No Público surge um trabalho sobre o clima das escolas num
tempo marcado por sucessivas mudanças, algumas más mudanças, digo eu, outras
necessárias mas mal conduzidas e um eixo condutor que parece transformar a
política educativa numa mera política contabilística. Alguns actores com papéis
diferentes no universo educativo ouvidos no trabalho evidenciam isso mesmo.
Vejamos alguns aspectos, sem que a ordem traduza uma hierarquia de importância.
Uma primeira questão remete para a decisão do aumento do número
de alunos por turma que, para quem conhece o sistema educativo português e as
especificidades de alguns contextos educativos, constitui uma dificuldade séria
para a qualidade do trabalho dos docentes. Se considerarmos os efeitos dos agrupamentos
e dos mega-agrupamentos, a concentração de alunos, frequentemente ocorrerá a
lotação máxima das turmas, sendo que as características dos contextos tornarão
algumas salas de aula com 30 alunos dificilmente geríveis numa perspectiva de
qualidade para todos os alunos e para os professores.
Por outro lado, ainda no que respeita à constituição de mega-agrupamentos,
este movimento, contrário, aliás, ao que os países com melhores resultados na
educação operam neste momento, potencia a criação de equipas de professores
excessivamente grandes, dispersas e, portanto, com dificuldades acrescidas no estabelecimento
de modelos de cooperação e articulação entre si, na construção de dispositivos
de apoio aos docentes e aos alunos, acumulando riscos de degradação da
qualidade do ensino e do clima de trabalho.
Para além das consequências em termos de clima das escolas
que decorrem do modelo de avaliação dos docentes, a sua operacionalização tem
sido um barco à deriva.
Finalmente uma questão que tem sido, provavelmente, uma dos
mais fortes contributo para o clima de desânimo e desconfiança instalados nas
escolas e que alimenta muitos dos discursos de mal-estar dos docentes.
Num processo ligado a uma reforma curricular cuja base e
critério parece ser a diminuição do número de docentes necessários, num
entendimento cheio de equívocos sobre os efeitos das alterações demográficas e
das necessidades da escolas, dos alunos, assistimos a um processo de gestão de
necessidades e de colocação de professores absolutamente desastroso nos efeitos
pessoais e institucionais. Milhares de docentes que serviram durante anos, na
sua esmagadora maioria com qualidade, as necessidades "transitórias"
das escolas viram-se na condição de descartáveis mercê de um rótulo insultuoso,
"horário zero". Todo o processo de colocação de professores tem sido
uma deriva inaceitável com avanços e recuos, cheia de contradições, de erros e
de incompetência que produziram situações de injustiça e desigualdade ainda em
investigação, o que, naturalmente, promove a instalação de um clima
insuportável nas escolas que muitas reportagens e testemunhos na comunicação social
têm ilustrado e que são bem conhecidas de quem se move neste universo.
Não esquecemos, afirmo-o recorrentemente, que esta questão,
os professores necessários ao sistema, é muito complexa e que, por isso mesmo,
exige seriedade, rigor e competência na sua análise e gestão, exactamente tudo
o que lhe tem faltado. O Ministro da Educação afirmou há umas semanas que os
professores “têm a profissão mais linda do mundo” e ainda que ser professor “é
um privilégio”, assente na possibilidade de transmitir saber às crianças.
Em
muitas escolas, muitos professores, apesar dos imperativos ético-deontológicos,
dificilmente sentirão o “privilégio” da profissão “mais linda do mundo”, lidam
com um clima pouco positivo que compromete o seu trabalho de professores, o dos
alunos, dos funcionários e dos pais e, no limite, o direito a uma educação pública
de qualidade.
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