O Governo vai propor aos parceiros sociais que o
cálculo da indemnização por despedimento assente em 12 dias por cada ano de trabalho. Segundo as
organizações representativas dos trabalhadores esta medida poderá significar
perdas para as pessoas entre 30 a 60%.
Parece-me de recordar que há poucas semanas, num
trabalho do Público realizado com base nos dados disponíveis do INE e da
Segurança Social, lia-se que cerca de 465 000 desempregados, 56 %, não têm
protecção social há nove meses. Este número, que pode ser mais elevado, é
absolutamente devastador e dramático e representa o mais alto valor alguma vez
atingido de pessoas em situação de desprotecção social.
O problema vai, provavelmente agravar-se, pois
começa a esgotar-se o período em que se usufrui de subsídio, entretanto
encurtado, envolvendo as pessoas que caíram no desemprego a partir de 2009, o
ano em que os aspectos mais gravosos da crise nos começaram a atingir. e quando
começaram as políticas de cortes na protecção social e que se têm acentuado de
uma forma que ameaça a sobrevivência de muita gente. Mesmo entre pessoas com
trabalho, existem cerca de 153 000 portugueses que recebem menos de 310 € de
salário líquido.
A este cenário acresce, ainda de acordo com o
IEFP, que, no último ano, o número de casais com ambos os elementos no
desemprego duplicou e o valor médio dos
subsídios de desemprego tem vindo a baixar.
Há tempos foram divulgados alguns dados referindo
que cerca de 200 000 pessoas já terão desistido de procurar emprego, não
constando sequer dos números do desemprego. Este quadro impressionante levanta
uma terrível e angustiante questão. Os milhares, muitos, de pessoas envolvidas
vão (sobre)viver de quê?
Sendo de esperar a continuação de um período
recessivo e, portanto, sem crescimento, torna-se impossível criar a riqueza
necessária e redistribuí-la de forma socialmente mais justa para minimizar esta
tragédia.
É certo que em Portugal a chamada economia
paralela corresponde a cerca de 25% do PIB e muita gente e muitas actividades
estão envolvidas neste universo, de qualquer forma o potencial impacto social
destes números é, no mínimo, inquietante.
Afirmo com frequência que uma das consequências
menos quantificável das dificuldades económicas, sobretudo do desemprego, em
particular o de longa duração e de situações em que o tempo obriga a perder o
subsídio, é o roubo da dignidade às pessoas envolvidas. Sabemos que se verifica
oportunismo e fraude no acesso aos apoios sociais, mas a esmagadora maioria das
pessoas sentem a sua dignidade ameaçada quando está em causa a sobrevivência a
que só se acede pela “mão estendida” que envergonha, exactamente por uma
questão de dignidade roubada.
A questão da pobreza é um terreno que se presta a
discursos fáceis de natureza populista e ou demagógica, sem dúvida. Mas também
não tenho dúvidas de que os problemas gravíssimos de pobreza que mais de dois
milhões de portugueses conhecem, exigem uma recentração de prioridades e
políticas que não se vislumbra. Na verdade, apesar da retórica oficial de que
existe justiça social nas medidas de austeridade, o que é verdadeiramente
insustentável é que as políticas assumidas, por escolha de quem decide, estão a
aumentar as assimetrias sociais, a produzir mais exclusão e pobreza. Mais
preocupante a insensibilidade da persistência neste caminho.
Quando nos dizem que não há alternativa, é
interessante registar que alguns analistas, incluindo ironicamente o próprio
FMI, atribuem a rápida recuperação da Islândia à manutenção do estado social e
dos apoios sociais, ou seja, privilegiou-se as pessoas e não os mercados, a
banca, o contrário do diktat que nos é imposto.
A pobreza e a exclusão deveriam envergonhar-nos a
todos, a começar por quem lidera, representam o maior falhanço das sociedades
actuais.
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