sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

CANSAÇO E DESÂNIMO NAS ESCOLAS

No Público surge um trabalho sobre o clima das escolas num tempo marcado por sucessivas mudanças, algumas más mudanças, digo eu, outras necessárias mas mal conduzidas e um eixo condutor que parece transformar a política educativa numa mera política contabilística. Alguns actores com papéis diferentes no universo educativo ouvidos no trabalho evidenciam isso mesmo. Vejamos alguns aspectos, sem que a ordem traduza uma hierarquia de importância.
Uma primeira questão remete para a decisão do aumento do número de alunos por turma que, para quem conhece o sistema educativo português e as especificidades de alguns contextos educativos, constitui uma dificuldade séria para a qualidade do trabalho dos docentes. Se considerarmos os efeitos dos agrupamentos e dos mega-agrupamentos, a concentração de alunos, frequentemente ocorrerá a lotação máxima das turmas, sendo que as características dos contextos tornarão algumas salas de aula com 30 alunos dificilmente geríveis numa perspectiva de qualidade para todos os alunos e para os professores.
Por outro lado, ainda no que respeita à constituição de mega-agrupamentos, este movimento, contrário, aliás, ao que os países com melhores resultados na educação operam neste momento, potencia a criação de equipas de professores excessivamente grandes, dispersas e, portanto, com dificuldades acrescidas no estabelecimento de modelos de cooperação e articulação entre si, na construção de dispositivos de apoio aos docentes e aos alunos, acumulando riscos de degradação da qualidade do ensino e do clima de trabalho.
Para além das consequências em termos de clima das escolas que decorrem do modelo de avaliação dos docentes, a sua operacionalização tem sido um barco à deriva.
Finalmente uma questão que tem sido, provavelmente, uma dos mais fortes contributo para o clima de desânimo e desconfiança instalados nas escolas e que alimenta muitos dos discursos de mal-estar dos docentes.
Num processo ligado a uma reforma curricular cuja base e critério parece ser a diminuição do número de docentes necessários, num entendimento cheio de equívocos sobre os efeitos das alterações demográficas e das necessidades da escolas, dos alunos, assistimos a um processo de gestão de necessidades e de colocação de professores absolutamente desastroso nos efeitos pessoais e institucionais. Milhares de docentes que serviram durante anos, na sua esmagadora maioria com qualidade, as necessidades "transitórias" das escolas viram-se na condição de descartáveis mercê de um rótulo insultuoso, "horário zero". Todo o processo de colocação de professores tem sido uma deriva inaceitável com avanços e recuos, cheia de contradições, de erros e de incompetência que produziram situações de injustiça e desigualdade ainda em investigação, o que, naturalmente, promove a instalação de um clima insuportável nas escolas que muitas reportagens e testemunhos na comunicação social têm ilustrado e que são bem conhecidas de quem se move neste universo.
Não esquecemos, afirmo-o recorrentemente, que esta questão, os professores necessários ao sistema, é muito complexa e que, por isso mesmo, exige seriedade, rigor e competência na sua análise e gestão, exactamente tudo o que lhe tem faltado. O Ministro da Educação afirmou há umas semanas que os professores “têm a profissão mais linda do mundo” e ainda que ser professor “é um privilégio”, assente na possibilidade de transmitir saber às crianças.
Em muitas escolas, muitos professores, apesar dos imperativos ético-deontológicos, dificilmente sentirão o “privilégio” da profissão “mais linda do mundo”, lidam com um clima pouco positivo que compromete o seu trabalho de professores, o dos alunos, dos funcionários e dos pais e, no limite, o direito a uma educação pública de qualidade.

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