Gostava de estar enganado mas presumo que este
episódio do visionamento por parte da PSP das imagens dos incidentes da manifestação
de 14 de Setembro gravadas pela RTP nunca virá ser totalmente esclarecido.
Acontecerá como em milhentas outras vezes chegarmos
a várias "verdades", ou seja, cada um dos actores envolvidos terá uma
verdade, a sua, e cada elemento (ler partido) das diferentes Comissões criadas
ou instituídas no Parlamento construirá a sua verdade.
Creio que as questões em jogo no caso em apreço, após
as várias declarações conhecidas e os factos, poucos, que são públicos, como
referências a eventuais, "saneamentos políticos", "pressão sobre
o trabalho jornalístico", "ameaça a direitos individuais",
"não cumprimento de procedimentos legais" são de uma gravidade
considerável e não podem deixar de causar profundas inquietações.
Começam a ser demasiado frequentes as situações
que envolvem estranhas e nunca esclarecidas relações entre o poder politico e a
imprensa, recordo-me dos casos com a RDP e com o Público e agora a RTP. Retomo
algumas notas velhas sobre esta relação sempre tentadora e perigosa entre os
poderes e a comunicação social.
A relação de boa parte da classe política e dos
líderes dos diferentes poderes existentes na nossas comunidades com a
comunicação social tem aspectos muito interessantes. Se estivermos atentos, reparamos
como todos se procuram servir da comunicação social para a defesa dos seus
interesses pessoais, partidários, institucionais, económicos, etc. Nada de
novo, sabemos o peso que a comunicação social tem nas sociedades actuais.
O que me parece particularmente irritante é a
forma quase infantil, está um pouco na moda este tipo de infeliz comparação mas
não resisto, como algumas figuras reagem ao ser abordadas sobre assuntos sobre
os quais, por várias razões, não lhes interessa discorrer. Surgem então as
afirmações patéticas, “não tenho nada a acrescentar”, “desculpem, não comento”,
“não estou aqui para falar dessas matérias,” etc., etc. Desenvolvem assim uma
espécie de surdez selectiva, só ouvem o que lhes convém, de mutismo selectivo,
só falam do que lhes convém, de cognição selectiva, só conhecem o que lhes
convém.
As mesmas figuras que directamente ou através de
terceiros, lambem as botas às redacções e aos jornalistas (quanto mais
influentes melhor) e pedem, exigem, tempo de antena quando tal serve os seus diferentes
interesses.
Algumas dessas figuras quando, quase sempre fruto
do alpinismo partidário, ascendem a alguma forma de poder conseguem ainda ir
mais longe nessa relação com a imprensa, se não lhes agrada calam-na como também
não é raro. É um método velho e intemporal.
Devo confessar que tal cenário é, para mim,
profundamente irritante e patético, sinto que nos insultam, que nos consideram
destituídos, como se por não abordarem as diferentes matérias, elas não se passassem
ou não existissem ou, noutros processos, que somos manipulados de forma nem
sempre perceptível pela opacidade das situações.
Finalmente, incomoda-me uma comunicação social,
boa parte dela, passiva e resignada que não confronta as figuras públicas com
estes comportamentos, não os denuncia, e que acorrem solícitos quando essas
figuras entendem que têm algo a dizer, as mais das vezes, irrelevante. Também
lhes convém esta subserviência interesseira que alguns mantêm, também têm as
suas agendas. Às vezes são recompensados.
Gente pequena e sem espinha, como dizia o meu
pai, de um lado e de outro.
Sem comentários:
Enviar um comentário