rapaz chamado Se, nome pequeno e estranho. Em boa verdade ele não se chamava Se, mas toda a gente quando falava dele só falava no Se.
Se quisesse, era bom aluno.
Se estivesse com atenção, aprendia.
Se é esperto, porque não aprende.
Se tivesse uma família como deve ser, estava melhor.
Se pensa que gostamos dele, está enganado.
Se não fosse assim, era um bom rapaz.
Se fizesse o trabalho como deve ser, a situação era diferente.
Se mudasse, ficava bem melhor.
Se trabalhasse mais, safava-se.
Se não tivesse sempre aquele ar, era bem melhor para ele.
Se tivesse outro comportamento, aprendia mais.
E assim por diante.
De tal maneira as pessoas falavam do Se, que o Rapaz ficou com uma enorme dúvida. Se seria ele? ou ele seria Se?

AS MANHAS QUE BOLONHA ABRIU

O Governo aprovou em Conselho de Ministros a revisão, já anunciada pelo Ministro Nuno Crato, dos processos criados no âmbito da Declaração de Bolonha de creditação académica por equivalência de experiências profissionais. De acordo com a legislação aprovada é estabelecido o limite de um terço do  total de créditos por curso aos créditos que se possam obter por equivalência de experiência profissional. Devo dizer que a grande maioria dos estabelecimentos de ensino superior tinham regras de creditação que em muitos casos são até mais restritas que as agora anunciadas.
É óbvio que tal decisão decorre da meteórica e escandalosa licenciatura atribuída pela Universidade Lusófona a Miguel Relvas que vai chegar agora a tribunal. Por me parecer oportuno, retomo umas notas antigas.
Em primeiro lugar, devo dizer que estou ligado profissionalmente a uma instituição de ensino superior privado, creio que a mais antiga do país, com 50 anos, o que de alguma forma me envolve nesta questão, mas, por outro lado, me permite falar com algum conhecimento.
Como já o tenho referido, o aumento exponencial da procura do ensino superior durante os anos 70 e 80 não encontrou resposta na rede existente fundamentalmente pública. Nesse contexto emergiu rapidamente uma enorme quantidade de estabelecimentos de ensino superior privado e, naturalmente, também no ensino público com novas universidades e a explosão do ensino politécnico.
Este aumento foi completamente desregulado, por responsabilidade da tutela com a justificação da autonomia universitária, o que gerou uma rede sobredimensionada, enviesada na oferta, com corpos docentes em muitos casos manifestamente pouco qualificados e, portanto, com compromissos severos de qualidade.
Por outro lado, a decisão política, de base económica, que justificou o processo de Bolonha, introduziu uma outra variável neste universo, as licenciaturas de curta duração, o 1º ciclo, que em algumas áreas passaram a ser a formação de base substituta da anterior formação de 5 anos. O Processo de Bolonha abriu ainda portas ao reconhecimento académico de competências profissionais o expediente de que Relvas e a Universidade Lusófona se serviram e daí a sua reclamação de “legalidade” que parece agora questionada pelo Ministério Público.
Um cenário desta natureza num contexto praticamente desregulado, apesar de algumas inspecções inconsequentes, como a imprensa na altura referiu, conhecendo-se a falta de arquitectura ética de boa parte das nossas lideranças bem como a importância social atribuída ao "canudo de Dr." e menos ao conhecimento, a promiscuidade de interesses e dos lóbis (aliás, uma das 4 cadeiras feitas por Miguel Relvas) motivou muitos casos de trânsito entre universidades privadas, e não só, e a classe política, sendo muito frequente que uma figura qualquer com currículo partidário ou a ocupação de um cargo político passe em seguida a “Professor universitário” sem currículo nem competência que o justifique, mas de cuja ligação se espera que todos ganhem, seja lá o que for.
É neste caldo que se geraram situações como a do ex-ministro Miguel Relvas e de mais algumas situações menos mediatizadas mas conhecidas.
Lamentei e lamento todo este episódio, que mina a credibilidade do ensino superior privado e fez duvidar de um princípio que por si é importante, o reconhecimento pela academia de que existem saberes e competências que podem ser adquiridas fora da universidade, mas trabalhando mesmo e fazendo prova desses saberes e competências. Fico triste com esta situação mas não surpreendido e por isso entendo a decisão da sua revisão por parte do MEC. Não deveria ser necessário mas é como se passa com os miúdos, quando eles não sabem tomar conta deles, alguém tem que o fazer.

UM DESCONTENTAMENTO GERAL E UMA GREVE QUE TALVEZ NÃO O SEJA TANTO

Com a mudança já de há algum tempo da estratégia de informação do governo em matéria de greves não o habitual campeonato de audiências em torno os números de adesão à greve para hoje agendada. O Governo, desde há uns tempos, numa jogada política óbvia, retirou-se do jogo, deixando a bola com o adversário. Deve sublinhar-se a forma pouco aceitável do ponto de vista democrático escolhida para "não ir a jogo", pura e simplesmente proibiu serviços e empresas sobre tutela do estado de fornecerem elementos sobre níveis de adesão. Como exemplo de prática democrática, transparente e respeitadora do direito à informação é, no mínimo, discutível.
No entanto, como é habitual, as estruturas representantes do poder político virão muito provavelmente afirmar que se registou um bom resultado pois a iniciativa não teve a adesão referida e ou esperada, não teve impacto significativo na vida das comunidades, que fica evidente a aceitação ou, pelo menos, a compreensão das políticas seguidas e a bondade dos seus pontos de vista, etc.
Por outro lado, as estruturas representativas dos trabalhadores informam-nos que a adesão correspondeu às expectativas, que os trabalhadores mostraram o seu descontentamento, que o movimento sindical obteve mais uma retumbante vitória, etc.
A questão é que esta discrepância, do meu ponto de vista, acaba por desvalorizar os efeitos da própria greve pois, como é sabido, muitos estudos têm vindo a demonstrá-lo, os níveis de cultura política, participação cívica, precariedade laboral, custos económicos do dia de greve, etc., levam a que uma percentagem muito significativa de pessoas embora estando de acordo com a razão dos protestos não adiram à realização da greve. Desta questão decorre o facto de se defender que as manifestações podem um instrumentos mais potentes de protesto por, provavelmente, terem mais capacidade de mobilização como as últimas experiências demonstram.
Do meu ponto de vista, mais do que uma contabilidade da adesão que nunca será objectiva, importa atentar na existência de razões fortes para o protesto e descontentamento que estejam para lá das diferentes agendas partidárias e da conflitualidade de interesses neste cenário, a luta dentro da partidocracia.
Temos perto de 3 milhões de portugueses em risco de pobreza, a União Europeia reconhece que as medidas de austeridade que têm vindo a ser promovidas conduzem a um aumento da disparidade entre os mais ricos e os mais pobres, temos um milhão e meio de desempregados de desempregados, sendo que a taxa é de 42.5% entre os mais jovens.
Sabemos que os cortes nos recursos afectados aos apoios sociais são manifestamente insuficientes para minimizar de forma significativa as dificuldades de muitas pessoas o que faz aumentar exponencialmente os pedidos de ajuda junto das instituições de solidariedade social que, por sua vez, também não têm recursos para responder.
Neste quadro, ainda assim reduzido nas questões referidas, releva a existência clara de um descontentamento geral, de um conjunto de enormes dificuldades que é também geral, isto é que me parece a substância, embora possamos discutir se a greve é geral, quase geral ou só um bocado geral.
Como é óbvio, quem decide, não o pode fazer, como se costuma dizer no jargão político, com base na rua. Mas manda o bom senso que também não se pode esquecer a rua e que a rua não é apenas os que lá estão.

O MAL ESTAR COMO SEMENTE. Novo episódio

Nos últimos tempos são recorrentes as notícias relativas a problemas sérios no âmbito das relações interpessoais entre adolescentes e jovens. Relembro casos como o da alegada violação de uma rapariga por colegas da escola, a tragédia de hoje da morte de um jovem, junto a uma escola, ao que parece em consequência de confrontos decorrentes de problemas anteriores entre grupos e agora, junto da mesma escola, novo episódio de extrema violência.
Começam a ser mais evidentes e frequentes estes casos de violência e abusos entre gente nova o que nos leva a questionar os nossos valores, códigos e leis pela perplexidade que nos causam.
A questão que me leva de novo a estas notas é mais no sentido de tentarmos perceber um processo que designo como "incubação do mal" que se instala nas pessoas, muitas vezes logo na adolescência, a partir de situações de mal-estar que podem passar relativamente despercebidas mas que, devagarinho, insidiosamente, começam interiormente a ganhar um peso insuportável cuja descarga apenas precisa de um gatilho, de uma oportunidade.
A fase seguinte pode passar por duas vias, uma mais optimista em que alguma actividade, socialmente positiva, possa drenar esse mal-estar, nessa altura já ódio e agressividade, ou, a outra via, aumenta exponencialmente o risco de um pico que pode ser um tiroteio numa escola, a bomba meticulosamente e obsessivamente preparada ou uma investida contra alguém arriscando a entrada numa espiral de violência cheia de "adrenalina", em nome de coisa nenhuma a não ser de um "mal-estar" que destrói valores e gente.
É evidente que a punição e a detenção constituírem um importante sinal de combate à sensação de impunidade perigosamente presente na nossa comunidade mas é minha forte convicção de que só punir e prender não basta.
Assim, sabendo que prevenção e programas comunitários e de integração têm custos, importa ponderar entre o que custa prevenir e os custos posteriores da violência, da delinquência continuada e da insegurança.
Finalmente, a importância de uma permanente atenção às pessoas, desde pequenas,  ao seu bem-estar, tentando detectar, tanto quanto possível, sinais que indiciem o risco de enveredar por um caminho que se percebe como começa, mas nunca se sabe como acaba.

quarta-feira, 26 de junho de 2013

E QUE TAL COLOCAR A DEMOCRACIA EM MOBILIDADE ESPECIAL, PERDÃO, EM REQUALIFICAÇÃO?

Passos Coelho afirmou hoje que apesar do Governo respeitar, obrigado senhor, o “direito inalienável à greve”, mas acentuou que o país precisa menos de greves e mais de trabalho. Está certo, quando era miúdo também ouvia alguma gente dizer "a minha política é o trabalho" quando ventos adversos desaconselhavam o desacordo com o regime.
Na verdade, as lideranças políticas, todas elas, convivem mal com a contestação quando estão no poder e "compreendem-na" quando estão na oposição, é uma questão de oportunismo, perdão de oportunidade.
Mas vamos registando.
Há já algum tempo Manuela Ferreira Leite achava que se deveria "suspender" a democracia para se poder realizar mudanças com tranquilidade. No recente processo de greve dos professores e perante a decisão do decisão do Colégio Arbitral de não definir serviços mínimos, como era expectativa e desejo do Governo, o Primeiro-ministro anunciou a intenção de mudar a lei para que tal não voltasse a acontecer. Está certo, não gostamos das regras do jogo, mudam-se. Mais nada.
O Dr. Alberto João, outro rapaz que não lida bem com quem discorda de si, defendia há dias a proibição do direito à greve em alguns sectores, coisa que considerava "insustentável". É assim mesmo, essas coisas de comunistas só atrapalham.
Também, o geniozinho que substituiu o “Dr.” Miguel Relvas no Governo, Poiares Maduro, entende que “um dos grandes problemas em Portugal é que tudo é contestado”.
Volto a reafirmar o que disse há dias. Têm muita razão os nossos Queridos Líderes.
Estão as pessoas do Governo, as que obviamente sabem o que é importante para o país, a cumprir o patriótico dever de reformar o Estado, despedir pessoas, levar o país à recessão, as pessoas à pobreza e as empresas à falência e esta gente só atrapalha, quer discutir, negociar e até fazem greves quando é preciso é trabalhar, já vamos nas 40h mas é preciso mais. Mas discutir o quê? Negociar o quê?
As pessoas comuns sabem alguma coisa de economia, de finanças, de reformas de estados?
Claro que não, é só para atrapalhar, arrnajr confusão e fazer perder tempo. E, como sabem, tempo é dinheiro.
Que não hesitem, pois, Queridos Líderes, cumpram o dever patriótico de reformar o país e ponham a mexer, em mobilidade, perdão em requalificação, perdão no desemprego, quem tiver que ser. O país não pode estar preso por irrelevâncias como as que as pessoas estão sempre a levantar, em vez de estarem sossegadas em casa ou a trabalhar, os que ainda o podem fazer.
Há que mudar a Constituição e acabar com estas forças de bloqueio como sindicatos, o Tribunal Constitucional, Provedor de Justiça, Tribunal de Contas, imprensa pouco amiga, etc.
Que chatice!
Deixem trabalhar os Queridos Líderes.

UM HOMEM CHAMADO ESTRANHO

Era uma vez um homem chamado Estranho. Viveu sempre só. Quando era pequeno não tinha amigos porque os pais dos outros miúdos sempre os avisavam de que não se deviam dar com Estranhos, não se deviam aproximar de Estranhos, para terem muito cuidado com os Estranhos.
Quando era adolescente, o Estranho passava o tempo só, não havia ninguém como ele, Estranho. Todos os rapazes e raparigas arranjavam um grupo para pertencerem e se sentir bem, mas como não havia nenhum grupo de Estranhos, o Estranho ficou entregue a si mesmo.
Quando chegou a adulto procurou alguém que quisesse partilhar a vida com ele. Não encontrou. Afinal, não é fácil encontrar alguém que goste e queira viver com um Estranho.
No seu trabalho, nas mais das vezes, estava no seu canto, sempre com o seu ar de Estranho. Os colegas, naturalmente, não se aproximavam de alguém com aquele ar de Estranho.
Em velho fechava-se nos livros, ninguém estava particularmente interessado na companhia de um velho Estranho.
Finalmente alguém se aproximou dele, do Estranho. Como sabem, a Morte não liga a nomes, mesmo de alguém que se chame Estranho.

LICENCIADO À FORÇA

O Ministério Público instaurou um processo no Tribunal Administrativo de Lisboa contra a Universidade Lusófona, por causa da licenciatura do ex-ministro Miguel Relvas", na imprensa.
Ao que parece e assim é que está certo, o "Dr." Miguel Relvas ainda não é réu neste processo.
Coitado do "Dr." Relvas, por causa desta trapalhada já perdeu um lugarzinho no Governo para o qual trabalhou a vida inteira arduamente e com inúmeros sacrifícios pessoais.
Como é sabido, apesar do seu espírito de missão e de sacrifício pelos superiores interesses do País não quis, como afirmou, deixar de procurar o conhecimento e assim inscreveu-se num curso universitário no qual se empenhou na medida das suas poucas disponibilidades devido ao ter de cuidar dos interesses do País.
É verdade que só a genialidade do "Dr". Relvas lhe permitiu aceder em um ano ao conhecimento que pessoas normais demoram três anos a conseguir, mas isso apenas demonstra a sua excepcional capacidade.
Assim sendo, espero e desejo, trata-se da mais elementar justiça, que não venham a considerar nulo o grau de "Dr." com que generosa mas justamente a Universidade Lusófona quis agraciar o "Dr." Relvas.
Aliás, estou mesmo convencido que o grau de "Dr." lhe foi atribuído contra a sua vontade, um homem do seu arcaboiço ético não aceitaria uma benesse desta natureza.
Espero, pois, que o deixem continuar "Dr.", é que podemos falar do Sr. Relvas ... mas não é a mesma coisa.

UM NOVO PROGRAMA DE MATEMÁTICA QUE, DE NOVO, PARECE TRAZER .... PROBLEMAS (take 2)

No Público aparece um trabalho interessante sobre as diferentes perspectivas no ensino da Matemática, designadamente no que respeita aos princípios e conteúdos dos Programas. Na peça são apresentadas as diferenças que, de acordo como alguns especialistas informam o programa novo e o programa em vigor que se ilustram, por exemplo, com diferentes concepções sobre o papel da compreensão e da memorização na aprendizagem da matemática. Não sendo especialista procuro acompanhar a questão dada a sua óbvia relevância.
Recordo que quando foi colocado em discussão um novo Programa de Matemática, o Ministro Nuno Crato ter sustentado a iniciativa com a “grande liberdade metodológica aos professores”, para ensinarem de acordo com“ a sua experiência, as suas técnicas e a sua sala de aula” face a um programa moderno e com "objectivos mais facilmente perceptíveis". O Ministro insistiu que "a ideia foi sempre dar esta liberdade metodológica”, para que cada docente fique livre de definir o seu próprio método de ensino dos diversos conceitos. Muito bem. Confesso que me pareceu, escrevi na altura, um pouco estranha a afirmação, como se as opções didácticas e pedagógicas de profissionais cientificamente preparados fossem determinadas pelo Ministério, algo que até no plano ético e deontológico é discutível. Ainda assim e à cautela, fica bem agradecer ao MEC a "liberdade" concedida aos professores.
Voltando às metodologias, no Documento que esteve em discussão lia-se no ponto 6, "Tendo em consideração, tal como para os níveis de desempenho, as circunstâncias de ensino (de modo muito particular, as características das turmas e dos alunos), as escolas e os professores devem decidir quais as metodologias e os recursos mais adequados para auxiliar os seus alunos a alcançar os desempenhos definidos nas Metas Curriculares.
A experiência acumulada dos professores e das escolas é um elemento fundamental no sucesso de qualquer projeto educativo, não se pretendendo, por isso, espartilhar e diminuir a sua liberdade pedagógica nem condicionar a sua prática letiva. Pelo contrário, o presente Programa reconhece e valoriza a autonomia dos professores e das escolas, não impondo portanto metodologias específicas.
Sem constituir ingerência no trabalho das escolas e dos professores, nota-se que a aprendizagem matemática é estruturada em patamares de crescente complexidade, pelo que na prática letiva deverá ter-se em atenção a progressão dos alunos, sendo muito importante proceder-se a revisões frequentes de passos anteriores com vista à sua consolidação." Seguia-se a orientação para que não se use a calculadora.
Registe-se de novo a enorme preocupação com a liberdade metodológica dos professores e um texto que ... não diz nada, ou seja, um bom exemplo do que o Ministro Crato designava por eduquês.
O que continuo com uma enorme dificuldade em entender é como é que esta retórica sobre "liberdade metodológica", "características das turmas e dos alunos", "autonomia dos professores e das escolas, "revisões frequentes", etc., se torna compatível com um definição de metas curriculares que para Português e Matemática no 1º ciclo correspondem a 177 objectivos e 703 descritores que estabelecem o que os alunos deverão imprescindivelmente revelar, “exigindo da parte do professor o ensino formal de cada um dos desempenhos referidos nos descritores”. Acontece ainda que, de uma forma geral e decorrente da agregação de escolas os professores trabalharão com turmas lotadas, 24 alunos.
O ensino tenderá a transformar-se na gestão de uma espécie de "check list" das metas estabelecidas implicando a impossibilidade de acomodar as diferenças, óbvias, entre os alunos, os seus ritmos de aprendizagem o que culminará, antecipa-se, com a realização de exames todos os anos.
Apesar do MEC acenar com a referência aos modelos anglo-saxónicos como selo de qualidade, o que está longe de acontecer, devo confessar que estou apreensivo tal como os autores do Programa de Matemática que estava em vigor, a Sociedade Portuguesa de Investigação em Educação Matemática e a Associação Nacional dos Professores de Matemática, que, tal como é referido na peça do Público, continuam a manifestar fortíssimas reservas face ao novo Programa, alertando para o risco de retrocesso nos resultados positivos que os últimos dados dos estudos comparativos internacionais demonstraram utilizando um programa que estava agora a terminar a sua fase de generalização e era de apenas de 2007.
Também a Sociedade Portuguesa de Matemática, afirmou no início que só se justificaria a revogação do programa de Matemática se "nesta altura, se tiver sido detectada alguma impossibilidade legal de aplicar as metas curriculares no próximo ano lectivo”, o que não parecia verificar-se produzindo-se assim uma desnecessária turbulência. No entanto, no seu parecer, esta entidade, a que Nuno Crato já presidiu, veio a entender que a utilização do novo Programa “será decisiva para que se atinja um patamar de exigência mais elevado, cujas consequências benéficas serão, a prazo, sentidas pelos níveis de ensino secundário e superior, e pela sociedade portuguesa em geral” numa evolução interessante de apreciação.
Dada a habitualmente assumida infalibilidade e a arrogante genialidade do MEC que escondem alguma ignorância e uma agenda ideológica, embrulhadas em palavras como rigor, exigência as mudanças, também nesta matéria, os ventos do tempo, fazem o seu caminho construindo um modelo de educação que produzirá exclusão, quer dos professores, por umas razões, quer de muitos alunos que serão direccionados para o ensino dual em modo Crato e entrarão bem cedo nas fábricas previstas na prometida “reindustrialização” do país.
Restará o pequeno grupo que constituirá a elite e assim se cumprirá a visão de escola desta gente.

ESTUDAR É CARO, MUITO CARO

Ainda de acordo com o Relatório da OCDE, Education at a glance 2013, que também ontem referi, Portugal é um dos países europeus em que a frequência de ensino superior mais depende do financiamento das famílias, cerca de 31% dos gastos de universidades e politécnicos. A média da OCDE é 32% e a da União Europeia (UE) 23,6%.
Esta informação não é nova. Na verdade e como é do conhecimento das pessoas mais perto deste universo, o ensino superior, Portugal, contrariamente ao que muitos afirmam, tem um dos mais altos custos de propinas da Europa. Conforme dados de 2011/2012 a rede Eurydice, Portugal tem o 10º valor mais alto de propinas na Europa mas se se considerarem as excepções criadas em cada país, temos na prática o terceiro custo mais alto no valor das propinas.
Em 2012 foi divulgado um estudo realizado pelo Instituto de Educação da Universidade de Lisboa que contribui para desmontar um equívoco que creio instalado na sociedade portuguesa. Comparativamente a muitos outros países da Europa, Portugal tem um dos mais altos custos para as famílias para um filho a estudar no ensino superior, ou seja, as famílias portuguesas fazem um esforço bem maior, em termos de orçamento familiar, para que os seus filhos acedam a formação superior. Se considerarmos a frequência de ensino superior particular o esforço é ainda maior.
Tem vindo a ser regularmente noticiada a desistência da frequência dos cursos por muitos alunos que, por si, ou os respectivos agregados familiares não suportam os encargos com o estudo. Sabe-se também dos constrangimentos na atribuição de bolsas de estudo.
Segundo um estudo da Universidade do Porto, quase um quarto dos seus alunos abandona o curso durante os três primeiros anos. Os números dos diferentes cursos têm variações acima ou abaixo do valor médio, mas são muito elevados. Embora existam outros factores contributivos, as dificuldades económicas parecem constituir a razão fundamental para esta enorme taxa de abandono.
Também um inquérito envolvendo estudantes de todo o país coordenado pela Associação Académica da UTAD, apurou que 48% dos inquiridos já passaram por dificuldades económicas e cerca de 65% temem abandonar o curso em consequência das dificuldades.
Recordo ainda um trabalho recente realizado pelo Público junto de um grupo significativo de estabelecimentos de ensino superior, em que se constatou que, face a igual período do ano passado, aumentou 6% o número de desistências do ensino superior por efeitos da crise. Esta percentagem corresponde a cerca de 3300 estudantes o que é significativo. As dificuldades económicas, a dificuldade no acesso a bolsas e o aumento de propinas são os motivos identificados.
As dificuldades pelas quais passam muitos estudantes do ensino superior e respectivas famílias, quer no sistema público, quer no sistema privado, são, do meu ponto de vista, considerados frequentemente de forma ligeira ou mesmo desvalorizadas. Tal entendimento parece assentar na ideia de que a formação de nível superior é um luxo, um bem supérfluo pelo que ... quem não tem dinheiro não tem vícios.
Neste quadro, a redução significativa das bolsas e apoios, as dificuldades enormes que muitas famílias atravessam e o desemprego mais elevado entre os jovens, que poderia constituir uma pressão para continuar os estudos, as elevadas propinas, designadamente no 2º ciclo, tornam ainda mais difícil a realização de percursos escolares que promovam mobilidade social e que se traduzem, por exemplo, no aumento das desistências.
Considerando tal como Relatório refere, o ainda baixo nível de qualificação da população portuguesa e quando se espera e entende que a minimização das assimetrias possa, também, depender da educação e qualificação, o seu preço e as dificuldades actuais, longe de as combater, alimenta-as.
É preocupante.
 

TEMPO DE FÉRIAS ESCOLARES

Umas notas minhas no Público sobre o tempo de férias escolares que se aproxima.

A CRISE QUANDO NASCE NÃO É PARA TODOS

Nem só de más notícias se fazem estes dias de chumbo.
É bom saber que num país condenado ao salvífico empobrecimento que lhe vai garantir os amanhãs que cantam, alguns portugueses contrariam este destino e não acreditam na salvação pela pobreza.
Segundo o Diário Económico o número de milionários em Portugal subiu 3.4% em 2012.
Será isto a que chamam a retoma do crescimento?

EI-LOS QUE PARTEM, VELHOS E NOVOS, BUSCANDO A SORTE NOUTRAS PARAGENS



Segundo um relatório da Comissão Europeia, um em cada quatro portugueses, se tivesse hipótese, mudava-se para outro país de modo permanente e um em cada cem planeia partir nos próximos doze meses.
Esta vontade, imposição, de partir tem vindo a sustentar o aumento exponencial dos fluxos  migratórios.
Segundo dados recentes da OCDE a emigração de portugueses para países fora da União Europeia  aumentou mais do triplo entre 2010 e 2011, sendo que a organização estima que os números pequem por defeito.
Há poucas semanas a imprensa divulgou a realização de um estudo internacional com o objectivo de conhecer e caracterizar o fenómeno crescente da emigração, sobretudo entre os mais jovens. O estudo envolverá Portugal, Grécia, Espanha e Irlanda, países profundamente atingidos pela crise económica, a passar  por severos programas políticos de austeridade e com níveis devastadores de desemprego.
Em Janeiro, o Secretário de Estado das Comunidades afirmava que nos últimos dois anos terão emigrado cerca de 200 000 portugueses, estimando que em 2013 os números sejam da mesma ordem de grandeza.
É também conhecido que, a par da Irlanda, somos o país de onde sai gente com maior qualificação o que exige ainda maior reflexão pelas consequências previsíveis.
Somos um país de emigrantes de há séculos pelo que este movimento de partida, só por si, não será de estranhar. No entanto, creio que é preocupante constatarmos que durante muitos anos a emigração se realizava na busca de melhores condições de vida, a agora a emigração realiza-se à procura da própria vida, muita gente, sobretudo jovens não tem condições de vida, tem nada e parte à procura, não de melhor, mas de qualquer coisa.
Este vazio que aqui se sente é angustiante, sobretudo para quem está começar, se sente qualificado e com o desejo de construção de um projecto de vida viável e bem sucedido.
Alguns inquéritos junto de estudantes universitários mostram como muitos, a maioria, admite emigrar em busca de melhores condições de realização pessoal e profissional apesar de muitos afirmarem que pretendem voltar.
Lembramo-nos ainda de intervenções de incentivo à emigração qualificada, posteriormente negadas e forma despudorada, por Passos Coelho e do Ex-Ministro Miguel Relvas dirigidas, por exemplo, a professores e jovens qualificados.
Parece-me relativamente claro que a questão central nesta matéria não é o movimento que desde há muito os portugueses realizam de procurar trabalho fora do país, trata-se também da construção de um projecto de vida auto-determinado. Sabemos, aliás, que é desejável em diferentes perspectivas, que estes fluxos se realizem.
O que me parece fortemente significativo é o que representa de descrença de tanta gente, de que seja possível desenvolver um projecto de vida viável e com potencial de realização pessoal e profissional no nosso país.
Nesto contexto, como tenho referido, as declarações dos responsáveis políticos assumem particular importância. Não podem assumir que a solução para os problemas das pessoas, por exemplo o desemprego, é abandonar o país, particularmente um país, Portugal, com sérias necessidades de mão-de-obra qualificada, um dos mais baixos níveis de qualificação da Europa e um dos grandes obstáculos ao nosso desenvolvimento, não pode acenar com a “sugestão” de emigração exactamente para a franja mais qualificada da nossa população. Trata-se uma visão absolutamente inaceitável.
Muita desta gente parte com amargura de uma terra, a sua, onde sentem que não cabem e o futuro … é um sonho impossível.
"Virão um dia ricos ou não ... virão um dia ou não."

terça-feira, 25 de junho de 2013

É PARA TEU BEM

Devias fazer assim ... é para teu bem.
Não podes fazer isso ... é para eu bem.
Tens que aprender isto ... é para teu bem.
Tens que falar de outra maneira ... é para teu bem.
Está com atenção ... é para teu bem.
Não devias pensar nessas coisas ... é para teu bem.
Devias evitar andar com aqueles teus amigos ... é para teu bem.
Essas coisa não servem para nada, devias preocupar-te com outras ... é para teu bem.
Às vezes preciso de me zangar contigo  ... é para teu bem.
Nem pensar, estás proibido ... é para teu bem.
Se te castigaram é porque fizeste alguma ... é para teu bem.
Precisas de aprender com as dificuldades ... é para teu bem.
Tens que aguentar ... é para teu bem.
Agora não percebes, mas um dia vais compreender que tudo isto é para teu bem.
...
E eu? E até lá? E que é que aconteceu com vocês que não estão bem? Não vos explicaram o tudo que era para o vosso bem?

UM SEMI-ACORDO

Uma das mensagens na área das vendas que acho muito interessante, é a referência à venda de carros em estado “semi-novo” algo que não sei como definir, o carro não é novo mas também não é velho e temos a velha diferença ente o optimista e o pessimista que olham para o copo de água, um vê-o meio cheio, o outro … meio vazio.
Serve esta bizarra introdução para me referir à inexistência de acordo entre o MEC e os sindicatos dos professores. Na verdade, parece que não existe um acordo mas, por outro lado, algumas coisas foram acordadas, isto é, chegou-se a um semi-acordo.
Do meu ponto de vista, a coisa não é de estranhar. O MEC nunca estaria na disponibilidade de rever significativamente as suas posições sobre mobilidade, despedimentos e horários e os sindicatos começam a sentir a dificuldade aguentar um braço de ferro interminável e com custos sociais que progressivamente se tornam mais pesados.
Assim, estabelecem-se alguns aspectos que me parecem positivos, a consideração do trabalho de direcção de turma como trabalho lectivo, embora, é minha convicção,ainda se justificasse algum aligeirar do trabalho de natureza mais burocrática exigido aos directores de turma, a consideração também como trabalho lectivo, das substituições, coadjuvações e apoios a alunos para todos os professores, deixando assim de discriminar inaceitavelmente os professores com “horário zero”, já de si uma situação insustentável.
Lateralmente, também me parece que os ajustamentos no calendário escolar o tornaram mais equilibrado.
De tudo isto resulta a ideia de que não se pode lançar fumo branco pela chaminé da 5 de Outubro, não há acordo, mas a greve às avaliações termina, e como se espera, os actores envolvidos vão tentar, da melhor forma que conseguirem, capitalizar alguns dividendos deste semi-acordo na lógica dos seus interesses.
Creio que no plano imediato, os miúdos vão beneficiar de um período de maior estabilidade mas continuo muito preocupado com os efeitos do conjunto de políticas em curso.
Dito de outra maneira, com o fim da greve às avaliações dir-se-á que os alunos já não estão a ser prejudicados, o discurso dos optimistas, mas continuo convencido de que eles estão a ser seriamente prejudicados por estas políticas, o discurso dos pessimistas, como eu.

PÃOZINHO SEM SAL, VAI SER ELOGIO

Pois é, mudam-se os tempos mudam-se as vontades. Durante muitos anos "pãozinho sem sal" era algo de negativo, ninguém queria ser um "pãozinho sem sal". Então quando era uma rapariga a achar que éramos um "pãozinho sem sal", a auto-estima ficava de rastos. Agora, parece, "pãozinho sem sal" vai tornar-se elogio, significará certamente alguém de saudável, com bom senso e com o "tempero" adequado. Para muitos virá tarde a mudança.
Mais a sério, a regulamentação de matérias que impliquem comportamentos no chamado estilo de vida, consumo de álcool e tabaco são bons exemplos, despertam sempre alguma reactividade e alguns discursos que referem o excesso de intromissão em áreas que consideram do foro das liberdades individuais. Entendo os discursos mas compreendo e aceito que comportamentos que se transformam em grandes problemas de saúde pública possam ser objecto de regulação sem ferir os direitos e liberdades individuais.
Serve esta introdução para referir que me parece positiva a definição já estabelecida nos limites no uso do sal para fazer o pão, dado os níveis de consumo de pão na dieta dos portugueses e o volume de sal nele incorporado e a continuação dos esforços de promoção da diminuição do consumo. Com efeito, o consumo de sal em Portugal é altíssimo e uma causa conhecida e reconhecida de seriíssimos problemas de saúde, consumidos o dobro, cerca de 10 gramas, do limite recomendado pela Organização Mundial de Saúde. É evidente que o pão não é a única fonte do excesso de sal o que significa a necessidade de iniciativas e programas que previnam e promovam, com bom senso e sem fundamentalismos, estilos e hábitos que nos proporcionem melhor qualidade de vida. Daí o desenvolvimento agora anunciado da Estratégia para a Redução do Consumo do Sal na Alimentação em Portugal apresentada pela Direcção-geral de Saúde.
Gostei do nome embora seja, por assim dizer, um bocado insosso.

A EDUCAÇÃO EM PORTUGAL. Alguns dados, os preconceitos e desconhecimento

Por coincidência, no meio de um processo de forte contestação dos professores às medidas de política educativa e durante o qual se verificaram quer por parte da tutela, quer por parte de alguns opinadores, discursos procurando diabolizar a classe promovendo uma imagem de classe privilegiada, incompetente e pouco trabalhadora, surge o habitual relatório da OCDE Education at a Glance 2013, relativo a 40 países, no qual vale a pena reflectir.
Neste espaço, alguns dados e notas breves.
Os salários dos professores portugueses subiram mais do que a média dos países considerados até 2011, embora seja de considerar a base de partida. O Relatório refere-se a dados de 2011, antes dos efeitos mais gravosos dos cortes salariais, mas em 2011 um professor do 3.º ciclo com 15 anos de experiência ganhava cerca de 39424 dólares anuais brutos, a média da OCDE é de 39934 e no Luxemburgo, o país com salário maior, cerca de 100 000 dólares.
Ainda no que respeita a salários, no início da carreira e no topo da carreira, o salário de um professor português é, em geral, superior ao da média da OCDE sendo mais baixo nas fases intermédias. Como se sabe poucos professores estão a entrar no sistema e no actual topo de carreira , o 10º escalão não se encontra nenhum docentes dadas as modificações verificadas nos últimos anos.
No que respeita à carga horária lectiva esta também cresceu em Portugal. No secundário os professores passam 774 horas anuais com os alunos em sala de aula, mais 110 horas que a média. Aliás, de 2005 a 2011, o tempo lectivo tem vindo sempre a aumentar, no 1º ciclo subiu 65 horas por ano, 210 no 3º ciclo e 265 no secundário. Assim, à excepção da educação pré-escolar, os docentes portugueses estão mais tempo com os alunos que a média verificada na OCDE.
Uma nota ainda sobre um aspecto que se tem prestado a equívocos também alimentados por discursos, por exemplo do Ministro Nuno Crato, a dimensão das turmas e o rácio professor/alunos em Portugal.
Segundo o Relatório, em 2011 no ensino básico a média de alunos por turma era de 19 contra 21 da média da OCDE. Com sabe quem conhece as escolas, a política de construção de agrupamentos e mega-agrupamentos e a decisão de aumento do número de alunos por turma alterou substantivamente este quadro.
No que respeita ao rácio professor alunos apenas na educação pré-escolar o número de crianças por educador era superior à média da OCDE, 16 e 14 respectivamente. No 3º ciclo, em Portugal o rácio é um professor para 7,7 alunos e na OCDE de um para 14 alunos. Este número presta-se a grandes equívocos e ao argumento dos professores a mais. Na verdade, sabe-se  que os modelos de organização e funcionamento das escolas deslocam milhares de horas de professores para tarefas de natureza administrativa e burocrática em estruturas e funções que contribuem para que em 2011 o cenário fosse aquele mas que na verdade os professores têm turmas enormes e muitas turmas todos os dias à sua frente.
Finalmente, no que respeita aos professores, sublinhar algumas considerações do Relatório sobre a necessidade de valorizar a classe docente no sentido de garantir pessoas qualificadas competentes e empenhadas, o contrário do que se tem verificado entre nós. Uma referência ainda para o impacto da dimensão das turmas na qualidade do ensino sendo que este dado é particularmente relevante no contexto actual em Portugal.
Um outro aspecto que merece reflexão face a muitos discursos que merecem acolhimento na comunicação social e que de uma forma leviana e desajustada "vendem" a imagem de que somos um "país de doutores" e que estudar não compensa.
Do Relatório da OCDE releva, como sempre tenho afirmado, que Portugal continua a ser um dos países em que mais compensa a qualificação superior apesar dos constrangimentos do mercado de emprego, que já aqui tenho abordado. De facto, um trabalhador com qualificação superior pode aspirar a um salário 70% superior ao de uma pessoa com qualificação ao nível do secundário.
O Relatório sublinha ainda a necessidade de continuar a combater os baixos níveis de escolaridade, bem como de acentuar os progressos significativos que foram feitos nos últimos anos e que os estudos comparativos internacionais atestam as que, do meu ponto de vista, a PEC - Política Educativa em Curso ameaça.
Como me parece claro, este retrato, necessariamente breve, não suporta boa parte dos discursos produzidos sobre os professores que relevam, já o tenho escrito, do desconhecimento, do preconceito e de agendas menos explícitas que contaminam o universo da educação em Portugal.

segunda-feira, 24 de junho de 2013

VÁ PARA FORA CÁ DENTRO, EM MODO CRATO

"O secretário da Administração Escolar garantiu nesta segunda-feira que nenhum professor será colocado além de 60 quilómetros da escola onde é efectivo, alterando o que estava definido até agora, que previa que alguns docentes fossem colocados a 200 quilómetros.", no Público.
Ainda assim e como seria previsível mantém-se a intenção da mobilidade especial, perdão da requalificação, (no caso dos professores a requalificação é uma ideia delirante), perdão do despedimento. Desculpem, já me esquecia, existem uns milhares de professores a ser empurrados para situação de reforma pelo que sempre se arranjarão uns lugarzinhos.
Por outro lado e sobre esta matéria, o Dr. Casanova e outros responsáveis, incluindo o Ministro, já disseram tudo e o seu contrário.
É melhor esperar para ver como evolui este "vá para fora cá dentro" em modo Crato.

VAI VOLTAR TAMBÉM A LICENÇA DE USO DO ISQUEIRO

O Governo prepara uma proposta no sentido de controlar a produção de graffitis ou a afixação de cartazes, bem como outras formas usadas na modificação de paredes ou equipamentos diversos  no universo da chamada arte urbana.
Devo confessar que me desagradam profundamente os atentados que se verificam em muitas zonas urbanas em que as pinturas e ou mensagens não têm rigorosamente a ver com produção de natureza artística ou a divulgação de mensagens políticas, assim como a sobreutilização de cartazes a divulgar tudo e mais alguma coisa e que constituem focos de poluição visual  que devem ser regulados para prevenir o vandalismo que, naturalmente, deve ser prevenido e combatido.
Também me parece que em algumas circunstâncias, a linha que separa o aceitável do não aceitável é ténue e de difícil definição, dada a enorme carga de subjectividade envolvida. Também não me parece ajustado colocar no mesmo plano a afixação de cartazes e a pintura ou a escrita, por exemplo.
Dito isto, também acho absolutamente escandaloso que património público seja negligenciado e maltratado pelo próprio estado. São múltiplos os exemplos de edifícios de interesse e valor arquitectónico ou cultural que estão em degradação acentuada por responsabilidade de quem agora quer "proteger" as fachadas e espaços públicos.
Por outro lado, sinais dos tempos, acentua-se a tentação de tudo regular e burocratizar numa ansia de controlo sobre os comportamentos dos cidadãos que se torna asfixiante. A utilização do graffiti ou de  mensagens deixadas numa parede são parte integrantes da vida urbana e muitas vezes cumprem uma função social relevante em termos de inovação cultural ou de envolvimento cívico de formas não integradas nos modelos dominantes.
É difícil imaginar um processo administrativo de apresentação às "entidades competentes" de um projecto de graffiti ou mensagem a inscrever numa parede, com "autorização expressa do proprietário", sendo que com frequência estas intervenções ocorrem em estruturas abandonadas, assente numa série de documentação, que será analisada pelos "serviços" e que certamente de forma rápida poderão autorizar, ou não, a intervenção, dependendo, naturalmente, dos critérios a definir. Delirante. Creio que a consequência é a situação ... continuar como está e surgirem de quando em vez umas multas inconsequentes.
No entanto, pode acontecer que a seguir venha, de novo, a licença para usar o isqueiro de que ainda me lembro. Tem ainda a não despicienda vantagem de ser mais uma fonte de receita.
 

QUEM PARTE E REPARTE ...

O Dr. Paulo Braga Lino foi afastado pelo Governo das funções de Secretário de Estado da Defesa pelo facto de enquanto director da empresa Metro do Porto ter celebrado uns contratos em matéria financeira, os agora tão famosos "swaps", de natureza potencialmente lesiva para os interesses da empresa.
É uma decisão que se entende embora se estranhe a aparente desigualdade de tratamento na manutenção da Secretária de Estado do Tesouro, Maria Luís Albuquerque, que adoptou o mesmo procedimento quando exercia funções na Refer.
O que é mais interessante é que o Dr. Paulo Braga Lino regressou ao trabalho, felizmente para ele, e teve imensa sorte, consegiu um lugarzinho justamente na empresa Metro do Porto. É assim uma história que acaba bem.
Uma outra história interessante é a do Sr. Dr. João Coutinho que vai, por indicação do Governo, regressar à comissão executiva do grupo Caixa Geral de Depósitos de onde, curiosamente, tinha saído há dez anos com uma indemnização de mais de 500 mil euros. Notável.
É assim a dança das cadeiras no Portugal dos Pequeninos.
Como diz o povo "quem parte e reparte e não fica com a melhor parte, ou é tolo ou não tem arte". Na verdade, esta gente é artista.
Será isto a que chamam os activos tóxicos?

domingo, 23 de junho de 2013

A HISTÓRIA DAS GRAVATAS

Um dia destes, ou uma noite destas, não me lembro se foi a sonhar a dormir se foi a sonhar acordado, vejo-me, não sei porque razão, a assistir a uma reunião onde se discutiria os destinos do mundo.
Tanto quanto consigo recordar, estavam os responsáveis pelos países donos da globalização, não estavam os representantes dos países globalizados, e estavam pessoas das instituições globalizantes, grandes empresas e organizações. Coisa importante mesmo e eu meio perdido sem perceber porque estava ali.
Quando começaram os trabalhos, procurei seguir com atenção o que iria acontecer, sempre se tratava de decidir o que fazer com o mundo.
Desde o início que estava com uma sensação estranha, havia qualquer coisa que não estava bem. De repente percebi, aquelas figuras, todas elas, eram apenas fatos, cinzento ou azul-escuro, com uma gravata. Era assim mesmo, não se via corpo algum dentro dos fatos e eram as gravatas que falavam.
Entretanto, também percebi que a linguagem utilizada pelas gravatas era estranha, indecifrável. Já aflito, levantei-me e procurei interromper a reunião mas as gravatas continuavam a falar sem eu as entender, até que duas fardas sem polícia dentro me tiraram da sala e eu despertei.
Desde então, fico inquieto sempre que me lembro do mundo a ser dirigido por uma mão cheia de gravatas sem cabeça dentro e a falar uma linguagem que ninguém entende.

PRECÁRIA DE VIDA

O Público de hoje apresenta um trabalho tão interessante quanto inquietante sobre o desemprego jovem e a precariedade que caracteriza o mercado de emprego dos mais jovens. Algumas notas a propósito.
Em Portugal o desemprego jovem atingiu o devastador nível de 42,5% sendo que a média na UE em 2012 é de 22,9%. Em Janeiro e segundo EUROSTAT, Portugal era o quinto país europeu, dos 21 considerados, em que mais jovens entre os 25 e os 24 vivem com os pais, 46 %. Para comparação, Dinamarca, Suécia e Finlândia têm percentagens inferiores a 5 %.
Na verdade e em termos gerais, os mais jovens estão numa situação particularmente difícil. Segundo um Relatório da Comissão Europeia, há meses divulgado, Portugal terá cerca de 260 000 jovens entre os 15 e 29 anos que não estudam, não trabalham e nem estão a receber formação, a designada situação “nem, nem”. No entanto, dados da mesma altura vindos do INE referiam 314 000 jovens nesta situação. Este cenário não é mais grave porque 100 000 jovens, sobretudo qualificados, estão a sair do país, emigrando para outras paragens e tem um custo brutal, cerca de 2 700 milhões de euros, 1,57 % do PIB. A emigração parece assim constituir-se como via quase exclusiva para aceder a um futuro onde caiba um projecto de vida positivo e viável como tem vindo a verificar-se.
Acresce que de acordo com um Relatório da Organização Internacional do Trabalho em 2011, 56 % dos jovens portugueses com trabalho têm contratos a prazo. Há algum tempo uma informação do Banco de Portugal referia que em cada dez empregos novos para jovens, nove são precários. Por outro lado, a taxa de desemprego entre os mais novos ronda os 36 %, a terceira taxa mais alta da UE.
Segundo um estudo da CGTP, 51% dos jovens com menos de 25 anos ganha menos de 500 € e 24,5% dos jovens entre os 25 e os 35 recebe também menos de 500 €. Este cenário evidencia a enorme precariedade do trabalho e baixa qualificação do mesmo.
A precariedade nas relações laborais quase duplicou na última década. Portugal é o segundo país da Europa, a seguir à Polónia, com maior nível de contratos a prazo. Por outro lado, as políticas de emprego em curso incluem maior flexibilização das relações laborais o que, naturalmente, é coerente com os ventos neo-liberais e o endeusamento do mercado que tudo permite, incluindo roubar a dignidade às pessoas e promover exclusão.
Deste cenário e dos números do desemprego, resulta que os mais novos à entrada no mercado de trabalho são os mais vulneráveis ao desemprego e à precariedade quando, apesar das dificuldades, acedem a algum emprego.
Esta situação complexa e de difícil ultrapassagem tem, obviamente, sérias repercussões nos projectos de vida das gerações que estão a bater à porta da vida activa. Entre outras, contar-se-ão, os dados conhecidos mostram-no, o retardar da saída de casa dos pais por dificuldade no acesso a condições de aquisição ou aluguer de habitação própria ou o adiar de projectos de paternidade e maternidade que por sua vez se repercutem no inverno demográfico que atravessamos e que é uma forte preocupação no que respeita à sustentabilidade dos sistemas sociais. As gerações mais novas que experimentam enormes dificuldades na entrada sustentada na vida activa, vão também, muito provavelmente, conhecer sérias dificuldades no fim da sua carreira profissional.
No entanto, um efeito muito significativo mas menos tangível desta precariedade no emprego, é a promoção de uma dimensão psicológica de precariedade face à própria vida no seu todo e que, com alguma frequência, os discursos das lideranças políticas acentuam. Dito de outra maneira, pode instalar-se, está a instalar-se, uma desesperança que desmotiva e faz desistir da luta por um projecto de vida de que se não vislumbra saída motivadora e que recompense.
Este problema que não é um exclusivo português, longe disso, exige uma visão e um conjunto de políticas que não se vislumbram e cuja ausência compromete a construção sustentável do futuro.
Podemos estar perante a tragédia das gerações perdidas de que há algum tempo se falava.

ARROGÂNCIA E PRECONCEITO. O ódio aos professores

Um dos mais conhecidos e prolíficos palpitólogos do reino, o Dr. Miguel Sousa Tavares, desenvolveu ao longo do tempo, vá lá saber-se porquê, um ódio de estimação pelos professores, assim mesmo, pela classe dos professores.
Assim sendo e como oportunidades não faltam para perorar a quem tem tanto para dizer, o Dr. Tavares vai produzindo regularmente umas prosas em que procura arrasar uma classe de preguiçosos, incompetentes, privilegiados e improdutivos profissionais que, apesar deste conjunto de "virtudes", de uma política educativa que tem sido dirigida para números e não para pessoas e é submersa pela incompetência política e pela deriva dos interesses partidários, tem conseguido trazer os alunos portugueses para níveis de resultados bem mais aceitáveis como comprovam os estudos internacionais e, certamente por milagre, terão dado o seu modesto contributo para a formação da tão apregoada mais qualificada geração de portugueses, que lamentavelmente tem de partir à procura de um futuro que por aqui não encontra.
Como seria previsível, a greve de dia 17 foi o último pretexto para mais uma catilinária contra os professores. Nada de novo na escirta, a arrogância habitual, a ignorância habitual, os preconceitos habituais, enfim, o habitual discurso conclusivo e sem dúvidas de quem nunca se engana.
O que já me admira um pouco é que aparecem sempre algumas pessoas, professores naturalmente, que se sentem indignadas pelo tratos do Dr. Tavares e tentam responder, claro que sem visibilidade, mais frequentemente através das mais acessíveis mas nem sempre virtuosas redes sociais, ou suportes da mesma natureza, e umas cartas ao Director que alguns jornais lá vão publicando como aconteceu com o Expresso desta semana e que me levou a estas notas.
Nestas iniciativas, os autores tentam rebater com empenho e seriedade, com números, com dados, com factos, as enormidades ignorantes e preconceituosas do Dr. Tavares e é isso que me admira. Estes registos não não compatíveis, ou seja, um discurso assente em preconceito, em definitivos juízos de valor, em achismos, em ignorância, é, obviamente, imune a uma resposta que não seja no mesmo registo e por isso nada se altera. Se por acaso o Dr. Tavares lesse algumas das respostas que se conhecem, concluiria, evidentemente, que estava tudo errado porque sim, porque ele é que está certo. Ponto.
No entanto, tal como fazem com os seus alunos, os bons professores, a grande maioria, não desistem e vão tentando que o Dr. Sousa Tavares saiba alguma coisa deste mundo dos professores e das escolas para além da sua experiência pessoal que nos deu a conhecer no Expresso. 
Não há saco.