sábado, 29 de dezembro de 2012

O SILÊNCIO DO CORO DOS ESCRAVOS

A imprensa de hoje dá relevo a uma matéria que é de há alguns anos conhecida no Alentejo e que tem vindo, por várias razões, a aumentar, a situação de escravatura em que caiem muitos cidadãos estrangeiros, designadamente romenos, “contratados” por redes mafiosas do seu país que os sub-alugam para a apanha da azeitona que, com o incremento da plantação intensiva no Alentejo, exige mão-de-obra insuficiente na região.
Cada vez são mais frequentes situações inaceitáveis de exploração e maus tratos como hoje são notícia.
Este cenário, o tráfico de pessoas e a escravatura, tal como a fome, é das matérias que maior embaraço pode causar em sociedades actuais e deveria ser algo de improvável no séc. XXI em sociedades desenvolvidas.
A escravatura parece algo “fora do tempo” e de impossível existência nos nossos países, estamos a falar da Europa. Mas existe e é sério o problema que, como não podia deixar de ser, atinge os mais vulneráveis.
Este negócio, o tráfico de pessoas, um dos mais florescentes e rentáveis em termos mundiais, alimenta-se da vulnerabilidade social, da pobreza e da exclusão o que, como sempre, recoloca a imperiosa necessidade de repensar modelos de desenvolvimento económico que promovam, de facto, o combate à pobreza e, caso evidente em Portugal, às escandalosas assimetrias na distribuição da riqueza. Também por isso, são recorrentes as notícias de portugueses usados como escravos em explorações agrícolas espanholas ou redes de contratação de trabalhadores da construção civil para países do primeiro mundo europeu, como o Holanda, Bélgica ou Reino Unido.
Estes tempos, marcados por competição, diminuição de direitos e apoios sociais, pressão sobre a produtividade. Tudo isto é submetido a um deus mercado que não tem alma, não tem ética e é amoral e pode alimentar, sem particulares sobressaltos, algumas formas de escravatura mais "leves" ou, sobretudo em casos de particular fragilidade dos envolvidos, bastante pesadas.
As pessoas, muitas pessoas, apenas possuem como bem, a sua própria pessoa e o mercado aproveita tudo, por isso, compra e vende as pessoas dando-lhe a utilidade que as circunstâncias, a idade, e as necessidades de "consumo" exigirem.
O que parece ainda mais inquietante é o manto de silêncio e negligência, quando não cumplicidade, que frequentemente cai sobre este drama tornando transparentes as situações de escravatura, não se vêem, não se querem ver.
Neste universo não conseguimos ouvir o coro dos escravos, não têm voz. 

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