sexta-feira, 17 de outubro de 2025

VELHICE E POBREZA

 A agenda das consciências determina para hoje o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza.

O relatório "Pobreza e Exclusão Social 2025", do Observatório Nacional de Luta Contra a Pobreza da Rede Europeia Anti-Pobreza, refere que apesar de uma redução, o risco de pobreza ou exclusão social é de 19,7%, acima dos dois milhões, um em cinco portugueses.

No entanto, para a população mais idosa a situação agravou-se, "22,3% dos reformados, 23,8% das pessoas com 65 anos ou mais e 26,5% dos idosos com 75 anos ou mais estavam em risco de pobreza ou exclusão social".

Nada de novo, no âmbito das políticas sociais é reconhecido que crianças e idosos são os grupos em maior risco de pobreza. O número de pessoas idosas que beneficiam do Complemento solidário para Idosos continua em crescimento significativo. Considerando o mês de Julho, cresceu 57,3% relativamente a 2024, 228827 pessoas, mais 83348 que em Julho do ano anterior. Este apoio abrange as pessoas com um rendimento inferior 630,67€.

Na verdade, em Portugal, a vida de muitos de nós, os velhos, é dura e difícil. Portugal é um dos países da Europa com população mais envelhecida, que vive só e no limiar de pobreza, uma percentagem muito significativa dos idosos tem pensões bem abaixo do salário mínimo.

As despesas de estadia nos lares e centros de acolhimento são bastante mais altas que os rendimentos dos velhos, pelo que se torna necessária a comparticipação das famílias para além dos apoios do Estado. Dadas as dificuldades que também afectam as famílias, estas estão a sentir progressiva dificuldade em assegurar essas comparticipações.

Numa altura em que continua na agenda a reforma do estado que, parece, assenta nos cortes das suas funções sociais este cenário exige uma profunda atenção.

A discussão necessária sobre o chamado estado social decorre num contexto particularmente adverso que pode, existe esse sério risco, fazer emergir ameaças sobre a sua sustentabilidade e, naturalmente, sobre a sua matriz conceptual.

Na verdade, pensando sobretudo no quadro actual e futuro próximo, a nossa população mais velha vive de uma forma genérica em condições muito precárias, como também sabemos que a população mais jovem é a mais exposta ao risco de pobreza para além dos velhos. Aliás, como é conhecido a tragédia do desemprego afecta sobretudo os mais novos e os mais velhos.

Os idosos começam por ser desconsiderados pelo sistema de segurança social que com pensões que não suportam um nível de vida básico, transforma os velhos em pobres, dependentes e envolvidos numa luta diária pela sobrevivência.

Continua com um sistema de saúde que deixa muitos milhares de velhos dependentes de medicação e apoio sem médico de família. Em muitas circunstâncias, as famílias, seja pelos valores, seja pelas suas próprias dificuldades, não se constituem como um porto de abrigo, sendo parte significativa do problema e não da solução. Por outro lado, para além dos custos das instituições importa ainda considerar a acessibilidade da oferta e a respectiva qualidade como tem vindo a ser conhecido envolvendo ainda a clandestinidade de algumas das respostas.

Se olharmos para o conjunto de dados que vão sendo disponibilizados sobre este universo, verifica-se que as condições estruturais se mantêm sem alterações significativas, estamos na mesma posição de pobreza há vários anos e, por outro lado, as condições conjunturais, a crise, acentuam a preocupação com a pobreza e com a velhice o que define um cenário altamente inquietante em termos de confiança no futuro e na desejada e necessária qualidade de vida.

Temos vindo a assistir a um acréscimo de dificuldades das organizações de solidariedade social no providenciar de apoios às dificuldades crescentes da população, sobretudo à mais idosa conhecendo-se a situação de “asfixia” de muitas instituições, e retorna a mendicidade ou o bater à porta das instituições, porventura de forma mais envergonhada e a atingir camadas diferentes.

Neste cenário, todas as medidas que de alguma forma atinjam os mais velhos devem ser objecto de uma extrema reflexão no sentido de evitar que se acentuem as dificuldades no (sobre)viver de uma parte significativa da população portuguesa.

Lamentavelmente, boa parte dos velhos, sofreu para chegar a velho e sofre a velhice. Não é um fim bonito para nenhuma narrativa.

Se a este quadro já instalado acresce o envelhecimento progressivo, o futuro exigirá mudanças substantivas e soluções novas, por exemplo, o estudo e desenvolvimento de algumas formas de vida activa uma vez que boa parte das pessoas mais velhas refere o desejo de poder manter algum tipo de actividade após a reforma.

Este país, não estando a ser para jovens, vai ter de ser para velhos.

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