O universo da educação em Portugal tem como
característica marcante, entre outras, um estado de ruído quase permanente.
Hoje as águas agitam-se pela notícia publicada no DN de que o Governo tem a
intenção de entregar às autarquias boa parte das competências que ainda possui,
sendo que até ao 12º as autarquias assumiriam a responsabilidade por docentes e
não docentes. O município de Cascais serviria de teste e a Universidade Católica
e a Universidade Nova avaliarão a operacionalização da mudança e os custos
envolvidos.
De há muito que venho a defender, como boa parte
das pessoas mais atentas ao universo da educação, que a autonomia das escolas é
uma ferramenta indispensável ao seu desenvolvimento.
Apesar de alguns avanços verificados nas últimas
décadas, o nosso sistema educativo permanece excessivamente centralizado,
inibindo a necessidade de que as escolas possuam um quadro legal que sustente a
sua organização, funcionamento e recursos adequados a especificidades
contextuais que modelam realidades educativas bem contrastadas. Continuam
dependentes de modelos de funcionamento centralizado que de uma forma geral as
tratam como iguais. Por outro lado, existe ainda uma dispersão nos
enquadramentos e tutela que dificultam uma gestão integrada e ajustada aos
contextos. Para exemplificar esta dispersão, podemos referir o facto de que a
tutela dos espaços e equipamentos educativos, apoios sociais e pessoal de
apoio, até ao 1º ciclo, ser das autarquias,
enquanto que as mesmas competências para 2º, 3º ciclos e ensino secundário são
do ME. No que respeita aos limites da autonomia, repare-se que apenas 10 % dos
encargos de funcionamento das escolas e agrupamentos são da responsabilidade
das respectivas direcções, tudo o resto é gerido de fora.
Acresce a este quadro, a intervenção autárquica,
a experiência que nesta matéria se acumula, por exemplo a gestão das
Actividades de Enriquecimento Curricular, da gestão de transportes, cantinas e
acção social têm revelado enormes dificuldades na articulação de recursos e
constrangimentos fortíssimos na capacidade e qualidade da resposta gerida pelas
autarquias.
É verdade que o modelo será testado em Cascais antes
de eventual generalização. No entanto, a meio de um processo, tão atribulado
quanto necessário e longe de ter terminado, de reorganização administrativa envolvendo o universo
autárquico, bem como a situação de endividamento e dificuldades várias e profundamente assimétricas de
muitos municípios, parece pouco oportuno este movimento, embora se deva, do meu
ponto de vista, reforçar o nível de autonomia das escolas.
Aliás, recordo uma recomendação recente do
Conselho Nacional de Educação no sentido de definir um processo gradual,
progressivo, que estruture um novo modelo de financiamento das escolas através
do estabelecimento de contratos-programa que promovam, de facto, a autonomia
das escolas e lhes permitam, face às suas especificidades como, população
servida, dimensão, tipologia de espaços e equipamentos, necessidades, etc.
organizar-se de forma mais autónoma e, pressupõe-se, mais eficaz e com maior
qualidade. Como é natural, este modelo de financiamento e organização exige uma
forte responsabilização e empenho das direcções das escolas face aos conteúdos
e objectivos definidos nos contratos-programa e não obriga a que se acelere
este movimento de municipalização que não garante, só por si, essa autonomia e que
deveria ser bem pensado e estudado.
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